Líderes da Câmara consideram excessiva a decisão do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou a investigação sobre a tentativa de liberação de emendas de comissão. Nesta segunda-feira, o ministro ordenou a suspensão dos pagamentos e a abertura de um inquérito pela Polícia Federal para apurar o caso.
O foco da investigação é um ofício assinado por líderes da Câmara solicitando ao governo a liberação de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão. A medida foi interpretada como uma tentativa do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), de contornar as regras de transparência exigidas para a execução desses recursos.
Parlamentares afirmam que o documento teve anuência do Palácio do Planalto, incluindo a assinatura do líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), e do deputado Odair Cunha (PT-MG). Além disso, o parecer da Secretaria de Assuntos Jurídicos da Casa Civil teria respaldado a solicitação.
Os deputados também criticam o momento da decisão, tomada após a aprovação do pacote fiscal no Congresso e às vésperas do recesso de fim de ano, o que gerou descontentamento em meio ao clima político.
Na decisão desta segunda-feira (23), Dino manda suspender novamente o pagamento de emendas parlamentares e determina uma série de medidas a mais relacionados à execução dos recursos. O motivo, segundo ele, é que as indicações não atenderam a critérios estabelecidos previamente em acordo costurado entre a Corte, o Congresso e o Executivo.
Além de bloquear o pagamento de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão, ele condicionou a liberação dos valores relativos a 2025 ao cumprimento de critérios estabelecidos previamente. O ministro ainda mandou que a Polícia Federal apure se houve irregularidades em uma manobra feita pela Câmara para executar os recursos.
No último dia 12, um ofício enviado pela Câmara ao governo mudou a destinação de parte das emendas de comissões previstas para serem liberadas nesta reta final do ano. O documento leva a assinatura de 17 líderes de partidos e pede a execução de R$ 4,2 bilhões que já estavam previstos no Orçamento de 2024, mas estavam bloqueados desde uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de agosto.
Deste valor, porém, R$ 180 milhões são referentes a “novas indicações”, sendo que 40% (R$ 73 milhões) são direcionados ao Estado de Alagoas, reduto eleitoral do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). De acordo com três dos líderes ouvidos pela reportagem, a assinatura do documento se deu após pedido do deputado alagoano.
O documento com a assinatura dos líderes foi enviado pela Câmara no mesmo dia em que Lira determinou a suspensão de reuniões das comissões da Casa com o argumento de dar celeridade às tramitações das pautas econômicas no plenário. Assim, segundo presidentes dos colegiados, as novas indicações não passaram pelo referendo dos grupos.
Um dos 17 signatários afirmou reservadamente que falta diálogo entre Lira e Dino para resolver essa questão das emendas de forma definitiva. Outro líder ressaltou o fato de que Dino só deu decisão após o governo conseguir aprovar o pacote econômico no Congresso.
O líder do PL na Câmara, Altineu Côrtes (PL-RJ), diz que é necessária a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição para transformar as emendas de comissão em emendas parlamentares individuais, com execução obrigatória pelo governo federal.
—Precisamos individualizar as emendas com igualdade aos deputados. A PEC garantiria individualidade, rastreabilidade e transparência na execução dos recursos, além de impedir decisões dessa natureza— disse Altineu.
Os parlamentares encerraram o ano sem votar a Lei Orçamentária, o que fará o Executivo iniciar o ano com apenas uma parte do dinheiro. Mesmo assim, se não houvesse a nova decisão de Dino, seria possível o governo pagar emendas de custeio para Saúde, as chamadas fundo a fundo.
Sobre as emendas do ofício, líderes afirmam que o pagamento ainda não havia iniciado, mas que o governo já havia aberto o sistema para dar início à essa execução.
Dino citou na decisão desta segunda declarações de parlamentares, como Cleitinho Azevedo (Republicanos-MG), que denunciou a presença de lobistas e irregularidades no processo de distribuição das emendas.
Também pediu à PF que colha depoimentos dos deputados José Rocha (União Brasil), Adriana Ventura (Novo-SP) e Glauber Braga (PSOL-RJ), que apontaram manobra de Lira na tentativa de liberar emendas de comissão sem o aval dos colegiados.
— Se o presidente da Casa tivesse permitido que as comissões pudessem ter enviado para os respectivos ministérios, as atas, nominando os autores das emendas e os beneficiários, isso não teria ocorrido, tenho certeza disso. Portanto, mais uma derrota do presidente Arthur Lira — disse o deputado federal pela Bahia, José Rocha (União Brasil).