O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), sinalizou que não deve colocar para votar o projeto aprovado pelos senadores que limita em 30% ao ano os juros cobrados no cheque especial e no cartão de crédito em operações contratadas até o fim do ano.
Para Maia, uma intervenção do Congresso nesse sentido pode provocar efeito colateral em outras linhas, encarecendo e limitando o crédito para os consumidores. Na visão do presidente da Câmara, os bancos precisam encontrar de maneira rápida “soluções” para produtos tão “nocivos” aos clientes.
“Os bancos têm que criar novos produtos no lugar do cartão de crédito e do cheque especial. Não dá mais para a sociedade pagar essas taxas de juros. Mas as soluções não são de intervenção no mercado financeiro. As soluções têm que vir dos próprios bancos, que precisam entender que vão abrir mão de uma receita. Da mesma forma que a sociedade não aceita mais pagar impostos, ela não aceita mais pagar os juros do cheque especial e do cartão de crédito”, disse Maia ao Estadão, ressaltando que o projeto é daqueles que “tem cara boa, mas gera muitos problemas”.
O projeto foi aprovado na quinta-feira, 6, pelos senadores por 56 votos favoráveis, 14 contrários e uma abstenção. No caso das fintechs (empresas de tecnologia do setor financeiro), o limite de juros proposto é de 35% ao ano.
Os senadores ainda aprovaram uma emenda do PT abrindo espaço para o tabelamento permanente dos juros em operações de crédito com cartões após o período de calamidade pública, no próximo ano. A medida prevê que o Conselho Monetário Nacional (CMN) regule o limite de juros no cartão, assim como fez com o cheque especial, após o período de calamidade pública. O CMN é formado por dois representantes do Ministério da Economia (o ministro e o secretário especial de Fazenda) e o presidente do Banco Central.
A proposta original era de que, até julho de 2021, os bancos cobrariam até 20% ao ano em operações de crédito com cartão e no cheque especial. Posteriormente, para a proposta ter mais apoio entre os parlamentares, o teto proposto foi ampliado para 30% ao ano no caso dos bancos e a 35% ao ano entre as fintechs.
Ao justificar a proposta, Alvaro Dias defendeu que, durante a crise, o cartão de crédito e o cheque especial seriam utilizados por profissionais liberais e empregados em geral para pagar as contas. Sem renda, eles entrariam no rotativo do cartão, com juros que “superam 300% ao ano, de acordo com dados divulgados pelo Banco Central, com instituições financeiras cobrando até mais de 600%”.
Rotativo tem juro médio de 300% ao ano
De acordo com dados do Banco Central, o juro médio total cobrado pelos bancos no rotativo do cartão de crédito (quando o cliente paga pelo menos a fatura mínima) está em 300% ao ano (cinco de 55 instituições financeiras cobram em julho juros superiores a 600% ao ano). No caso do cheque especial, a taxa média foi de 110% ao ano.
Desde janeiro deste ano, o limite para a taxa de juros do cheque especial pessoa física fixado pelo Banco Central é de 8% ao mês, o equivalente a cerca de 150% ao ano. Os juros são cobrados quando o cliente acessa seu limite de crédito, pré-aprovado pelas instituições financeiras.
O crédito rotativo do cartão de crédito pode ser acionado por quem não pode pagar o valor total da sua fatura na data do vencimento, mas não quer ficar inadimplente. Para usar o crédito rotativo, o consumidor paga qualquer valor entre o mínimo e total da fatura. O restante é automaticamente financiado e lançado no mês seguinte, com juros.
As duas linhas estão entre as mais caras, quando comparadas com os juros cobrados em outros tipos de empréstimos, como o pessoal ou consignado. Por isso, são classificadas como “emergenciais” e, segundo analistas, só devem ser usadas se for realmente necessário, por um período curto de tempo.
Em meio à pandemia da covid-19, o porcentual de famílias com dívidas atingiu em junho o recorde histórico de 67,1%, segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor, realizada pela Confederação Nacional do Comércio (CNC).
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) diz concordar com a necessidade de reduzir o custo do crédito. “Mas entende que o tabelamento, ao invés de promover alívio financeiro, pode agravar a crise por distorcer a formação de preços, criar gargalos e gerar insegurança jurídica”, diz o presidente da instituição, Isaac Sidney, em nota.