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sábado 16 de setembro de 2023 às 14:49h

Lula se movimenta na política externa para um polo que a maioria da população rejeita

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Dentre as amarras ideológicas que Lula cultivou de sua época de sindicalista, a que se manteve mais preservada segundo artigo de Bruno Soller, do Estadão, foi a sua visão sobre a diplomacia brasileira. Inegavelmente, o atual presidente é bastante ativo nas relações internacionais e, desde que retomou o poder, o petista já cumpriu mais de uma dezena de agendas no exterior, fazendo um contraponto ao ex-presidente Jair Bolsonaro, que era um crítico contumaz do chamado “globalismo”. A direção dos ventos escolhidas por Lula, no entanto, tem pouca aprovação da população brasileira, que para sua sorte não é tão influenciada por esses movimentos na hora do voto.

Em grupos qualitativos de eleitores que rejeitam Lula, uma das maiores reclamações que podem ser observadas é sobre o papel que o BNDES desempenhou nos governos petistas como garantidor de obras infra estruturais em países de doutrinação política socialista. As obras no porto de Mariel, em Cuba, e investimentos na Venezuela são os ápices das reclamações desses eleitores, que entendem que o Brasil precisaria primeiramente cuidar de sua própria situação antes de buscar ser um mecenas de outras nações. Somam-se a isso, denúncias de corrupção que corroboram com a visão de que há interesses escusos nesses auxílios brasileiros.

O fato é que Lula segue em marcha com a ideia da cooperação Sul-Sul e busca ser protagonista na construção de um novo polo de poder que pretende fazer frente no cenário global aos Estados Unidos da América. O fortalecimento dos Brics e o posicionamento dúbio em relação aos conflitos da Ucrânia, preservando a Rússia de maiores críticas, mostram um Brasil mais alinhado com esse novo eixo de poder que desafia a hegemonia norte-americana. Os movimentos russos de aproximação com a Coreia do Norte renderam preocupação em diversas nações do mundo, mas não parecem criar qualquer espanto na chancelaria brasileira.

Um dado interessante e que conflita com esse caminho diplomático é que o brasileiro é um admirador contumaz dos Estados Unidos da América. Em levantamento feito junto às empresas de turismo e companhias aéreas, dos cinco destinos mais buscados pelos brasileiros, quatro estão nos Estados Unidos – Orlando, Nova Iorque, Miami e Las Vegas. Além disso, uma grande pesquisa realizada pela consultoria Pew Research, que ouviu mais de 27 mil pessoas, mostra que os brasileiros confiam mais nos Estados Unidos, do que os próprios americanos.

Dois terços dos brasileiros têm uma imagem favorável sobre os Estados Unidos, 7% a mais do que a média global. Para 40%, os EUA são o país com melhor qualidade de vida do mundo. Os entrevistados, em sua maioria, também concordam que os Estados Unidos são o país mais democrático, seguro e estável de todo o planeta. As universidades americanas, o padrão de vida, os avanços tecnológicos e a produção de entretenimento estão entre os pontos que os brasileiros mais admiram.

O Brasil passou por fases diplomáticas de relacionamento com os americanos de dependência quase que absoluta. No governo Dutra, o Brasil adotou a política do alinhamento automático. Depois com os militares e o auge da Guerra Fria, o Brasil foi importante aliado dos EUA, no eixo azul do mundo. No pós-redemocratização, Fernando Henrique Cardoso e Bill Clinton fizeram uma tabelinha reconhecida e de grande proximidade. No entanto, apesar de relações respeitosas, com Lula no poder, o Brasil sempre buscou diversificar sua interação, aproveitando-se de uma boa cooperação bilateral, mas um certo afastamento no plano multilateral.

O recente episódio em que Lula disse não conhecer o Tribunal Internacional Penal, mesmo o Brasil sendo signatário, que pediu a prisão de Vladimir Putin por crimes de guerra na Ucrânia e que afirmou não haver hipótese do chefe de estado russo ser preso, caso viesse ao encontro do G20, que terá como sede a cidade do Rio de Janeiro, vai novamente na contramão do que a população brasileira pensa. Para 84% dos brasileiros, em estudo realizado pela IPSOS, o país deveria acolher refugiados ucranianos e 54% acreditam que o Brasil precisaria apoiar a Ucrânia contra a invasão russa.

A diversificação econômica das últimas décadas fez o Brasil diminuir sua dependência dos americanos. A própria substituição dos Estados Unidos pela China como o maior parceiro comercial tem um simbolismo importante nos rumos das relações entre os dois países. Mas, a herança cultural, a influência nos hábitos de consumo, seja de filmes, músicas, marcas e alimentação, ainda persiste no entendimento que o brasileiro tem sobre o sonho americano. O Brasil, que é um país formado por imigrantes, tem nos EUA o maior destino de emigração de seus habitantes.

A desconfiança do brasileiro com o seu maior parceiro de negócios do mundo, a China, mostra esse descolamento sobre os movimentos internacionais e a percepção do povo. Segundo o Pew Research, 48% do povo brasileiro tem imagem negativa sobre a China e 67% não confiam nas habilidades do líder chinês Xi Jinping em promover a paz no mundo. Além das questões sobre o coronavírus, que geraram desconfiança sobre as intenções chinesas em parte dos entrevistados, o apoio chinês à Rússia, na guerra da Ucrânia é um dos principais motivos da rejeição.

Subjugada a segundo plano na hora do voto, a discussão sobre as relações internacionais não causa tanta comoção no eleitor brasileiro. Apenas 1% dos entrevistados em pesquisa RealTime Big Data/RecordTV sobre os maiores problemas do país, apontam a diplomacia como um dos desafios a serem superados. Todavia, a constante movimentação política de Lula no cenário internacional acaba gerando maior interesse da população no tema e promovendo discussões sobre se os caminhos adotados são os corretos.

Com compromissos em Cuba, para o G77, o que gera por si só um ambiente negativo na opinião pública, Lula anunciou que tratará da repatriação do recurso enviado pelo BNDES para o porto de Mariel. Sabedor de que há grande rejeição do povo brasileiro ao episódio, o presidente tentará ao menos corrigir algumas rotas para que não vire sua política internacional um problema para seu projeto de poder. A agenda internacional brasileira não pode estar apegada a um novo capítulo de Guerra Fria, mas sim precisa de estratégia e objetivo para a defesa dos interesses nacionais e a promoção das pautas caras à nação.

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