Na contramão do que acontece no Congresso Nacional, partidos da base do governo Lula, como PT e PSOL, apoiaram a instalação de uma CPI na Câmara do Distrito Federal sobre os atos golpistas de 8 de janeiro. O Palácio do Planalto tenta barrar a criação de uma comissão com o mesmo fim no plano federal, temendo que ela atrapalhe sua agenda legislativa, que tem entre as prioridades a reforma tributária e a criação de uma nova âncora fiscal que substitua o teto de gastos.
A CPI da Câmara Distrital contou também com o apoio de aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro e do governador afastado Ibaneis Rocha (MDB). A proposta da comissão, inclusive, só saiu do papel depois que foi firmado um acordo entre os parlamentares da oposição e da base de Ibaneis, que aproximou-se de Bolsonaro durante a gestão do ex-presidente. Conforme o combinado, o PT ficou com a presidência da CPI, e o MDB, com a relatoria.
O objetivo dos bolsonaristas, tanto no DF quanto no Congresso, é responsabilizar autoridades federais por omissão nas ações para impedir os ataques às sedes dos três Poderes.
Primeiro a depor na CPI da Câmara Distrital, o ex-secretário executivo da Segurança Pública do DF, delegado da Polícia Federal Fernando de Sousa Oliveira, afirmou ontem que houve “passividade” por parte da Polícia Militar na contenção dos manifestantes golpistas que atacaram as sedes dos três Poderes, em Brasília, em 8 de janeiro.
— Eu me senti impotente. (…) Não houve resistência à invasão. Eu posso dizer que houve uma certa passividade (por parte da PM-DF). Isso vai ser apurado por meio do inquérito policial, o que ocorreu de errado na execução (do plano) — disse ele.
Na versão dada por Oliveira, houve um erro na execução do plano elaborado pelo Departamento de Operações da Polícia Militar (DOP) para controlar o ato golpista. Segundo Oliveira, o então secretário de Segurança, Anderson Torres, também não deixou nenhuma orientação específica para aquele dia, antes de viajar para os Estados Unidos.
— O secretário tinha me demandado a questão dessa operação que estava prevista para os dias 7, 8 e 9. Tive uma explicação de como funcionava o plano de ação integrada e como eram outros protocolos. O secretário Anderson disse que deixaria o protocolo assinado e não deixou nenhuma orientação específica — afirmou.
Ao ouvir as declarações do ex-secretário, o presidente da CPI, deputado distrital Chico Vigilante (PT), comentou:
— Eu começo a concluir que o senhor foi traído.
Torres: direito ao silêncio
Ex-número 2 de Anderson Torres, foi Oliveira quem enviou um áudio a Ibaneis relatando que o clima da manifestação estava “tranquila”, “controlada” e “amena” três horas antes da invasão na Esplanada dos Ministérios.
Também estava marcado para ontem o depoimento da ex-subsecretária de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do DF Marília Ferreira Alencar. A oitiva, no entanto, foi adiada para a próxima quinta-feira. Tanto Oliveira quanto Marília foram exonerados do cargo pelo então interventor federal, Ricardo Cappelli, no dia 10 de janeiro.
Nesta quinta-feira, Anderson Torres pediu ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que possa ficar em silêncio durante a CPI da Câmara Legislativa do DF. A audiência do ex-ministro na CPI está prevista para a próxima quinta-feira. O colegiado coloca Torres como um dos principais alvos tanto da oposição quanto de aliados de Ibaneis.
A defesa de Torres invoca ao STF precedentes que tratam do direito ao silêncio em circunstâncias semelhantes. No primeiro depoimento prestado à Polícia Federal, o ex-secretário também ficou em silêncio. Em nova oitiva, disse que a minuta com a proposta de decreto golpista encontrada em sua casa era um documento “descartável”.