Nicolás Maduro não quer as terras do planalto do Essequibo com suas matas seculares. O mapa que ele exibiu, incorporando mais da metade das terras da Guiana, foi um gesto teatral. Seu interesse está debaixo d’água, na plataforma continental, onde foi achada uma reserva de petróleo estimada em 11 bilhões de barris, algo equivalente a 75% das reservas brasileiras.
No mesmo dia em que Maduro nomeou um general para governar as terras hipotéticas, ele autorizou a estatal PDVSA a negociar contratos para a exploração do petróleo na zona de litígio.
Problema: a Guiana tem um contrato com a ExxonMobil americana para operar na reserva e um acordo de cooperação militar com os Estados Unidos. Maduro disse que ela tem três meses para suspender suas operações. Na quinta-feira (7), o Comando Sul dos EUA anunciou “operações de rotina” na Guiana.
No meio de tantas ameaças, Maduro disse que “está aberto para conversar”. Ele busca uma janela de oportunidade para arrancar da Guiana pelo menos uma parte do petróleo que venha a sair do fundo do mar. Maduro espera que apareçam mediadores que peçam negociações, ignorando o absurdo de seu ultimato. Essa é a melhor das hipóteses, para ele.
Na pior, e a mais provável, se ele não recuar, a Marinha americana, com o possível apoio da inglesa, garantirá a exploração de petróleo nas águas territoriais da Guiana.
Nesse caso, Maduro entraria para a galeria onde estão os retratos de Saddam Hussein, Leopoldo Galtieri. Um invadiu o Kuwait em 1990 e acabou enforcado em 2006. O outro invadiu as ilhas Malvinas em abril de 1982 e foi deposto em junho.
Eremildo, o idiota
Eremildo é um visionário e defende a criação de um organismo supranacional para resolver todos os problemas do mundo, sem que o Congresso de cada país possa barrar suas decisões.
O cretino achou correta a decisão do Itamaraty de classificar o plebiscito para decidir a questão da anexação do Essequibo como “um assunto interno da Venezuela”.
Eremildo teme apenas que Javier Milei resolva denunciar o laudo arbitral do presidente americano Grover Cleveland de 1895 e convoque um plebiscito para que os argentinos decidam se ele deve anexar o oeste de Santa Catarina.
Jânio queria encrenca com a Guiana
Presidente tatarana querendo encrenca com a Guiana não é uma exclusividade da Venezuela. Jânio Quadros namorou essa ideia, quando não se conheciam suas reservas de petróleo.
No dia 31 de julho de 1961 ele mandou um bilhete aos ministros militares armando o bote:
“1) Desejo chamar a atenção de Vossas Excelências para o problema das três Guianas, submetidas a intenso trabalho autonomista ou de emancipação nacional, com a presença de fortes correntes de esquerda, algumas, reconhecidamente, comunistas.
2) Cumpre traçar, com urgência, planos em relação às mesmas, e executá-los.
Haverá, ainda, a possibilidade da nossa penetração nesses três Estados e, eventualmente, a da integração respectiva, no todo ou em parte, a nosso país?”
Uma semana depois ele voltou ao tema, anunciando que trataria das Guianas numa próxima reunião ministerial.
No dia 21 de agosto haviam-se realizado eleições na Guiana Inglesa, vencidas pelo primeiro-ministro Cheddi Jagan, um líder popular, que se afastava da Inglaterra.
Jânio voltou ao assunto, no dia 23, sem falar em anexação territorial, e escreveu aos ministros militares:
“Excelências
1) Com as recentes eleições da Guiana Britânica instalar-se-á, sem dúvida, ao Norte do Brasil, um país de estrutura soviética. Conheço o dirigente desse novo governo e considero-o da mais alta periculosidade;
2) Solicito de Vossas Excelências, nas respectivas pastas e no Conselho de Segurança, a máxima vigilância no que respeita à infiltração comunista nas Forças Armadas e nos setores fatais [vitais] da economia e do trabalho da nação.”
No dia 25 de agosto, Jânio teve outra ideia e renunciou à Presidência da República achando que voltaria ao poder nos braços do povo.
Deu no que deu.
(Dois anos antes, o cubano Fidel Castro havia renunciado ao cargo de primeiro-ministro depois de se desentender com o presidente Manuel Urrutia. Dias depois o povo reconduziu-o ao poder.)
Por Elio Gaspari do jornal O Globo