A entrevista de Aécio Neves à Folha expôs segundo Alberto Bombig, colunista do UOL, as entranhas da luta fratricida do PSDB, agregando ainda mais negatividade à chamada terceira via, justamente no momento em que a nova rodada de pesquisas eleitorais indica que a polarização entre Lula e Jair Bolsonaro se torna uma realidade quase irreversível já no primeiro turno da eleição presidencial.
Em que momento o partido que governou o Brasil por oito anos e tomou para si bandeiras importantes como o Plano Real descambou para este roteiro no qual se sobressaem apenas intrigas, egos inflados e o salve-se quem puder parlamentar?
Os tucanos estão perdidos nesta que tem tudo para ser a eleição mais importante desde 1989, quando Mario Covas (1930-2001) apresentou ao país seu ousado (ao menos para época) “choque de capitalismo”. Hoje, o PSDB se assemelha mais a um catadão de políticos diversos, sem qualquer compromisso programático e ideias para modernizar o Brasil, do que de um partido que nasceu “longe das benesses oficiais, mas perto do pulsar das ruas”, conforme a definição de Franco Montoro (1916-1999), em 1988.
Portanto, a segunda pergunta a ser feita é: como o PSDB pode sair da atual enrascada da pré-candidatura presidencial neste 2022 e preservar o que ainda resta de seu legado? São perguntas para as quais não há resposta pronta, obviamente.
Quem conhece a fundo o PSDB, porém, não tem dúvidas em afirmar que a saída mais honrosa, em sintonia com a história do partido, estaria mais perto das posições adotadas por Geraldo Alckmin, sétima assinatura na ata de fundação, e por Aloysio Nunes Ferreira, filiado desde 1997. Ambos, como se sabe, estão na barca da “frente ampla” de Lula, exatamente como fez Mario Covas no segundo turno de 1989.
Naquela eleição presidencial, a primeira após a ditadura, Covas, após ter ficado em quarto lugar no primeiro turno, colocou todo seu peso político para evitar que o PSDB estivesse com Fernando Collor. O apoio a Lula não garantiu a vitória ao petista no segundo turno, mas é inegável que manteve o partido tucano em sintonia com seu programa de fundação e bem posicionado para, em 1994, vencer a eleição e chegar ao Palácio do Planalto no ano seguinte. Ou seja, os estilhaços do impeachment de Collor, em 1992, não alvejaram os líderes tucanos, quase todos veteranos das batalhas pela volta da democracia no país.
É por esse motivo que chama a atenção na mais recente entrevista de Aécio Neves (PSDB) à Folha de S. Paulo que ele sequer cogite apoiar Lula neste ano. Prefere insistir na tese de que o petista e Jair Bolsonaro são inimigos dos tucanos, duas faces da mesma moeda. Até as emas do Palácio do Planalto sabem a quem interessa esse discurso, essa posição de “neutralidade”. Ao atual presidente.
Sim, o PT puxou o “Fora FHC” nos anos 90. Sim, recém-empossado presidente da República, Lula falou em “herança maldita” de seu antecessor. Claro, Mario Covas foi agredido por militantes petistas no centro de São Paulo. Motivos não faltam para quem quiser insistir na rixa entre PT e PSDB. Eles perdem relevância, no entanto, quando o próprio Fernando Henrique Cardoso, ainda em maio de 2021, posou para uma foto ao lado de Lula e fez questão de demarcar as diferenças entre as pré-candidaturas do petista e de Bolsonaro.
Um ano depois, o gesto de FHC parece não ter sensibilizado corações e mentes no partido. Aécio, agora deputado federal (MG), é o mesmo que, uma vez derrotado por Dilma Rousseff em 2014, foi até a Justiça Eleitoral para contestar, sem evidências concretas, o resultado final daquela eleição, iniciando um período de incertezas e de radicalizações na vida política brasileira. E aqui talvez esteja uma pista para responder a primeira pergunta deste texto (em que momento o PSDB saiu dos trilhos?).
A Executiva do PSDB se reúne amanhã para discutir o que fazer com a pré-candidatura de João Doria ao Planalto, após o ex-governador ter divulgado uma carta no final de semana. O clima é de grande tensão, pois quase todas as pontes já foram implodidas e a desconfiança é generalizada. A lista com todos os ardis típicos da política miúda estará nos bolsos dos coletes. O veredicto, se houver, muito provavelmente será contestado por quem perder. Pouco importa. Se tivesse mesmo a disposição de honrar a memória de vários de seus fundadores e de buscar em seu passado uma lição para o presente, uma resposta para a segunda pergunta desta carta (como preservar o que resta do legado do partido?), o PSDB não viraria as costas para Lula como fez Aécio.
Como disse Nunes Ferreira, o primeiro turno já está virando segundo. Se não consegue apresentar projetos ou propostas que o diferenciem de Lula e de Jair Bolsonaro, o PSDB pode tentar ao menos ser coerente com sua gênese.
Agregador UOL: a nova rodada de pesquisas