Conforme Alice Cravo, Jeniffer Gularte e Paula Ferreira, do jornal O Globo, após um mês depois da posse do novo governo, o cenário na Esplanada dos Ministérios ainda é de improviso e vácuo de mão de obra com potencial de atrapalhar o andamento de políticas públicas. Um exemplo disso são pastas criadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para servir de contraponto à administração de Jair Bolsonaro, como Igualdade Racial, Mulheres e Povos Indígenas, que na prática estão funcionando como uma espécie de “ministérios ocos”, com poucos servidores e sem espaços físicos para tocar suas ações. Paralelo a isso, a demora na nomeação de cargos em segundo e terceiro escalões, reservados para barganha política pelo Palácio do Planalto, tem deixado sem comando setores estratégicos.
É o caso do Minha Casa Minha Vida, uma das vitrines do novo governo. O Ministério das Cidades ainda não escolheu o diretor que fará a interface entre a pasta e o setor de FGTS da Caixa Econômica Federal, fundamental para conceder os financiamentos imobiliários. A despeito da indefinição, o plano é relançar o programa no próximo dia 14.
Após queixas de ministros sobre a falta de estrutura, Lula pediu ao ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, um relatório com as nomeações que já foram feitas e as que ainda estão pendentes. De acordo com interlocutores, o presidente quer acompanhar de perto essas definições para identificar quais gestores foram ou não atendidos.
A situação, porém, tem provocado desgastes entre integrantes do governo. De um lado, ministros criticam a demora para nomeação de pessoal, de outro, auxiliares próximos de Lula no Palácio do Planalto afirmam ter virado para-raios de reclamações. Um dos alvos da insatisfação é a Casa Civil, responsável por fazer um pente-fino nos nomes indicados para ocupar cargos de confiança, e a Relações Institucionais, que faz a análise política para identificar, por exemplo, vinculações partidárias.
— Na Casa Civil é rápido. A análise que faz é se a pessoa tem algum impedimento para ser nomeada, eventualmente. Se tem empresa no nome, notifica a pessoa, para que saia da sociedade e do cargo nessa empresa. Isso, às vezes, demora, mas não é demora da Casa Civil. Em um, dois dias a gente consegue analisar. A pendência é de a pessoa responder caso falte informações — disse o ministro Rui Costa, se eximindo de responsabilidade pela demora nas nomeações.
Mas as reclamações vão além da falta de pessoal. Questões triviais como falta de equipamentos, salas e até de e-mail para os novos servidores têm incomodado integrantes do novo governo. Com pouco orçamento e a promessa de Lula de não criar cargos, ministérios novos ou recriados terão suas estruturas montadas do zero. Ainda não há sequer login para acesso de servidores a sistemas internos e nem crachás para entrar nos prédios.
No recriado Ministério do Esporte, os funcionários têm usado o próprio computador. Além da desconfiança em salvar arquivos nas máquinas que eram usadas pela equipe de Jair Bolsonaro, não há número suficiente para todos. Há ainda os que aguardam sua nomeação e, enquanto isso, trabalham em homeoffice.
A falta de novas vagas inflacionou o mercado de algumas categorias, como a de cerimonialistas. No Igualdade Racial, um servidor lotado em outra pasta que foi convidado para trabalhar com a ministra Anielle Franco contou ter recebido convites iguais de outras três pastas. Há dificuldade também em encontrar servidores especializados em questões fundiárias, para trabalhar com comunidades quilombolas. Nos dois casos, os profissionais com mais experiência e trânsito na Esplanada se tornam os mais cobiçados pelos novos ministros.
A pasta de Anielle é um exemplo claro de “ministério oco”. A ministra nomeou cerca de 30 dos 151 cargos a que terá direito. Das três secretarias, apenas uma, a de Políticas de Ações Afirmativas e combate ao Racismo, já tem titular nomeado. Os responsáveis pelas outras duas já foram escolhidos, mas faltam as publicações no Diário Oficial da União.
Ainda está indefinido até mesmo o espaço que, quando completo, o ministério ocupará. Atualmente, o Igualdade Racial divide o mesmo prédio com outras quatro pastas — Mulheres, Povos Indígenas, o Desenvolvimento Social, além de parte do Desenvolvimento Agrário. O problema só não é maior porque boa parte das equipes ainda não foi nomeada. Caso não haja um remanejamento, porém, haverá servidores sem lugar para sentar e trabalhar.
No Ministério das Cidades, uma costela do antigo Desenvolvimento Regional, assessores especiais, chefe de gabinete, assessoria parlamentar, jurídico, comunicação e cerimonial da pasta dividem um espaço de três salas, como num coworking — compartilhamento de área de trabalho. Apenas o ministro Jader Filho (MDB) e seu secretário-executivo possuem salas próprias.
A estrutura improvisada tem afetado até mesmo benesses a ministros. No Ministério dos Portos, por exemplo, Márcio França usa o carro próprio para se deslocar, enquanto o veículo oficial fica à disposição de Renan Filho, dos Transportes, com quem divide o prédio.