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domingo 27 de março de 2022 às 06:09h

Lula faz ataques seletivos a Petrobras e Congresso e ignora escândalos sob PT

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Temas priorizados pelo ex-presidente Lula (PT) em declarações públicas na pré-campanha, a gestão da Petrobras e a relação com o Congresso também serão vidraças eleitorais para o pré-candidato na eleição deste ano.

Em discursos e entrevistas nas últimas semanas, o ex-presidente tem feito distorções acerca do histórico de seu governo em relação ao tema dos combustíveis. Também mirou o Legislativo ao pedir em eventos com a militância mais esforço para eleger aliados.

A Petrobras e a negociação com o Congresso estão na gênese das duas principais crises vividas nos mandatos petistas na Presidência: a revelação do mensalão, em 2005, e as descobertas da Lava Jato, já no governo Dilma Rousseff, a partir de 2014.

No último dia 19, no interior do Paraná, Lula afirmou que a atual legislatura representa “talvez o pior Congresso da história do país” e que é preciso mudar “a qualidade dos deputados e senadores”, declaração que motivou resposta do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

O petista afirmou também que o governo Jair Bolsonaro (PL) concebeu um orçamento secreto que “serve para comprar voto de deputado para fazer desgraceira”.

O ex-presidente se referia ao pagamento das chamadas emendas de relator do Orçamento, incluídas pelo Congresso a partir de 2020 e hoje principal moeda de troca do governo com o Legislativo. Na prática, a destinação dessas verbas, que chegaram a R$ 16,8 bilhões no ano passado, é decidida sem transparência pela cúpula da Câmara e do Senado, sem especificação do parlamentar que a indicou.

Na terça-feira (22), Lula voltou ao tema, de maneira mais amena, em entrevista para uma rádio de Santa Catarina. Disse, sobre o centrão, que qualquer presidente, eleito democraticamente, “tem que conversar com essas pessoas, independentemente de gostar ou não”.

Mas afirmou que “não dá para ver o Congresso funcionando da forma como está hoje”, com mais poder em detrimento do papel do presidente da República.

​O pagamento de emendas parlamentares é um antigo foco de fisiologismo e cooptação na relação entre o Executivo federal e o Legislativo.

Em escala menor, no governo Lula, em 2007, a Folha noticiou o pagamento na semana de votação na Câmara da prorrogação da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) de 10% de tudo o que havia destinado para emendas naquele ano. O valor somava só naqueles cinco dias R$ 159 milhões, em valores não atualizados.

O atual bloco de apoio de Bolsonaro, criticado pelo PT, também contém ex-integrantes da base aliada de Lula, incluindo o PL, hoje sigla do presidente, mas que foi longeva aliada dos governos petistas.

Eleito por coligação minoritária no Congresso, em 2002, Lula teve que abrir as portas do governo e de ministérios a legendas distantes de seu campo político, como PTB e PP.

Foi no âmbito dessa negociação que surgiu o esquema apelidado de mensalão, a compra de apoio parlamentar no Congresso que motivou denúncia julgada no STF (Supremo Tribunal Federal) em 2012.

A mais alta corte do país condenou 25 pessoas, incluindo políticos petistas, por integrar esquema destinado a garantir sustentação do governo no Legislativo.

A divisão de espaço entre aliados no governo do PT também está no cerne da outra grande foco de controvérsia relacionada ao partido: o loteamento de diretorias da Petrobras entre partidos, origem do esquema de desvios na estatal alvo da Lava Jato.

A tese das autoridades da operação, repetida em documentos judiciais até hoje, inclusive do Supremo, é a de que existia um cartel de construtoras na Petrobras no qual havia o pagamento de propina, sendo parte destinada aos partidos aos quais os então diretores eram ligados –PT, PP e MDB.

O diretor de Abastecimento nos governos Lula e Dilma, Paulo Roberto Costa, foi o primeiro delator da Lava Jato.

Na esteira de críticas à alta da gasolina sob Bolsonaro, Lula tem trazido a estatal a seus discursos de pré-campanha, comparado iniciativas do atual presidente com as tomadas por seu governo no setor de combustíveis, como a construção de refinarias e a política de preços da época.

“Foi um momento de ouro. Porque a Petrobras não era tratada como uma empresa de petróleo. Ela é uma empresa de petróleo, de óleo, de gás, mas também é uma empresa que investe no desenvolvimento do país”, afirmou o petista em entrevista a uma rádio da Paraíba no último dia 15.

Os projetos da estatal naquela época começaram a sofrer questionamentos ainda antes da Lava Jato, por exemplo, quando o TCU (Tribunal de Contas da União) recomendou em 2011 o bloqueio de verbas à construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, uma das mais mencionadas posteriormente na Lava Jato.

Em 2021, a corte de contas afirmou em relatório que o custo de construção do complexo pulou dos US$ 2,4 bilhões estimados inicialmente para US$ 20,1 bilhões e que o empreendimento era “economicamente inviável”.

O ex-presidente tem dito que a elite brasileira está tentando vender a ideia de que a empresa não é produtiva nem rentável apenas como estratégia para preparar sua privatização.

Em viagem ao México, neste mês, o ex-presidente afirmou que a descoberta do pré-sal, em seu governo, esteve por trás do impeachment de Dilma, em 2016, e da cassação de sua candidatura à Presidência em 2018.

“Querem entregar o nosso petróleo para as empresas que sempre mandaram no petróleo no mundo”, disse ele, na ocasião.

Cálculo político

O cientista político Marco Antonio Teixeira, que é professor da escola de administração da FGV (Fundação Getulio Vargas), vê a ênfase de Lula na questão da Petrobras menos como uma vacina diante de eventuais críticas acerca do histórico do PT na estatal e mais como um cálculo político em um assunto de enorme impacto no eleitorado, a inflação.

“É o maior fator de desgaste do governo Bolsonaro e que pode de alguma maneira, pela memória retrospectiva do período dele [Lula], trazer algum tipo de vantagem”, diz.

Também afirma que o ex-presidente tem como trunfo nessa seara o fim dos processos em que era réu no âmbito da Lava Jato e que os escândalos de corrupção já foram “exaustivamente explorados em eleições anteriores”, podendo até ser ofuscados por casos mais recentes, como a crise que eclodiu no Ministério da Educação nos últimos dias.

O cientista político também vê o atual momento eleitoral como de muita instabilidade, inclusive no tom dos discursos, que só ficarão mais claros com a definição das alianças dos partidos.

Em relação às críticas do petista ao atual Congresso, Marco Antônio Teixeira considera uma tentativa equivocada de explorar a baixa popularidade do Legislativo hoje.

“Dificilmente vamos ter um Congresso tão diferente deste. Dificilmente vamos ter um governo que não vai depender do ​centrão.”

Declaração de Lula sobre Petrobras na pré-campanha

  • Tem criticado o abandono de projetos da estatal concebidos ainda em seu governo, como a construção de mais refinarias no Nordeste. “Se tivesse continuado as refinarias, elas poderiam estar prontas, poderiam estar inauguradas, e o Brasil poderia não estar hoje importando gasolina”, disse, na semana passada.

    O contexto: As obras no Ceará e no Maranhão foram abandonadas na etapa de terraplenagem, em 2015, ainda no governo Dilma Rousseff

  • Vem prometendo descolar os preços dos combustíveis da cotação internacional. “Se nós ganharmos as eleições, vamos abrasileirar os preços.”

    O contexto: O Brasil importa uma parcela dos derivados que consome. Com o preço abaixo dos cotados no exterior, pode haver o risco de falta de combustíveis nos postos.

  • Diz que a Petrobras viveu um “momento de ouro”, com megacapitalização na Bolsa em seu governo.

    O contexto: O ex-presidente deixa de abordar a existência de um esquema de empreiteiras de pagamento de propina a diretores da estatal na época, conforme já foi dito inclusive em julgamentos no Supremo Tribunal Federal.

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