Ainda não se sabe, nem no Ministério da Fazenda, quem serão os membros da comissão que vai “consolidar” e “reprogramar” o pagamento da dívida da Venezuela com o Brasil. Mas o valor do qual os representantes brasileiros na comissão terão que partir para fazer suas contas já está expresso em ofícios trocados entre o governo.
Segundo um documento da própria pasta, que na gestão de Jair Bolsonaro se chamava Ministério da Economia, a dívida venezuelana com o Brasil somava US$ 1,14 bilhão em novembro passado – ou R$ 5,7 bilhões ao câmbio de hoje.
Desde então, segundo a colunista Malu Gaspar, do O Globo, a dívida vem sendo atualizada com multa e juros, e nos cálculos do próprio governo já é maior do que R$ 6,3 bilhões.
Não se sabe se esse é também o número com o qual o governo de Nicolás Maduro trabalha. Mas, na reunião bilateral fechada com os representantes do governo brasileiro, o venezuelano atribuiu ao rompimento de relações diplomáticas do Brasil com seu país no governo de Jair Bolsonaro a suspensão dos pagamentos.
Mas a dívida se acumula desde 2017, quando o presidente era Michel Temer e a Venezuela parou de pagar as primeiras parcelas. E vinha sendo cobrada pelo governo brasileiro a cada três meses pelo menos desde 2020, segundo os documentos do Tesouro obtidos pela equipe da coluna.
Os empréstimos que Maduro parou de pagar vêm do período em que Lula e Dilma Rousseff foram presidentes, e é formada principalmente por empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para obras e serviços prestados por empreiteiras brasileiras.
Além das obras de empreiteiras como Odebrecht e Andrade Gutierrez, deixaram papagaios a serem pagos pelo tesouro brasileiro também os contratos com a Embraer e o grupo JBS.
Os créditos cobrados pelo Brasil foram concedidos por meio do mecanismo de Convênio de Créditos Recíproco, um mecanismo pelo qual os tesouros dos países latinoamericanos dão aval a empresas que vendem serviços no continente.
Se uma companhia brasileira é contratada para construir na Venezuela ou em algum outro país e esse país não paga, o Estado brasileiro cobre o rombo e depois cobra o prejuízo do tesouro devedor.
Foi o que aconteceu nesse caso. Desde que os empréstimos, concedidos em datas diversas, foram vencendo, a cada três meses a Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia envia uma carta de cobrança à representação da Venezuela no Brasil, que era exercida por uma embaixadora indicada pelo opositor de Maduro, Juan Guaidó, Maria Teresa Belandria.
A mais recente, de 21 de novembro, traz a soma exata das pendências do estado venezuelano com o brasileiro: US$ 1,114.502.940,35.
Na correspondência, o secretário-executivo adjunto da Câmara de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Leonardo Diniz, alerta: “Saliento que a manutenção dos atrasos, além de acarretar a cobrança de juros de mora e de punições contratualmente previstas, impede a concessão de novos créditos públicos ao país e nos compele a reportar a situação aos foros multilaterais competentes”.
Entre as obras e serviços fornecidos à Venezuela que o tesouro brasileiro teve que pagar estão as três linhas do metrô de Caracas e uma do metrô de Los Teques, obras que a Odebrecht deixou incompletas.
De acordo com o que foi dito ontem pelo ministro da Fazenda e por porta-vozes do Itamaraty, a comissão com representantes dos dois países ainda vai avaliar os números e renegociar os pagamentos. Não há prazo para o final dos trabalhos.