Múltiplos são os fatores que tornam uma candidatura competitiva e, em última instância, determinam quem será eleito a cargos legislativos no Brasil. Entre esses fatores estão: o dinheiro, que é um dos principais preditores para o sucesso eleitoral; a experiência prévia; apoio partidário e uma campanha bem estruturada, inclusive em redes sociais. Alterar o cenário de sub-representação de determinados grupos sociais depende de mudanças na lógica de distribuição desses recursos.
Duas novas regras jurídicas sobre financiamento eleitoral dão passos inéditos nesse sentido, para dar conta de um problema histórico: a baixa representação de mulheres e pessoas negras da política institucional.
A primeira regra, prevista na Resolução 23.607/2019 do TSE, determina que os partidos políticos devem destinar recursos do FEFC (Fundo Especial de Financiamento de Campanha) proporcionalmente à quantidade de mulheres candidatas, e nunca em valor inferior a 30%. Quanto ao recorte de raça, o percentual deve corresponder à proporção de candidatas negras e não negras; e candidatos negros e não negros do partido.
A ideia é a seguinte: se dinheiro importa e mulheres e pessoas negras estão excluídas da política, é preciso levar os partidos a recrutar esses grupos, atrelando a recursos financeiros. Como 2022 foi a primeira eleição geral com tal regra, é preciso esperar as prestações de contas finais para averiguarmos seus resultados, mas há sinais positivos vindos das eleições municipais de 2020.
Já a segunda é uma regra transitória para a distribuição do FEFC e do Fundo Partidário. Nas eleições realizadas de 2022 a 2030, quando o TSE fizer o cálculo dos repasses aos partidos, deverá contar duas vezes os votos que certo partido tiver recebido em candidaturas de mulheres e pessoas negras. Essa regra opera na lógica dos incentivos financeiros, premiando os partidos que conseguiram mais votos em candidatos com tais características.
Nesta eleição para a Câmara Federal, em que vigoraram pela primeira vez as duas regras, houve um aumento no número de candidaturas de mulheres e de pessoas negras. Os gráficos revelam que essa alta se deu entre as potencialmente competitivas, isto é, candidaturas que tiveram uma votação igual ou superior a 15% do quociente eleitoral em pelo menos uma das duas eleições anteriores. A quantidade e proporção de votos dados a essas candidaturas também aumentaram em relação a 2018.
É prematuro afirmar que esse movimento seja fruto das mudanças nas regras, pois já havia uma tendência de aumento em 2018. Tais regras, embora contribuam para a correção do problema da sub-representação, podem ter alcance limitado, a depender de como partidos e, sobretudo, o TSE seguirão implementando e regulando seu funcionamento.
A resolução segue sendo vaga no que concerne à divisão de recursos entre candidaturas majoritárias e proporcionais; entre cabeças de chapa, vices e suplentes. Para as duas regras, é fundamental dar respostas também às possíveis fraudes. Ainda que sejam esperadas mudanças legítimas na compreensão de autoidentificação racial, bem como erros no preenchimento do campo “raça” no sistema da Justiça Eleitoral, não se pode descartar a possibilidade de haver pessoas brancas se aproveitando da política ora implementada.
Ao TSE caberá definir como lidar com esses casos e aperfeiçoar os mecanismos de controle, preferencialmente em diálogo com os movimentos negro e de mulheres, partidos políticos e acadêmicos, a fim de fortalecer essas medidas de ampliação da diversidade nas instâncias representativas de poder.