Coordenador da campanha do Lula (PT) no Distrito Federal, o ex-deputado federal Geraldo Magela participou do CB.Poder desta segunda-feira (31), programa que é uma parceria entre o Correio e a TV Brasília. Ele destacou que, em um primeiro momento, as questões econômicas e sociais serão as prioridades do governo de transição.
Aos jornalistas Denise Rothenburg e Vinicius Doria, Magela também disse que o processo de transição é difícil, mas que o PT fará com ou sem Bolsonaro. “Eu diria o seguinte: temos a esperança e a expectativa de que a eleição tenha terminado ontem (domingo), e que a transição comece na próxima semana. Se isso não acontecer por vontade do governo Bolsonaro, faremos a transição mesmo assim”, frisou.
O ex-parlamentar também deixou claro que o PT não vai se opor a um diálogo com Ibaneis Rocha (MDB) no DF. “A partir de janeiro, são dois governos que vão ter que conversar, dialogar e buscar recursos. Vamos ter que dialogar. O PT não se oporá a um diálogo com o Ibaneis. Não vamos nos aproximar do seu governo, somos distintos, mas vamos ter que conversar e dialogar para ajudar o governo Lula e o Distrito Federal”, pontuou.
Você esteve aqui conosco (no domingo, durante a apuração dos votos) e agora, já temos o resultado. Ficamos aqui especulando alguns cenários. Havia a expectativa de virada, por parte dos bolsonaristas, que não ocorreu. Hoje (segunda-feira), tivemos essa questão dos caminhoneiros, que cabe à polícia resolver. Agora, o presidente eleito tem que dar alguma sinalização.
Acredito que o primeiro sinal foi o pronunciamento do Lula ontem (domingo). Ele fez um pronunciamento muito forte, vigoroso e muito bem elaborado, para a população, dizendo que, a partir de agora, é paz e reconstrução. Terminada a eleição, é um novo momento, em que nós temos que olhar para o futuro. Então, acho que o primeiro sinal foi o pronunciamento que o Lula fez e que, aliás, foi muito contundente, claro e objetivo. Agora, a partir de hoje (segunda-feira), temos um período muito curto para fazer a transição. São 60 dias que nós temos que montar ministérios, montar todo o governo, fazer todo o processo de entendimento e, certamente, precisa de pressa. E o mercado (financeiro) precisa ser ouvido e ser atendido. Mas o Lula foi muito claro e nós temos uma preocupação: o mercado tem que ser atendido e ouvido, mas nós temos uma preocupação com o social. Então, vamos conciliar essas duas questões e, certamente, não vai ter nenhum grande solavanco no processo dessa transição.
Gostaria de saber, justamente, com relação ao clima dessa transição. O presidente Jair Bolsonaro ainda não se dirigiu sequer aos seus eleitores. Como o senhor prevê essa transição, com essa polarização, um país completamente dividido, e cujas feridas vão levar um tempo ainda para cicatrizar?
A transição, na minha avaliação, tem que ser feita política e tecnicamente. Hoje, não conhecemos o que existe dentro do governo, conhecemos muito pouca coisa. É preciso que o governo Bolsonaro abra as suas portas, para permitir que a transição seja feita tecnicamente, que todos os dados sejam liberados para a equipe de transição e, politicamente, o Lula vai cuidar, certamente, de como compor o governo e como restabelecer as pontes com os segmentos que ficaram, neste momento, conflitados. A partir de hoje (segunda-feira), não podemos mais pensar em eleição. O Lula já disse que não pretende ser candidato em 2026. Não vamos pensar na eleição — como quem é eleito pensando na reeleição faz. Vamos pensar que é preciso ter uma transição de 60 dias, técnica, e o Lula vai cuidar do processo político de composição do seu governo. É difícil? É! Mas é necessário. O país tem que superar. Mas quero assegurar a vocês: o PT está preparado para não ficar olhando para o passado e para o processo eleitoral. Queremos olhar para o futuro.
Em relação a esses movimentos dos caminhoneiros, haverá alguma sinalização do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva?
Acho que precisamos fazer uma diferença muito clara. O diálogo terá de ser feito, institucionalmente, com quem tem legitimidade para isso, o que não inclui os grupos radicalizados. Sabemos que, no bolsonarismo, há grupos radicalizados em todos os setores, e eles terão de ser tratados com a Justiça e com a polícia e, os que forem legítimos representantes e que tiverem pautas para trazer para o governo, deverão ser ouvidos. Então, temos que separar as coisas: quem quiser vir para a mesa do diálogo, da reconstrução e da reconciliação do país, vai ser muito bem-vindo e bem aceito; quem for para o processo de radicalização, contra a lei, terá o tratamento da polícia e da Justiça.
O senhor falou sobre a transição técnica e política. A parte técnica fica a cargo dos elaboradores do programa do futuro governo?
Sabe-se muito bem que é um processo de dificuldade, nos primeiros dias, nos primeiros momentos, mas eu confio que o governo Bolsonaro vai abrir os seus dados, as suas informações, até porque temos técnicos que estão no governo, independentemente de quem é o governante, que são técnicos, que são profissionais. Estes vão nos ajudar. Não tenho dúvidas disso. Há um outro ponto que é muito importante: conhecemos o governo. Não conhecemos os dados atuais, mas o PT e os nossos aliados, foram governantes durante 14 anos. Então, conhecemos a estrutura do governo. Tenho a expectativa de que o Bolsonaro vai ficar uma semana nesse processo de radicalização, mas depois vai compreender que ele tem um papel institucional. Se ele não vier para a transição, a transição será feita pelos técnicos e temos condições de olhar o governo não com detalhes claros, muitos objetivos, mas nós temos informações sobre o governo por termos sido governo antes. Então, a transição técnica vai acontecer de qualquer forma.
Mas teve uma conversa com o Arthur Lira, que foi a primeira autoridade a se manifestar e dizer: “Olha, temos que respeitar o resultado das urnas, elas não devem ser contestadas”. Ele foi muito claro, ao dizer que era hora de baixar as armas e dialogar, reconstruir o país. Pode ser ele esse interlocutor?
Certamente temos diversas pontes. Até porque, é preciso a gente dizer que alguns agentes políticos sabem que vão continuar na política. Eles não deixarão a eleição que terminou domingo contaminar os próximos quatro anos. O Arthur Lira, principalmente, será sim. Ele é candidato a presidente da Câmara dos Deputados, ele sabe que, num próximo governo, se ele for o presidente, deverá ter um diálogo permanente.
Qual a sua expectativa com relação ao início do governo Lula?
De forma muito objetiva, o Lula anunciou que convocará os governadores, atuais e eleitos, na próxima semana, para saber as três obras prioritárias que eles querem fazer nos próximos quatro anos. Isso significa que o Lula vai retomar um programa de crescimento, a partir de obras na infraestrutura. Isso pode fazer o Brasil voltar a ter obras, geração de emprego e crescimento muito rapidamente. Segundo, não é preocupação ficar olhando teto de gastos com a miséria espalhada pelo Brasil inteiro. Não estamos preocupados, neste momento, com o teto de gastos. Estamos preocupados em eliminar ou diminuir rapidamente a pobreza. Então, essas serão duas ações imediatas que o Lula vai adotar, não tenho dúvida.
O Distrito Federal foi a unidade da Federação onde o crescimento do presidente Lula foi maior. Foram 12% de votos acima do que teve no no primeiro turno. A que o senhor atribui esse crescimento, tendo em vista que o Distrito Federal votou, majoritariamente, em Bolsonaro?
Precisamos ter claro que nós enfrentamos aqui dois governos: o federal e o local. O governo Ibaneis fez campanha, especialmente no primeiro turno, mas também no segundo turno, para o Bolsonaro. Então, enfrentamos duas máquinas. Eu até diria que o nosso resultado aqui, diante das circunstâncias, é um bom resultado. Mas vamos ter que trabalhar, como eu disse, na pacificação. O governo Ibaneis é do MDB, ajudou o Bolsonaro, mas, a partir de janeiro, são dois governos que vão ter que conversar, dialogar, buscar recursos — sabemos que tem três áreas aqui: saúde, educação e segurança — que são sustentadas pelo governo federal, fundamentalmente pelo fundo constitucional. Vamos ter que dialogar. O PT não se oporá a um diálogo com o Ibaneis. Não vamos nos aproximar do seu governo, somos distintos, mas vamos ter que conversar e dialogar para ajudar o governo Lula e o Distrito Federal.
Que futuro o senhor vislumbra para o PT-DF, diante dessa vitória de Lula? Há esse diálogo institucional, mas isso significa que o partido local pode apoiar o governo Ibaneis?
Não vejo essa possibilidade. O governo (de Ibaneis) tem um programa absolutamente distinto do PT e eu não vejo nenhuma possibilidade de o partido apoiar o governo Ibaneis. O que vamos fazer é ter diálogo e respeitar o que é prioritário para a população do Distrito Federal, e que vier a ser apresentado pelo governo Ibaneis. Nisso, vamos ajudar. Por exemplo, precisamos resolver o caos da saúde no Distrito Federal. Em que o governo federal pode ajudar nisso? Nisso, vamos ajudar. Mas apoiar o governo Ibaneis, naquilo que o governo tem do que criticamos, não há essa possibilidade.
Mas dentro desse contexto em que o Lula foi eleito: de “consertação” nacional, união entre várias forças políticas . E o governo Ibaneis também se caracteriza por um pragmatismo que é bem definido. Esse pragmatismo não pode ser a chave do diálogo com governo Lula?
Pode. Vou te dar dois exemplos que não concordamos no governo Ibaneis. Primeiro, as escolas militarizadas. Isso foi uma concepção do governo Bolsonaro. Não achamos que tem que ter polícia nas escolas. O governo Ibaneis vai voltar atrás? Se ele aceitar voltar, pode começar um diálogo. Segundo, privatizações. O governo Ibaneis é privatista, seguindo a lógica do governo Bolsonaro, e somos contra. Ele aceita discutir isso? É claro que o governo Lula vai ter um novo programa para o Brasil que o governo Ibaneis, em alguns casos, tem choque com ele. Se o governo Ibaneis fizer movimentos para se aproximar do programa do Lula, certamente o PT pode apoiar ações que venham a ter, em comum acordo, o que o governo federal e o local fazem.
Mas o momento não pede esse pragmatismo?
Pede, mas ele tem que ser de parte a parte. Diria que, na política, não se faz acordos se os dois não quiserem. E o acordo entre Ibaneis e Lula tem que ser programático. O governo Ibaneis terá que recuar de algumas das suas ações e dos seus projetos, para se adaptar ao programa que o Lula vai apresentar para o Brasil. Fazendo isso nós não teremos como não apoiar.
Em relação a bancada federal aqui do DF. A maioria é bolsonarista, foi eleita ali de acordo com o governo do presidente Jair Bolsonaro, inclusive, a deputada Bia Kicis (PL) disse aqui, ontem (domingo), que vai para a oposição. Como é que vai ser essa relação?
Essa pergunta é muito boa e vou dizer aqui para todo mundo: Não quero a Bia Kicis apoiando o governo Lula. Pode ficar onde ela está e, por favor, seja oposição a nós, porque ela não representa absolutamente nada do que pensamos. Agora, Rafael Prudente, por exemplo, que é do MDB, e que não apoiou o Lula, pode vir apoiar a bancada do Lula. Eu vou dar um exemplo: no Senado, das três vagas, não tenho a expectativa de que a Damares venha apoiar o Lula, mas eu tenho a expectativa, por exemplo, de que o Izalci Lucas (PSDB) se mova para estar ao lado do programa que o Lula vai apresentar. Então eu não tenho dúvida de que os oito dos oito parlamentares na Câmara dos Deputados, poderemos ter entre quatro ou cinco apoiando o Lula. Porque é o processo do diálogo e do pragmatismo que todos nós vamos ter que olhar.
O senhor falou várias vezes aqui nessa conversa sobre o MDB. O governador é do MDB. Do lado de Lula, Simone Tebet é do MDB. E são dois emedebistas que parecem diferentes, mas são do mesmo partido. Que MDB o senhor espera encontrar a partir de 2023 para dialogar?
O MDB que faz política cotidianamente e que olha para o governo federal, como parceiro e como aliado. O Ibaneis não vai poder ser oposição ao Lula, como foi no processo eleitoral. Eu acredito no pragmatismo da gestão que o MDB fará nos estados e pelo programa que nós vamos apresentar e ter o MDB como aliado no governo, a partir do Congresso Nacional. Acho que o MDB, são vários, mas o partido tem também um projeto de fazer com que seus governadores deem certo, que a sua bancada tenha sucesso e perspectiva de ajudar o Brasil e é nesse MDB que acredito que poderemos ter como aliado.
E o PT-DF? O que esperar do partido daqui para frente, rumo a 2026?
O PT-DF precisa fazer uma avaliação muito profunda, séria, cautelosa, científica e política do que aconteceu nessas eleições. Erramos muito e precisamos fazer uma autocrítica, mas, certamente, vamos aprender com os nossos erros e vamos estar melhores em 2026.