Ministros do presidente Lula da Silva (PT) têm criticado de acordo com Jeniffer Gularte, do O Globo, sobre a falta de ‘cálculo político’ do governo antes da publicação da norma da Receita Federal que ampliava a fiscalização das movimentações financeiras, incluindo o Pix. Para titulares da Esplanada, o governo foi atropelado por uma crise “evitável”. Internamente, integrantes do primeiro escalão também divergem sobre a necessidade de Lula ter recuado da medida após a onda de fake news que pressionou o Palácio do Planalto.
A crítica feita por esses auxiliares é que Lula cedeu à oposição e não conseguiu reagir à altura da repercussão do vídeo do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG). A gravação, que ultrapassou até sexta-feira 314 milhões de visualizações só no Instagram, sugere que o aumento da fiscalização das transações poderia representar no futuro a taxação das movimentações via Pix.
Auxiliares que não estiveram diretamente envolvidos nas discussões identificam erro de origem na medida e certa inocência do governo em achar que uma normativa da Receita Federal que pretende ampliar mecanismos contra sonegação fiscal poderia não repercutir negativamente. Dentro do Planalto, também não havia consenso sobre a Instrução Normativa da Receita, publicada em setembro e que entrou em vigor em 1º de janeiro.
Em entrevista ao GLOBO, o ministro dos Transportes, Renan Filho, avaliou que o governo errou ao ceder às críticas e à pressão da oposição. Na visão de Renan Filho, o Executivo tinha o “argumento certo” e se o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tivesse entrado numa campanha, teria superado a propagação de “mentiras”.
— Na política, sempre se tem que perseverar na discussão e convencer as pessoas, sobretudo quando você está com o argumento certo. O vídeo que o Nikolas gravou é mentiroso. Tem que ser combatido por alguém do tamanho do ministro Fernando Haddad — afirmou.
A avaliação de Renan Filho é compartilhada por outros colegas de Esplanada que apostam que Haddad seria capaz de reverter o quadro, enquanto o recuo deixou claro que o governo se assustou com o estrago que a desinformação provocou na opinião pública.
Outra ala também avalia que a normativa deveria ter sido antecipadamente melhor comunicada à população. Sob reserva, um dos ministros afirma que o caso é apenas mais um sintoma de um problema maior do governo, que parte de uma lógica de comunicação equivocada onde entregas e atos são comunicados depois de já estarem na rua. Também pondera que governo precisa hierarquizar melhor suas pautas e escolher as brigas certas para entrar. Há grande expectativa entre um grupo de ministros que a chegada de Sidônio Palmeira à Secom inverta essa lógica para uma postura mais reativa e estratégica do governo frente ao ambiente de uma “oposição mal-intencionada”.
Integrantes da Fazenda, no entanto, alegam que normativas da Receita Federal não mecanismos técnicos que não são submetidos a campanhas de comunicação. Ministros aliados a Haddad reafirmam a importância do mérito da medida e defendem que a Fazenda retome a proposta em algum momento.
A reunião que chancelou o recuo, na tarde de quarta-feira, teve decisão unânime entre Lula e os ministros Fernando Haddad (Fazenda), Jorge Messias (AGU) e Sidônio Palmeira (Secom). Horas antes dessa conversa, no entanto, o próprio Haddad avaliava que o governo não devia recuar.
Recém-chegado ao Planalto, Sidônio foi um dos fiadores da decisão de Lula. Um dos argumentos era que a batalha estava perdida junto à opinião pública. A avaliação interna foi que uma campanha publicitária não seria capaz de contornar os impactos de quase duas semanas de desinformação. De férias desde quarta-feira, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, também estava sintonizado com Sidônio Palmeira e concordava com o recuo.