O escritório responsável pela defesa do presidente Jair Bolsonaro, que recorre da condenação por ofensas à deputada Maria do Rosário (PT-RS), é chefiado, quem diria, por uma feminista. Aos 39 anos, a advogada Karina Kufa expõe suas credenciais não só com palavras mas com ações concretas voltadas a uma inclusão mais efetiva de mulheres no masculino ambiente da política – como o projeto Eleitas, criado para dar assessoria técnica e jurídica a interessadas em se candidatar a cargos eletivos.
Ao jornal Estado de SP ela garantiu, com a sinceridade de uma advogada de defesa, que Bolsonaro e seu filho, Eduardo – a quem também presta serviços – não são machistas e até se interessam por suas pautas.
Especializada em direito eleitoral, Kufa também advoga para o PSL nacional, onde hoje trabalha na reestruturação dos diretórios estaduais, a maioria ainda provisórios, para viabilizar candidaturas no ano que vem. A seguir os principais trechos da entrevista.
Como se deu a aproximação com o PSL e com Bolsonaro?
O PSL prestou contas de forma incompleta e a Justiça Eleitoral declarou como não prestadas e suspendeu o diretório. Precisavam de um bom escritório em São Paulo. Meu nome foi recomendado por ex-clientes. Eu tinha certas restrições aos Bolsonaro, mas pensei: “o PSL é um partido e partido não tem problema”. Resolvemos o problema em tempo recorde. Se não tivéssemos vencido, nenhum eleito pelo PSL-SP poderia ser diplomado. Por conta desse trabalho, me pediram pra cuidar da prestação de contas dele. Depois fiquei como coordenadora da campanha e agora sou a única advogada, com minha equipe, das ações eleitorais e criminais. No começo fiquei meio assim, mas falei com amigos e com meu filho, que achou o máximo. Ainda assim eu disse “mas a questão do machismo, será que não tem problema, por conta da minha imagem?” Ele falou: “Que machismo?” Falei sobre a agressão a Maria do Rosário e ele disse: “Que agressão, mãe? Assiste o vídeo”. Aí assisti.
Como uma feminista defende a seguinte frase: “eu não te estupraria porque você é feia”?
Acho que dentro de um contexto de provocação, acho que ele não deveria ter falado, mas houve uma provocação em que ele acabou ali se perdendo no contexto. Não deveria ter falado aquilo, mas ele foi provocado. E hoje, como presidente, ele tem sido mais comedido.
Ele repetiu a frase no plenário.
No plenário eu não vi. Na questão da frase, não sei qual foi a intenção ali, mas ele acabou se comportando de uma forma em reação a uma provocação. Ele não é um estuprador, essa é uma acusação muito grave. Mas essa era uma provocação que ela fazia. A rixa dos dois sempre foi muito grande e ela foi muito provocativa.
Essa defesa é pessoal ou técnica?
Depois que entrei na campanha, fui vendo que ele não é nada do que imaginava. Pelo contrário. Teve falas inadequadas, sim, mas não fruto de machismo e sim de falha na comunicação, de uma provocação e de uma pessoa que não sabe lidar com provocação, mas não de machismo. Acho que o machismo está mais em ações do que em palavras. Se ele fosse um estuprador, eu falaria que ele é um machista, mas não tem nenhuma conduta dele de falta de respeito, agressão. Quem trabalha com ele sabe que ele é uma pessoa doce, sensível, brincalhona e alegre. Totalmente o oposto do que foi plantado durante a campanha.
Qual é sua linha de atuação na defesa do presidente?
A recomendação do advogado anterior era de bater na imprensa. A minha é o oposto, de conciliação. Acho que deve ter diálogo e não deve ficar entrando com ação contra jornalista. Tem a questão da liberdade de expressão, uma coisa que ele sempre primou, mas incentivado pela antiga assessoria, acabou entrando com uma ação ou outra. Mas o interesse dele é de conciliar. Teve recomendação do Olavo de Carvalho de entrar com diversas ações, mas isso não vai acontecer.
E no PSL?
O PSL vai ser o primeiro partido a ter compliance. Tivemos reuniões com o vice-procurador eleitoral para assinar um termo de boas práticas partidárias. O PSL era um partido pequeno que não tinha dinheiro, mas agora começou a ter. Nós procuramos a PGE para nos orientarem a gastar bem o dinheiro. Dessas reuniões saíram algumas sugestões, como o compliance. É uma segurança para dirigentes, filiados e até para o presidente. O PSL veio com essa ideia do compliance. O Ministério Público teve total liberdade para propor sugestões para serem adotadas no estatuto. Qual partido se coloca à disposição do MP para dar pitaco interno? Isso tudo garante que vai ser um partido diferente.
Ele não paquera outro partido?
Não. Essa história da UDN não existe. O CNPJ foi extinto. Eles não conseguiram se registrar. A UDN nem sequer é uma associação ou tem CNPJ. Não tenho nenhuma informação de troca de partido.
Como fica Minas e a história das candidaturas laranjas?
Não advogo em Minas nem conheço o ministro do Turismo. Tem um advogado que está cuidando do processo e a gente não tem conhecimento. O PSL está se reestruturando de hoje para o futuro, para não ter escândalo, corrupção ou candidatura laranja. A ideia é fazer toda reestruturação para eleger candidatos no maior número de municípios, concomitante ao trabalho de conscientização de mulheres para termos o maior número de candidatas.
Essa formação de candidatas será técnica ou ideológica?
Aula técnica. O que uma candidata precisa, desde a comunicação, oratória, coaching, media training, o que pode ou não fazer, como ser zeloso pela prestação de contas. Ou seja, preparar a candidata para a qualificação para quando ela for pleitear a candidatura, verba. Seria como trazer o Eleita para o PSL. A gente vai criar cotas para dirigentes partidários. Se conseguirmos ter mais mulheres como dirigentes, teremos mais mulheres brigando pela pauta feminina.
O partido é aberto a pautas femininas?
Fico empolgada porque já trabalhei com outros partidos e ninguém pediu sugestão de projeto para aumento de participação da mulher na política. No PSL sinto envolvimento e abertura. Se quiserem falar que não sou mais feminista, tudo bem. Mas estou ali defendendo a mesma pauta que defendia antes de Bolsonaro.
A sra. já começou a pensar em entrar formalmente na política?
Não. Gosto muito da política, mas prefiro ficar nos bastidores.