O líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, prometeu neste sábado (28) retaliar o assassinato do principal cientista nuclear do país, Mohsen Fakhrizadeh, em um atentado a tiros nesta última sexta-feira. O presidente iraniano, Hassan Rouhani, atribuiu a morte de Fakhrizadeh a Israel, como já havia feito na véspera o chanceler Javad Zarif.
Khamenei pediu pelo Twitter que a nação dê continuidade ao “esforço científico e técnico deste mártir em todos os âmbitos em que estava trabalhando”. O aiatolá disse, ainda conforme o jornal O Globo, que autoridades iranianas devem assumir a tarefa de “investigar este crime e castigar seus autores e aqueles que deram a ordem”.
No passado, Mohsen Fakhrizadeh foi apontado pelo Ocidente como tendo sido um dos principais arquitetos do suposto programa secreto de armas nucleares do Irã. O país persa, no entanto, nunca chegou a construir a bomba atômica, e mantém-se dentro do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), o que implica inspeções internacionais em suas instalações atômicas. Em 2015, a República Islâmica submeteu-se a inspeções ainda mais estritas ao assinar um acordo nuclear com as principais potências internacionais.
O atentado aumenta a tensão no Oriente Médio nas últimas semanas do mandato do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que deixará a Casa Branca em janeiro. O episódio também pode complicar os esforços do presidente eleito dos EUA, Joe Biden, de retomar o diálogo com Teerã para que Washington volte ao pacto nuclear de 2015, do qual Trump retirou seu país.
Rouhani acusou explicitamente Israel de querer semear o “caos” com o assassinato do cientista nuclear, um crime que, segundo as autoridades de Teerã, deve ser “castigado”.
“Mais uma vez, as impiedosas mãos da arrogância global, com o usurpador regime sionista como mercenário, foram manchadas com o sangue de um filho desta nação”, afirmou Rohani em um comunicado oficial.
As autoridades iranianas utilizam a expressão “arrogância global” em referência aos Estados Unidos. Vários cientistas especializados no programa nuclear iraniano foram assassinados nos últimos anos. Segundo o livro “Espiões contra o Armagedom: por dentro das guerras secretas de Israel”, dos jornalistas israelenses Dan Raviv and Yossi Melman, pelo menos quatro dessas mortes foram executadas pelo Mossad, o serviço secreto do país.
A emissora israelense N12 informou que as embaixadas do país foram postas em alerta máximo depois que o governo de Teerã ameaçou retaliar o assassinato. Um porta-voz do Ministério de Relações Exteriores de Israel afirmou que não comentaria a situação de segurança das instalações diplomáticas estrangeiras do país.
Fakhrizadeh, 59 anos, diretor do Departamento de Pesquisa e Inovação do ministério da Defesa, foi gravemente ferido quando seu carro foi atacado por vários indivíduos, que trocaram tiros com sua equipe de segurança, e faleceu poucos minutos depois.
— A nação iraniana é muito inteligente para cair na armadilha da conspiração dos sionistas. Estão pensando em criar o caos, mas deveriam saber que conhecemos suas intenções e não terão êxito — disse Rouhani, minutos depois da publicação do comunicado, em um discurso exibido na televisão.
Rouhani se comprometeu a impedir que a morte de Fakhrizadeh prejudique os avanços científicos do país e disse que o assassinato do especialista foi motivado pela “incapacidade” dos inimigos do Irã de impedir seu desenvolvimento.
— Os inimigos do Irã deveriam saber que a coragem do povo e das autoridades iranianas é tamanha que este ato criminoso não ficará sem consequências — disse Rohani, em uma reunião semanal dedicada à luta contra a pandemia do coronavírus.
O cientista assassinado havia sido apontado pelo primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, como o pai do programa iraniano que teria como objetivo produzir a bomba nuclear, intenção que o Irã sempre negou.
— Este assassinato bárbaro mostra que nossos inimigos vivem semanas difíceis nas quais sentem que sua pressão diminui, que a situação mundial muda — afirmou Rouhani. — Os inimigos do Irã querem aproveitar ao máximo estas semanas para criar uma situação incerta na região.
Na sexta, em carta ao secretário-geral, António Guterres, e ao Conselho de Segurança, o embaixador iraniano na ONU, Majid Ravanchi, já havia advertido contra “medidas aventureiras de Israel e dos EUA” contra o Irã, “sobretudo no período que resta do atual governo” americano.
Alemanha pede moderação
A Alemanha, signatária do acordo nuclear de 2015, pediu que “todos os lados” demonstrem moderação para evitar que o assassinato do cientista leve a uma escalada de tensões. O país europeu teme que o episódio prejudique as negociações em torno do programa nuclear iraniano.
“Poucas semanas antes de um novo governo dos EUA assumir o comando, é importante preservar o diálogo com o Irã para que a disputa em torno do programa nuclear iraniano seja resolvida por meio de negociações. Portanto, nós pedimos que todas as partes se abstenham de qualquer retaliação que possa levar a uma escalada da situação”, afirmou um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores alemão em comunicado.
O movimento libanês pró-Irã Hezbollah criticou o assassinato do cientista, cometido nas palavras do grupo “por grupos criminosos e terroristas para impedir que a República Islâmica (…) preserve seus progressos científicos e sua independência política e intelectual”.
Na sexta-feira, o ministro da Defesa do Irã, Amir Hatami, afirmou que o cientista assassinado teve um “importante papel nas inovações de defesa”.
— Administrava a defesa nuclear e fazia um grande trabalho — completou, sem apresentar mais explicações.
Mohamad Javad Zarif, o ministro das Relações Exteriores da República Islâmica, pediu à comunidade internacional o “fim das vergonhosas posições ambivalentes e a condenação do ato terrorista”.