O agravamento da situação de minas de sal-gema da Braskem em Maceió, sob risco de colapso iminente, reacende um conflito entre dois grupos políticos adversários em Alagoas: o do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o do senador Renan Calheiros (MDB-AL), pai do atual ministro dos Transportes Renan Filho. Lira, Renan e seus respectivos aliados trocaram acusações nos últimos meses conforme Bernardo Mello, do O Globo, envolvendo desdobramentos da atuação da Braskem e da indenização bilionária cobrada à empresa, que também é alvo de disputa entre prefeitura e governo estadual.
Em julho, após a Braskem e o prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (PL), anunciarem um acordo para a prefeitura ser indenizada em R$ 1,7 bilhão pela empresa, o governador de Alagoas, Paulo Dantas (MDB), acionou o Tribunal de Contas da União (TCU) pedindo a suspensão do trâmite. Dantas, aliado do senador Renan Calheiros, argumentou que o acordo era “excludente”, por deixar de fora o governo estadual.
Em paralelo, Renan pediu ao TCU a suspensão de quaisquer tratativas para venda da Braskem, sob o argumento de que havia necessidade de mensurar novamente o passivo total da empresa, incluindo multas e indenizações. Embora a acionista majoritária da Braskem seja a Novonor, ex-Odebrecht, o governo federal tem participação relevante na empresa através da Petrobras, dona da segunda maior fatia e detentora de prioridade para adquirir seu controle acionário.
Lira, por sua vez, aliado de Caldas, elogiou o acordo e classificou a indenização como “um feito da gestão” do atual prefeito. O presidente da Câmara avaliou à época, em entrevista à imprensa local, que “a reparação financeira chegará e será responsável por obras em Maceió, em benefício da população”.
O valor da indenização, dividida em cinco parcelas, ultrapassa todo o orçamento anual de Maceió e representa uma injeção de recursos para a administração de Caldas, candidato à reeleição em 2024. O MDB de Renan já anunciou que lançará uma candidatura de oposição.
Com a verba, Caldas anunciou em setembro que a prefeitura fechou a compra de um hospital privado em Maceió, por R$ 266 milhões. O movimento foi usado por Renan e seu entorno para fustigar o prefeito. Aliados questionaram a legalidade da operação, feita sem licitação, e alegaram que o número de leitos anunciados pela prefeitura é superior ao existente. O ministro Renan Filho, na ocasião, levantou suspeita de uso ilícito dos recursos da Braskem.
“Essa aquisição precisa ser fiscalizada pelos órgãos de controle, pois cheira a desvio de recursos da milionária indenização do caso Braskem”, escreveu o ministro em uma rede social.
O governo de Alagoas acionou a Justiça estadual para obrigar a Braskem a indenizá-lo, e obteve no início do ano um bloqueio de R$ 1 bilhão nas contas da empresa. O dinheiro foi destravado em outubro, mediante apresentação por parte da empresa de garantias de que tinha este montante reservado para eventuais pagamentos. O valor total da indenização ao estado, porém, ainda está sendo calculado.
Em outro movimento recente, Renan protocolou no Senado um pedido de abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar a extensão dos impactos e as responsabilidades da Braskem no afundamento do solo em Maceió. Adversário da família Calheiros, o senador Rodrigo Cunha (Podemos-AL), que disputou o governo de Alagoas no ano passado com apoio de Lira, apresentou uma questão de ordem alegando suspeição de Renan para participar da comissão.
Cunha lembrou que, na década de 1990, Renan presidiu a Salgema, empresa que atuava originalmente na extração mineral em Maceió e que deu origem à Braskem em 2002. O senador alegou que haveria uma “confusão entre investigado e investigador” com a participação de Renan na comissão. A questão de ordem foi indeferida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
Adversários de Renan também costumam associar o senador à empresa devido a um inquérito, instaurado pela Lava-Jato, que investigou suposto pagamento de propina pela Odebrecht em troca de benefícios à Braskem no Senado. Renan foi indiciado em 2021 pela Polícia Federal, mas o inquérito foi arquivado no fim do ano passado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por avaliar que a obtenção de provas foi “insuficiente”.