O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli afirmou na manhã desta sexta-feira (15) que o Ministério Público tem um poder extraordinário no país. Segundo ele, o órgão foi criado para atuar como contraponto ao Judiciário, visto como retrógrado.
“A Constituição deu esse empoderamento como alternativa para a sociedade brasileira, em uma espécie de quarto poder”, disse em palestra no VI Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral, em Curitiba (PR).
Toffoli afirmou que o protagonismo do Ministério Público tem raízes na nova sociedade que buscava-se criar com a constituição de 1988. Na sua visão, os constituintes não acreditavam ser possível criar um novo modelo social a partir de um Judiciário retrógrado e de uma Suprema Corte indicada pelos militares. “Vamos criar uma instituição que vá conseguir trazer a efetividade dos direitos em nome da sociedade.”
Questionado se o Judiciário deveria atuar como árbitro ou protagonista, o ministro disse que os juízes não podem, jamais, ser protagonistas. “Se quisermos ser protagonistas vamos ser substituídos. E por quem? Se somos os árbitros, não podemos ser, jamais, protagonistas.”
Segundo ele, este foi o erro cometido pelas Forças Armadas em 1964, ao decidirem protagonizar, em vez de arbitrar. “Em 1° de abril de 1964, eles entraram para arbitrar uma crise na sociedade brasileira. No dia 15 de março de 1964, Castelo Branco era eleito para terminar o mandato de João Goulart. Era uma transição.”
SOCIEDADE LÍQUIDA
A palestra de Toffoli, intitulada “O papel do Supremo Tribunal Federal em matéria eleitoral”, foi recheada de citações. Para explicar a fragmentação da política, exemplificada pelo grande número de partidos no Brasil, o ministro recorreu ao filósofo Zygmunt Bauman, criador do conceito de “modernidade líquida”.
Segundo Toffoli, a fragmentação política nada mais é do que a fragmentação da “sociedade líquida” em que vivemos. “Um mundo em que as pessoas sabem o que não querem, mas não sabem o que querem.”
Ele ressaltou que o país não chegou a um propósito único, o que ficaria claro na apresentação das pré-candidaturas à Presidência. “A quatro meses das eleições, quem apresentou um projeto de nação? Absolutamente ninguém.”
De acordo com Toffoli, o grande número de partidos não é consequência de decisão do STF que, em 2006, considerou inconstitucional a cláusula de barreira, mas sim da liquidez social. O ministro disse que a sociedade atual, de transição, viverá um sistema de governança caótico, de decisões contraditórias e antagonistas.
“Deus está morto. O que virá no lugar de Deus?”, questionou, em referência à obra do filósofo Friedrich Nietzsche.
PAPEL DO SUPREMO
Para Toffoli, que assumirá a Presidência da corte em setembro, o STF não deve alterar interpretações depois de iniciado o processo eleitoral. “O ideal é que uma vez chegado o período de seis meses [antes das eleições], já se tenha estabilidade das normas e que a jurisprudência não oscile mais, não tome decisões antagônicas.”
O ministro também disse que a corte só age quando é provocada e obrigada a decidir. “Acertamos na grande maioria das vezes. Talvez a cláusula de barreira, de desempenho, tenha sido equivocada.”
Toffoli afirmou que, toda vez que o Supremo entra numa seara estrita ao campo político-eleitoral, as decisões estão sujeitas aos parâmetros da Constituição e das leis. “Acaba sendo depois discutido no Congresso e vem uma reação normativa às decisões tomadas”, disse.