Ação aponta que normas de fiscalização são fundamentais para garantir a vida, a integridade física e a segurança pública da população
O Ministério Público Federal (MPF) acionou a Justiça contra a União, na última sexta-feira (15), a respeito do controle e da rastreabilidade de armas de fogo, munições e produtos bélicos no país. Em abril, o Exército revogou três portarias (46, 60 e 61) que regulamentavam o tema, flexibilizando o monitoramento sobre esses materiais. A ação civil pública pede, em caráter liminar, a declaração de ilegalidade sobre tais revogações, de forma a garantir que os normativos tornem a valer. O MPF sustenta que os dispositivos revogados atendem a exigências legais, bem como a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, e que a União não deu nenhuma justificativa válida para as revogações.
As investigações foram iniciadas após o recebimento de uma digi-denúncia, além de representação de uma procuradora regional da República, solicitando a apuração dos fatos. O MPF verificou que as portarias editadas pelo Comando Logístico do Exército foram canceladas em regime de urgência – em Edição Extra do Diário Oficial da União – sem qualquer procedimento administrativo prévio que respaldasse tal conduta. Ao ser questionada, a instituição militar justificou a revogação integral dos dispositivos por verificar erros de redação nos textos ou também por entender ser necessária a extensão de prazo para que as pessoas pudessem se adequar às exigências estabelecidas pelas normas.
No documento enviado à 22ª Vara de Justiça federal, o MPF argumenta que o controle estabelecido pelas portarias em xeque é imprescindível para a concretização de modelo efetivo de segurança pública. Ao estabelecer normas de rastreabilidade de munições, como aquelas previstas nos textos em questão, o Estado adota conduta que pode inibir o tráfico de armas, balas e outros artefatos, contribuindo assim para a investigação de crimes que os envolvam. Como exemplo, a ação cita que apenas um lote de munição pode conter até 4 milhões de artefatos. Ao deixar de numerá-los individualmente – como exigiam os dispositivos revogados – torna-se muito mais difícil elucidar crimes que tenham utilizado tais materiais.
O MPF demonstra na peça que as portarias apenas regulamentavam o que o próprio Estatuto do Desarmamento (Lei 10826/2003) e a lei que criou o Sistema Único de Segurança Pública (13.675/2018) já previam. Portanto, ao se restringir e restabelecer as normas anteriores de rastreabilidade, a União deixa de cumprir a sua obrigação de aperfeiçoar os critérios de vigilância sobre os armamentos e as munições.
“Infelizmente, com a realidade criminosa do nosso país, vivenciamos inúmeros casos de furtos e desvios de armamentos e munições. E essas armas acabam sendo disponibilizadas para facções e organizações criminosas que se utilizam do armamento sem que as autoridades públicas possam localizar esse material, tendo em vista a inadequação dos métodos de rastreabilidade e controle”, destaca a ação.
Por isso, o MPF pede que o Comando Logístico do Exército seja obrigado a fazer o controle de rastreabilidade de munições e limitação de quantitativo de munições por lote, utilizando-se dos critérios estabelecidos nas portarias revogadas. A liminar refere-se à urgência no objetivo de garantir a vida, a integridade física e a segurança pública da população brasileira.
A ação tramita sob o número 1028455-74.2020.4.01.3400.
Atos do presidente da República – Vale destacar que essa ação não busca apontar a pessoalidade e eventual desvio de finalidade no comportamento do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido), ao solicitar a revogação de atos de regulamentação expedidos pelo Comando Logístico do Exército. O objetivo da peça foi apenas apontar as irregularidades nas revogações e os graves prejuízos gerados por essas medidas.
É que a Procuradoria da República no Distrito Federal não possui atribuição para investigar e processar atos do presidente da República, nem por conduta criminal, nem por ação ímproba. Nesses casos, cabe ao Senado Federal apurar crimes de responsabilidade e ao Supremo Tribunal Federal (STF), crimes comuns.