O Ministério Público Federal (MPF) avalia ir ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra o juiz Antonio Claudio Macedo da Silva, da 10ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal, responsável pelas ações penais da Operação Zelotes na primeira instância.
A justificativa para a medida, sob análise de procuradores, é o excesso de prazo em processos que já têm sentença e deveriam ter sido encaminhados ao segundo grau, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). Eles consideram que ações foram “travadas” e reabertas por aspectos que não deveriam ser rediscutidos.
Procurado pela ‘Coluna Estadão’, o magistrado afirmou que não tem a obrigação de explicar suas decisões à imprensa.
A Operação Zelotes foi deflagrada em março de 2015 para apurar denúncias de um esquema de compra de decisões no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), última instância administrativa para o julgamento de autuações da Receita Federal a empresas e pessoas físicas. O objetivo seria vender, por meio de conselheiros e auditores, informações privilegiadas e facilidades que pudessem resultar na reversão de multas discutidas no Carf.
No chamado “caso Bradesco”, um dos desdobramentos da operação, a sentença é de agosto de 2022, proferida à época por outro juiz, mas continua na primeira instância.
“Consoante o princípio da inalterabilidade da sentença pelo juiz, proferida a sentença de mérito, esgota-se a prestação jurisdicional do juízo de primeiro grau. Vale repetir, esgotou-se a prestação jurisdicional, sendo vedado ao juiz, de ofício ou a requerimento, reconsiderar ou alterar a sentença anterior. Qualquer decisão em sentido contrário resultaria em verdadeira usurpação da competência do TRF-1″, destacou o MPF, em manifestação de janeiro.
Uma movimentação recente do caso chamou a atenção dos procuradores. Como revelou a Coluna do Estadão, o juiz Antonio Claudio Macedo da Silva declarou como falso um Relatório de Inteligência Financeira (RIF) do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) que mostrava movimentação financeira atípica em maio de 2005. Com a decisão, réus começaram a pedir, neste mês de fevereiro, paralisação e anulação de processos e condenações.
Sentença do juiz Antonio Claudio Macedo da Silva
Quem solicitou a declaração de falsidade do relatório foi Jorge Victor Rodrigues, ex-conselheiro do Carf. O imbróglio está relacionado ao registro de uma operação de R$ 2,8 milhões na conta de uma empresa que era de Jorge, a SBS Consultoria Empresarial mantida no Bradesco. O problema detectado é que o valor mencionado no RIF não aparece no extrato bancário, apesar de os relatórios de inteligência serem produzidos a partir de dados gerados pelos bancos. E até hoje nunca surgiu uma explicação definitiva sobre o episódio.
Com a declaração de falsidade do relatório, a defesa do ex-conselheiro do Carf – que é réu em cinco ações penais da Zelotes, condenado à prisão em duas delas – requereu na última segunda-feira, 17, a anulação de todas as ações penais, invocando a tese dos “frutos da árvore envenenada”. O argumento é o de que, se a investigação começou de forma irregular, todo o resto está comprometido e deve ser anulado.
O MPF entende a decisão não afeta as ações penais nem as condenações já decididas porque as denúncias não usam o referido relatório como lastro, mas uma série de outros elementos de investigação considerados.
“Ainda que, em remota hipótese, o RIF seja declarado inidôneo, tal circunstância não tem o condão de nulificar as ações penais a que responde o apelante, tendo em vista que a suposta transação bancária alegada como inexistente não é objeto de qualquer das referidas ações”, disse a Procuradoria, em parecer de fevereiro.
Entretanto, sob reserva, procuradores admitem que, na prática, a decisão da 10ª Vara representa um risco de impunidade e pode representar anulação de condenações e mesmo de ações penais que ainda nem têm sentença proferida.
Juiz foi punido com censura pelo CNJ em 2023
O juiz Antonio Claudio Macedo da Silva já é conhecido pelo CNJ. Em 2023, o Conselho aplicou a ele, por unanimidade, uma pena de censura por causa de publicações realizadas ainda em 2019 em seu perfil nas redes sociais.
O CNJ entendeu que “as condutas examinadas evidenciam notório excesso de linguagem na crítica pública depreciativa à conduta de membro do Supremo Tribunal Federal”. A postura é “afronta ao art. 95, parágrafo único, da Constituição Federal e a outros artigos da Loman [Lei Orgânica da Magistratura]”.
O juiz Macedo da Silva, segundo o processo disciplinar, fazia críticas públicas ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e à magistratura. Escreveu, entre outras coisas, que manifestações públicas do ministro eram caso para impeachment.
Sobre a punição que sofreu, ao ser indagado pela ‘Coluna do Estadão’, ele disse somente que ela não guarda relação com a Operação Zelotes.