Simone Tebet (MDB) subiu no palanque de Lula, mas não quer vestir vermelho. Além de defender uma mudança na paleta de cores da campanha, sustenta que o PT precisa se empenhar mais para conquistar eleitores de centro. A senadora se diz preocupada com o tom da disputa no segundo turno. Reclama das fake news e da aposta de Jair Bolsonaro (PL) na retórica de guerra santa. Nesta segunda, ela participará do primeiro ato público com Lula: um encontro com religiosos em São Paulo.
Leia os principais trechos da entrevista à coluna de Bernardo Mello Franco, do O Globo:
Como avalia a disputa neste segundo turno?
Lamentavelmente, aconteceu o que já esperávamos. O tom subiu muito, e a campanha foi para um campo extremamente perigoso para a democracia brasileira. O clima de guerra santa me preocupa muito. Não só por esta eleição, mas pelas que estão por vir.
Precisamos enterrar o modo bolsonarista de fazer política. Sabemos da rejeição à esquerda, ao PT e ao próprio Lula. Neste ambiente, as mentiras e fake news colam mais facilmente.
Há uma divisão na campanha de Lula sobre como reagir aos ataques. Qual é sua opinião?
Combater fake news é necessário, mas não podemos reagir na mesma moeda. Isso faria da política um território de barbárie. Precisamos combater a mentira com a verdade. Como não estou acompanhando a guerra digital, não posso avaliar as reações coordenadas pelo André Janones. Mas ainda acredito na boa política, em defender o que é certo.
Qual será seu papel na campanha de Lula?
Quero usar o pouco capital político que tenho para dar segurança ao eleitor que tem certa aversão à esquerda. Pretendo mostrar que Lula fará um governo diferente, de conciliação. Vamos viver um tempo de reconstrução e de reunificação do Brasil. O presidente Lula tem consciência disso.
Pretende aparecer mais ao lado dele até o dia 30?
Não faço nada pela metade. Estou pronta para tudo o que eles acharem importante. Nesta semana vamos começar a viajar. Posso ir a todos os estados onde não tivermos divergências regionais.
Uma exceção é Pernambuco, onde estamos em campos diferentes (Lula apoia Marília Arraes, do Solidariedade, e Tebet apoia Raquel Lyra, do PSDB). Lá, acho que houve um equívoco do ex-presidente. Ele poderia ter dito: “Na minha terra há duas mulheres valorosas, e o estado estará bem servido com qualquer uma delas”.
O ex-presidenciável João Amoêdo declarou apoio a Lula e foi atacado por parte de seus antigos eleitores. Isso também aconteceu com a senhora?
Sim. Fiz uma campanha tranquila, mas essa tranquilidade desmoronou em dois dias após o primeiro turno. Foram as 48 horas mais difíceis da minha vida política.
Muitos aliados me imploraram pela neutralidade, dizendo que eu perderia capital político se apoiasse Lula. Mas eu sabia que tinha que tomar uma decisão. Deixei claro que o que está em jogo é muito maior do que cada um de nós.
Meu estado (Mato Grosso do Sul) é extremamente conservador e bolsonarista, mas isso não me abala nem um pouco. Tenho convicção do meu papel. Sou de uma geração eu lutou pela redemocratização do país. Apoiar Lula contra Bolsonaro não é um ato de coragem, é um dever cívico.
A senhora já aconselhou a campanha do PT a abandonar o vermelho. O que mais precisa mudar?
A campanha não pode pregar para convertidos. Tem que dialogar com a parte mais conservadora do Brasil, que recebe fake news todo dia pelo celular.
Muitos eleitores nem conseguem vislumbrar o que está em jogo: a democracia, os valores da Constituição de 1988. Precisamos conversar com essas pessoas. Elas não vão migrar para Lula por fidelidade ou por crença no PT.
Precisamos mostrar que o ex-presidente está pronto para governar para todo o Brasil, dialogando com quem pensa diferente. Por isso defendi o uso do branco, que é a cor da paz e da união.
Também defendo um aceno para os liberais na área econômica. Sei que a equipe de Lula não quer manter o teto de gastos, mas é preciso apresentar alguma âncora fiscal. Parece que eles já estão buscando uma alternativa para dar alguma tranquilidade ao mercado.
Lula já indicou que pretende tê-la a seu lado num eventual governo. Se ele vencer, em que área gostaria de atuar?
Posso contribuir na área de educação, no agronegócio… Estou pronta para ajudar em qualquer canto, mas não preciso de cargo nem de ministério para isso. Quando for necessário, vou apresentar minhas críticas construtivas.
Como projeta seu futuro político? Está nos planos mudar o domicílio eleitoral para São Paulo?
Não imaginava que minha mensagem fosse tocar tantos corações, especialmente das mulheres. Isso me trouxe uma grande responsabilidade com o eleitor de centro, que está cansado da polarização.
Ainda estou tentando assimilar meu papel. Quais são meu tamanho e minha importância neste processo? Ainda não sei. Não estou preocupada com domicílio eleitoral nem com 2026. Estou preocupada com a guerra santa que está entrando na política brasileira. Isso pode não ter volta.
Teme que Bolsonaro tente algum tipo de ruptura institucional se for derrotado nas urnas?
Bolsonaro nunca teve condições de não passar a faixa se perder a eleição. No entanto, ele já conseguiu colocar dúvidas na cabeça de muita gente sobre a imparcialidade do Judiciário, da imprensa, do sistema eleitoral.
Isso pode criar um ambiente de instabilidade para os próximos quatro anos. Precisaremos desconstruir, passo a passo, tudo de ruim que ele construiu.