Depois de estabilizar a relação com a Câmara, mas continuar acumulando derrotas na Casa vizinha, o presidente Lula da Silva (PT) decidiu segundo Camila Turtelli, do O Globo, entrar em campo e deve se reunir nos próximos dias com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), além de buscar lideranças partidárias, com o objetivo de evitar novos reveses. Enquanto o titular do Palácio do Planalto age para colocar panos quentes, contudo, a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), aumentou o tom nas críticas a Pacheco, em uma tentativa de marcar posição do partido nas disputas no Legislativo.
Na terça-feira, ela criticou o projeto que estabelece a obrigatoriedade de pagamento de emendas de comissões permanentes do Congresso, que está sendo analisada em um dos colegiados do Senado. A petista disse que o tema contraria o discurso de Pacheco a favor do ajuste fiscal. O presidente do Senado alfinetou a parlamentar e pontuou que “o equilíbrio das contas públicas passa, inclusive, pelo aperfeiçoamento das “emendas Pix”, criadas pela deputada.
Em gestos à oposição, o parlamentar mineiro tem dado andamento a projetos alinhados à pauta conservadora, dentro de uma equação que já vislumbra a candidatura de Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), seu aliado, para o comando do Senado em 2025. Na semana passada, Gleisi reagiu e afirmou que Pacheco prestava um serviço para a extrema-direita ao pautar a PEC que limita decisões de ministros do STF. Em resposta, ele disse que a declaração de Gleisi “retroalimenta a polarização”.
Reação do planalto
Nesse cenário conflagrado, Lula sinalizou que deve se reunir com Pacheco nos próximos dias, segundo interlocutores do Planalto e do Senado. Os dois já se encontraram outras vezes desde o início do ano, mas a última conversa aconteceu há mais de um mês.
O petista também deve procurar mais as lideranças da Casa. Um dos objetivos é ajustar o caminho para a aprovação da Reforma Tributária e de nomes indicados à diretoria do Banco Central, em articulações das quais o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, participa.
Há outros embates no horizonte. Os senadores devem votar neste mês a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita decisões monocráticas e pedidos de vista no STF. O texto foi aprovado em 42 segundos na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e já está em discussão no plenário. Em seguida, a Casa quer avançar com o projeto que estabelece mandato para ministros da Corte.
No Executivo, há preocupação sobre o risco de essas pautas criarem atritos entre os Poderes, conturbando o cenário político e dificultando o andamento de temas que podem ter impacto positivo na imagem do governo.
Em outro flanco aberto, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) instaurada para investigar a atuação de ONGs na Amazônia colocou na mira a gestão da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Na terça-feira, o presidente do ICMBio, Mauro Oliveira Pires, foi ao colegiado e ouviu diversas críticas sobre o que os parlamentares consideram como “ações truculentas” do órgão na proteção de unidades de conservação do país. A CPI é dominada por opositores de Lula.
As dificuldades do Planalto no Senado se intensificaram no segundo semestre. Na semana passada, a rejeição ao nome de Igor Roque para a DPU, por 38 votos a 35, foi o recado de emparedamento mais claro ao governo. Parlamentares de oposição usaram o placar para reiterar que a eventual indicação do ministro Flávio Dino (Justiça) para o STF teria o mesmo destino, já que ele tem embates frequentes com bolsonaristas. Segundo a colunista Bela Megale, do jornal O Globo, ministros de Lula já não veem Dino na condição de favorito à vaga justamente em razão da articulação de senadores do Centrão e da direita contra a nomeação.
A criação do marco temporal para a demarcação de terras indígenas, tese já considerada inconstitucional pelo STF, foi outro revés, em um caso que deve ter novas repercussões. Lula vetou trechos do projeto, em decisão cuja tendência é a derrubada pelo Congresso, com endosso de senadores.
Os contratempos na relação com o Senado vieram após um início de ano em que a base apoiou a reeleição de Pacheco para a presidência da Casa. No curso do mandato, no entanto, o Planalto estreitou relações com a Câmara, movimento turbinado com a entrega do comando da Caixa Econômica para um nome indicado pelo Centrão, com o aval do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL).
Nos bastidores, senadores cobram espaço. Um dos objetivos é ampliar o domínio sobre as verbas do antigo orçamento secreto, hoje em poder dos ministérios, com indicação franqueada a parlamentares.