O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) embarca para a cúpula do clima (COP 28) em Dubai e para um périplo pelos países árabes nesta segunda-feira (27), deixando segundo Andrea Jubé e Raphael Di Cunto, do jornal Valor, para trás um rastro de insatisfação no Congresso. Ele ficará nove dias fora, em meio à apreensão quanto ao avanço da agenda econômica nas duas Casas. A tensão é maior entre os deputados, que cobram o pagamento, principalmente, das chamadas “emendas pix”, cujos recursos caem direto para os cofres das prefeituras.
Apesar do tempo fechado no parlamento, o governo tem expectativa de que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), não viaje para Dubai a fim de comandar, pessoalmente, as votações no plenário dos projetos do Ministério da Fazenda que elevam a arrecadação. Pacheco tem de assegurar a apreciação das propostas até quarta-feira, porque no fim da semana, uma comitiva de até 15 senadores embarca para a COP 28, deixando o plenário com quórum reduzido até 10 de dezembro.
Na semana passada, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), abriu as duas reuniões de líderes reclamando do Executivo quanto ao não pagamento de emendas e descumprimento de acordos. Na quarta-feira, Lira afirmou que “não dá mais para sentar com o governo se não cumprem acordos”, conforme relato de alguns dos presentes ao Valor.
O aumento da pressão sobre o governo é reflexo direto da carga dos prefeitos sobre os deputados. Principais cabos eleitorais dos deputados, os prefeitos estão enfrentando dificuldades na véspera das eleições municipais. A queda da arrecadação federal refletiu-se nos repasses às Prefeituras, já que recursos federais irrigam o Fundo de Participação dos Municípios (FPM).
É neste cenário que os deputados cobram o pagamento das “emendas pix”, ou “transferências especiais”, porque os recursos podem ser transferidos diretamente dos cofres federais para os municípios, sem que os parlamentares tenham de especificar a sua destinação.
De acordo com o portal Siga Brasil, o governo autorizou o pagamento de até R$ 7 bilhões de “emendas pix” neste ano. Os recursos só começaram a sair do papel em julho, com o empenho (promessa de pagar) de R$ 6,3 bilhões. Em agosto e setembro, foram pagos R$ 4,78 bilhões. Desde então, não houve mais empenho ou pagamento: os deputados cobram, pelo menos, mais R$ 1,7 bilhão restante do total autorizado, fora os chamados “restos a pagar” dos anos anteriores.
O grupo político de Arthur Lira também está descontente com a lentidão no cumprimento do acordo em relação ao controle da Caixa Econômica Federal, já que os parlamentares desse bloco foram contemplados com a presidência do banco e as respectivas 12 vice-presidências. Mas, até o momento, somente o novo presidente, Carlos Antônio Vieira, tomou posse, e um dos vice-presidentes foi destituído do cargo: Júlio Volpp, vice-presidente de Rede de Varejo. Nenhum novo vice foi nomeado até agora.
Grupo político de Lira também reclama de demora em nomeações para a Caixa
A insatisfação com o represamento das emendas existe nas duas Casas, mas é maior entre os deputados, que dependem mais dos prefeitos para se elegerem do que os senadores. Nas duas Casas, entretanto, os parlamentares reclamam do não cumprimento de acordos celebrados com o governo em relação aos vetos.
Lula não respeitou acordos celebrados pelos articuladores políticos do governo com o Congresso em relação ao arcabouço fiscal, ao novo marco das garantias, entre outros. Em relação à nova regra fiscal, por exemplo, havia o compromisso de que o texto seria sancionado integralmente, mas o presidente vetou dois artigos.
Pacheco anunciou que ainda definirá uma data para a sessão do Congresso em que os vetos serão analisados, com tempo hábil para que os ânimos esfriem. Até lá, o presidente do Senado vai priorizar a votação no plenário da Casa dos projetos de taxação de fundos offshore e exclusivos, e da regulamentação do imposto sobre apostas esportivas (“bets”), na terça e na quarta-feira, antes que a comitiva de senadores embarque para os Emirados Árabes.
O risco de um plenário esvaziado vai se repetir na Câmara, porque Lira embarca para Dubai com uma comitiva de 25 deputados no dia 4 de dezembro, e também só retorna no dia 10. Por isso, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, espera que técnicos da pasta ajustem um texto definitivo da medida provisória (MP) 1185 com a equipe de Lira ainda nesta semana.
Esta MP é a proposta com maior peso arrecadatório do pacote para turbinar a receita, ao estabelecer a tributação, com impostos federais, das subvenções do ICMS concedidas pelos Estados às empresas. O cálculo é de uma arrecadação estimada em R$ 35 bilhões.
O problema, todavia, é que a matéria é controversa, ainda não tem texto final nem relator, e o governo tem de dialogar com o mau humor dos deputados. Se a medida provisória não for apreciada até quinta-feira na Câmara, restarão apenas duas semanas de votações antes do recesso (a partir de 11 de dezembro), com a análise do Orçamento de 2024 como prioridade. Como a MP expira em 7 de fevereiro, logo na retomada dos trabalhos no ano que vem, há o risco real de a proposta caducar.