O ano era 1988 e Ayrton Senna havia acabado de vencer o primeiro dos seus três campeonatos mundiais de Fórmula 1. Um de seus principais patrocinadores e apoiadores, o extinto Banco Nacional, resolveu presenteá-lo pelo feito com o, na época, recém-lançado e badalado na VW Gol GTI. O banco optou por comprar o carro diretamente da Volkswagen, e as pessoas envolvidas na escolha do carro que serviria ao campeão resolveram caprichar.
No pátio da fábrica, localizada na cidade Taubaté (SP), os técnicos procuraram uma carroceria excelente, aquela em que todos os ajustes da estamparia estavam perfeitos. O carro pronto, aguardando para ser enviado a um concessionário, foi levado para a Ala Zero da fábrica de São Bernardo do Campo (SP), uma espécie de oficina modelo responsável pelas revisões dos carros da frota interna e pela solução dos problemas que a rede de concessionárias não conseguia resolver. Eles é que fariam a revisão de entrega e os acertos do carro campeão que presentearia outro campeão. Resolveu-se também que o motor e o câmbio seriam substituídos, por um conjunto igualmente montado na linha de produção, mas que, graças a uma montagem mais feliz e com componentes mais adequados, desenvolviam mais potência, no caso do motor, e menos ruído, no caso da transmissão.
Ronaldo Berg, diretor de pós-venda da VW na época e responsável pela Ala Zero, se encarregou de pedir às engenharias de motor e transmissão unidades que se destacaram pelo melhor desempenho. Uma equipe de mecânicos foi destacada para o serviço refinado no carro do campeão. O esportivo de Senna foi colocado em um elevador, ligeiramente erguido para a retirada das rodas dianteiras, que foram devidamente colocadas no porta-malas, já forrado com papel-manteiga para não sujar. Iniciou-se a retirada do conjunto motor/câmbio original, que seria substituído por aqueles outros especialmente escolhidos.
O GTI especial foi então totalmente erguido no elevador para que se completasse a retirada do trem de força original. E foi nesse momento, quando os mecânicos abaixaram o motor e o câmbio original, momentaneamente, a frente ficou vazia. Mas o porta-malas estava cheio, com o estepe original e as duas rodas dianteiras, tudo pesando no extremo traseiro. O resultado foi algo surpreendente: o carro girou no ar, em uma espécie de cambalhota aérea, caindo ao chão com o assoalho para cima. Um susto tremendo para todos os presentes e, por sorte, não machucou absolutamente ninguém.
O Gol GTI do nosso campeão Ayrton Senna estava totalmente perdido sem que ele tivesse sequer visto o carro. Mas nem tudo estava acabado, afinal de contas, estávamos dentro da fábrica que havia criado e produzia diariamente o famoso esportivo. O primeiro carro do Ayrton foi dado como perda total, nada podia se aproveitar do exemplar carinhosamente escolhido. O processo de escolha de outro foi reiniciado. Na fábrica de Taubaté, escolheu-se um novo GTI de carroceria perfeita, esse carro também foi enviado para a Ala Zero, os mecânicos substituíram o conjunto motor/câmbio do segundo carro por aquele especialmente escolhido pela engenharia. Mas, desta vez, o GTI foi amarrado ao elevador, para que não cometesse o suicídio do primeiro.
Houve a solenidade de entrega do carro no início de 1989, na mesma Ala Zero, com a presença do nosso campeão Ayrton Senna e de representantes da Volkswagen, do Banco Nacional e inclusive de Ronaldo Berg, responsável pela Ala Zero, que nos contou os detalhes desse episódio, que hoje faz parte da história de bastidores de nossa indústria automobilística. Esse Gol GTI ficou com a família de Senna, pelo que apuramos, até 1996, utilizado no dia-a-dia por Leonardo Senna, irmão do nosso inesquecível campeão. Se você sabe onde se encontra esse carro, conte, porque temos grande curiosidade de saber por onde ele anda. Uma verdadeira parte da história de nossa indústria.
Por Douglas Mendonça