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terça-feira 4 de junho de 2024 às 17:44h

Novato alarma regime Viktor Orbán antes das eleições europeias

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Pela primeira vez em mais de uma década, perdas eleitorais ameaçam partido do premiê húngaro. Evitando mencionar o adversário Péter Magyar, Orbán investe contra alvos de sempre, como o bilionário George Soros e a UE.Quando é época de eleição na Hungria, o primeiro-ministro ultranacionalista Viktor Orbán costuma espalhar teorias de conspiração bizarras: às vésperas das eleições para o Parlamento Europeu, a narrativa é que George Soros comprou a central da União Europeia em Bruxelas.

O plano do bilionário judeu americano de origem húngara seria enviar a população da Europa à guerra contra a Rússia. Depois da morte em massa no campo de batalha, milhões de migrantes não europeus viriam se instalar no continente. A nação húngara deixaria de existir – afirma o nacionalista Orbán, ecoando a teoria da “grande substituição” dos supremacistas brancos.

Este foi o quadro pintado pelo político populista de direita durante uma suposta “marcha da paz” em Budapeste, no sábado (01/06). Em seu discurso, frisou que esta é uma votação histórica, na qual se decidirá sobre guerra e paz na Europa. Apesar de ser o único que defende a paz, seu governo teria chances de vencer. Suas palavras de ordem: “Conquistar Bruxelas! Sem migração, sem gênero, sem guerra!”

Orbán chefia o governo húngaro desde 2010, depois de ocupar o cargo de 1998 a 2002. Nos últimos quatro pleitos legislativos nacionais, seu partido, o Fidesz, obteve dois terços de maioria; nas três eleições europeias desde 2009, sempre mais de 50%. Mas isso pode mudar, pois pela primeira vez o populista de 61 anos enfrenta um adversário sério.

Péter Magyar, o desafiante que veio do nada

Seu nome é Péter Magyar, ex-marido da antiga ministra da Justiça Judit Varga. Praticamente desconhecido no país até poucos meses atrás, ele tem vivido uma ascensão política francamente meteórica, por diversas vezes já levou dezenas de milhares às ruas em protesto contra o sistema Orbán.

Com seu partido conservador Tisza (acrônimo de “Respeito e Liberdade”), o advogado de 43 anos já obtém entre 25% e 30% nas pesquisas de intenção de voto. Enquanto isso, o Fidesz emplaca cerca de 45%, mas poderá cair para abaixo de 40%, segundo certas consultas.

“É uma situação peculiar, totalmente nova”, comentou o politólogo Gabor Török ao portal húngaro Telex. “Alguém aparecer do nada e de repente conquistar um apoio tão maciço contra o dono do poder: nunca houve uma coisa assim na política húngara.”

A ascensão de Magyar começou em fevereiro de 2024, com um escândalo envolvendo a então presidente Katalin Novák, que indultara um condenado por cumplicidade com abuso sexual num lar para crianças.

O caso despertou forte indignação pública, sobretudo por Orbán e seus correligionários se apresentarem como defensores ilibados da infância, acusando frequentemente seus adversários políticos de quererem legalizar o abuso infantil.

Novák teve que renunciar, e Varga também se retirou da política, pois, na qualidade de ministra da Justiça, também assinara o indulto. Na época ela liderava a lista do Fidesz para o Parlamento Europeu. Seu ex-marido Magyar, que até então ocupava no aparato de Orbán cargos bem pagos, porém “invisíveis”, aproveitou para, em suas próprias palavras, “pular fora do sistema”.

Numa série de entrevistas sensacionais, o advogado revelou detalhes internos dos mecanismos de poder e corrupção do sistema Orbán. Embora nada fosse fundamentalmente inédito, as revelações fizeram manchete na Hungria, pois partiam de um insider bem conectado.

Nem tão imaculado assim

Apesar de se vender como um incorrupto desertor do sistema Orbán, contudo, por vezes o político do Tisza dá uma impressão duvidosa. Casado com Judit Varga, ele gravou, sem o conhecimento dela, uma conversa privada em que a ainda ministra se manifestava de maneira comprometedora sobre o governo. Magyar divulgou esse áudio em março de 2024, igualmente sem permissão.

Para entrar na política, ele usou uma espécie de “partido dormente”: como os prazos até as eleições europeias eram curtos demais, assumiu improvisadamente a microlegenda Tisza, fundada em 2021 mas, até pouco antes, inativa.

Magyar costuma, ainda, levantar acusações pessoais obscuras e difíceis de verificar contra representantes proeminentes do regime Orbán. Na sequência, descarta questionamentos e quase nunca apresenta provas. Ainda assim, parece tocar um ponto nevrálgico da sociedade húngara.

Por exemplo, ao afirmar que algumas famílias e empresas ligadas a Orbán dominam grande parte da economia nacional. Ou ao prometer colocar ordem nos mal administrados sistemas de educação e de saúde. Na Hungria é grande o descontentamento com corrupção, nepotismo e má gestão no setor público.

Em muitos pontos, o novato explicitamente conservador defende posições iguais às do governista Fidesz – só que sem a demagogia nacionalista. Ele critica, por exemplo, a burocracia da União Europeia, mas sem agitar contra a Europa. Tais posicionamentos o tornam atraente para os eleitores indecisos ou decepcionados com o premiê.

Orbán opta pelo silêncio – e ameaças

Deste modo, pela primeira vez em muitos anos, Orbán e sua legenda tiveram que entrar para a defensiva, explica o politólogo Török ao Telex: “O Fidesz tem tido dificuldade de dominar o discurso público com seus temas, há meses não apresenta nada próprio. Além disso, nos últimos meses teve perdas bem sérias em seus quadros”, acrescenta, referindo-se às renúncias das populares Katalin Novák e Judit Varga.

E o próximo problema de quadros já se apresenta ao Fidesz: trata-se do presidente Tamás Sulyok, que assumiu há apenas poucas semanas. Como advogado, nas décadas de 1990 e 2000 ele teria ajudado a vender terrenos agrícolas a firmas estrangeiras ilicitamente, através de testas de ferro.

Do mesmo modo que no tocante ao abuso infantil, aqui Orbán e os seus se deparam com um problema de dupla moral, pois em certa época o Fidesz havia declarado guerra à “máfia dos campos” e à “liquidação do solo húngaro para os estrangeiros”.

Até agora, em todos esses casos Viktor Orbán tem basicamente optado pela estratégia do silêncio. Ele se recusa a pronunciar o nome do adversário Péter Magyar. Em vez disso, ameaça: quem vota na oposição está escolhendo a guerra e o ocaso da nação húngara.

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