Reformas ministeriais em governos comandados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) são marcadas por negociações longas e tendem a demorar, registra César Felício , do Valor. O comportamento de Lula indica resistência em ceder espaço para aliados na montagem de sua equipe. Levantamento feito pelo Valor sobre mudanças amplas em ministérios desde 1985 indica que as alterações nos dois mandatos anteriores do petista (2003-2010) estão entre as que mais demoraram a acontecer.
O levantamento mediu o tempo de governo transcorrido de cada presidente até a primeira mudança ministerial que tenha sido simultânea em pelo menos três pastas. Não são consideradas as alterações provocadas por desincompatibilização eleitoral. No caso de Lula, em sua passagem anterior pela Presidência, a primeira grande alteração ministerial foi em janeiro de 2004, depois de um ano de governo. Foram cinco trocas.
Lula abriu espaço de forma tímida ao MDB (à época PMDB) cedendo para o partido as pastas de Comunicações e Previdência Social. O MDB tinha ficado de fora da composição do ministério original, depois que Lula desautorizou o então presidente do PT José Dirceu a negociar a pasta de Minas e Energia com o então dirigente emedebista Michel Temer. O ministério terminou nas mãos de Dilma Roussef, sua sucessora.
O petista só faria uma reforma ministerial mais ampla no terceiro ano de seu mandato, depois da crise deflagrada pelo escândalo do mensalão. Em 2005, entre outras mudanças, ele deslocou Dilma para a Casa Civil, no lugar de Dirceu, e entregou finalmente a pasta ao MDB. Foi um momento em que o presidente buscou blindagem para sobreviver politicamente ao caso que atingiu as principais figuras de seu partido.
Depois de reeleito em 2006, Lula não anunciou um novo ministério. O então presidente só montaria a equipe ministerial do seu segundo governo quase três meses depois, no fim de março de 2007. Embora reeleito com relativa facilidade, Lula teve dificuldades de atrair figuras expressivas do setor privado para as pastas de Agricultura e Desenvolvimento, entregues respectivamente a Reinhold Stephanes e Miguel Jorge. No primeiro mandato, contou com Roberto Rodrigues e Luiz Fernando Furlan, lideranças de peso no agronegócio e na indústria. Ao longo do seu segundo mandato, Lula não fez reformas ministeriais.
Esse ano, a classe política espera uma reforma ministerial limitada. Lula deve negociar a entrada no governo de integrantes do PP, contemplando a ala do partido vinculada ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (AL), e o Republicanos, atendendo ao presidente da sigla, Marcos Pereira (SP). Já estão escolhidos como ministros, mas ainda sem pastas, os deputados André Fufuca (PP-MA) e Sílvio Costa Filho (Republicanos-PE). Para abrigá-los é possível que Lula faça um remanejamento entre ministros que afete outras pastas.
Cientistas políticos veem um duplo sentido na mexida. Um é o cálculo eleitoral. “Pela primeira vez entram na Esplanada partidos que apoiaram a reeleição do presidente Jair Bolsonaro. É uma manobra que isola a oposição”, comenta Rafael Cortez, da consultoria Tendências. Tanto o PP quanto o Republicanos compuseram a coligação que tentou reeleger o ex-presidente. O Republicanos foi a sigla escolhida por Bolsonaro para filiar seu ex-ministro Tarcísio Gomes de Freitas, eleito governador de São Paulo. O outro propósito é o de melhorar a governabilidade no Congresso. Mas o alcance desse movimento é limitado.
“A pauta do governo no segundo semestre é antipática ao setor privado”, opina Ricardo Ribeiro, da consultoria MCM, em uma referência à agenda do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, voltada para o aumento da arrecadação. Há propostas de taxar o setor de apostas, offshores, fundos exclusivos e lucros e dividendos, entre outros pontos. “E o Congresso tem sido avesso a aumento de impostos”, diz. Para Ribeiro, “a reforma ministerial é necessária para diminuir o risco de derrotas no Congresso, mas não é suficiente”. Para Cortez, o governo precisará ter o que ele chamou de “realismo político”.
Ele ponderou, entretanto, que a reforma irá corrigir uma deficiência da formação do governo: há uma sub-representação no ministério da centro-direita da Câmara. Apenas três são os ministros com mandato parlamentar de deputado filiado a partidos conservadores: André de Paula, da Pesca; Juscelino Filho, das Comunicações; e Celso Sabino, do Turismo. Já os ministros fora do espectro da esquerda e mais vinculados ao Senado são seis: Simone Tebet (Planejamento), Renan Filho (Transportes), Jader Filho (Cidades), Carlos Fávaro (Agricultura), Waldez Góes (Desenvolvimento Regional) e Alexandre Silveira (Minas e Energia).
Entre os últimos 11 presidentes, o tucano Fernando Henrique Cardoso mostrou-se ainda mais avesso que Lula em fazer mudanças no primeiro escalão. Em seu primeiro mandato, de 1995 a 1998, Fernando Henrique fez uma reforma ministerial apenas no 16º mês do governo, com quatro trocas. Na ocasião, de forma constrangida, como relata em suas memórias, tirou Dorothea Werneck da pasta da Indústria e Comércio para atender o PPB, antigo nome do PP, e nomear Francisco Dornelles.
O presidente que mais resistiu a mudar o Ministério foi Fernando Collor. Ele só fez uma reforma ampla em janeiro de 1992, quando seu desgaste era intenso por reveses na economia e escândalos na política. O então presidente desmontou a chamada “República de Alagoas” para entregar a equipe de governo para a classe política, sobretudo o PFL. O movimento não impediu o seu impeachment oito meses depois.