O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou segundo Matheus Teixeira, da Folha de São Paulo, o afastamento do governador Ibaneis Rocha (MDB) do cargo de ofício, sem ter sido provocado por órgãos de investigação ou mesmo por parlamentares.
É a primeira vez que um magistrado retira um chefe de Executivo estadual do cargo sem que haja um pedido nesse sentido.
Moraes mandou afastar o emedebista do comando da capital federal no último domingo (8), poucas horas depois de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) invadirem e vandalizarem as sedes dos Três Poderes.
A ordem se soma a outras decisões heterodoxas adotadas por Moraes em inquéritos que investigam a ofensiva golpista contra as instituições patrocinadas por Bolsonaro e sua militância. A maioria do STF já referendou a decisão do magistrado contra Ibaneis, em julgamento realizado no plenário virtual.
Em 2019, o STF foi alvo de críticas por agir de ofício quando o então presidente Dias Toffoli determinou a abertura do inquérito das fake news sem pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República) nesse sentido.
Também foi criticado o fato de Toffoli ter escolhido Moraes para relatar o caso, sem sorteio, como ocorre em todos os inquéritos instaurados na corte que não têm relação com alguma outra investigação em curso no tribunal.
Na época, a abertura da apuração sofreu grande resistência no meio jurídico e dentro do próprio STF. Prova disso é que Toffoli só submeteu a decisão ao plenário da corte mais de um ano depois, em junho de 2020.
Àquela altura, o cenário havia mudado. A ampliação dos ataques contra integrantes da corte pela militância bolsonarista e pelo então presidente mudou o humor da maioria dos ministros. Parte dos magistrados inicialmente era crítica do inquérito, mas depois se tornou favorável por ver em Moraes um meio para proteger a instituição.
Depois disso, as ordens judiciais heterodoxas de Moraes se acumularam. A última foi a do afastamento de Ibaneis. A decisão foi tomada em ações apresentadas pela AGU (Advocacia-Geral da União) e pelo líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Nenhum dos dois, porém, pediu especificamente o afastamento do governador.
Moraes descreveu os pedidos feitos por ambos e, em nenhum momento, citou solicitação para que o governador fosse retirado do cargo. A representação da AGU pediu a “prisão em flagrante de todos os envolvidos, inclusive do secretário de Segurança do DF e demais agentes públicos responsáveis por atos e omissões”, mas não mencionou o nome de Ibaneis.
O ministro afirmou que o afastamento do governador é necessário para impedir que ele destrua provas sobre possíveis omissões que levaram à atuação leniente da Polícia Militar do DF que permitiu a invasão dos palácios de Brasília.
Ele disse que Ibaneis teve uma “conduta dolosamente omissiva” e que ele “deu declarações públicas defendendo uma falsa ‘livre manifestação política em Brasília’ mesmo sabedor por todas as redes que ataques às instituições e seus membros seriam realizados”.
“Na presente hipótese, verifico haver necessidade de se impor medida cautelar diversa da prisão –uma vez que não houve representação da PF ou requerimento da PGR pela prisão preventiva— consistente na suspensão do exercício da função pública”, afirmou Moraes.
Em 2017, o plenário do Supremo discutiu o procedimento para afastamento de governadores. Geralmente, esse tipo de decisão é tomada pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), que é o tribunal competente para julgá-los.
Na ocasião, o tribunal firmou o entendimento de que os estados não podem criar leis que exijam aval da respectiva Assembleia estadual para confirmar o afastamento.
Na análise do tema, o ministro Luís Roberto Barroso abriu margem para o afastamento de ofício de governadores ao prever que medidas “podem ser tomadas pelo juízo com base no poder geral de cautela conferido pelo ordenamento jurídico brasileiro aos juízes”.
No entanto, esse ponto do voto do magistrado não foi aprofundado pelos demais. Na prática, o aval pelos demais magistrados do STF à decisão de Moraes, em julgamento nesta quarta (11), institui a jurisprudência no tribunal de que qualquer ministro pode, sozinho e sem ter sido provocado, afastar do cargo um governador eleito pela maioria da população de uma unidade da federação.