O mercado de concessões de rodovias terá um teste importante em abril, quando deverão ser realizados dois leilões relevantes, com obras estimadas em R$ 9 bilhões. No dia 11, está prevista a licitação federal da BR-040, entre Belo Horizonte e Juiz de Fora (MG) e, no dia 16, o governo de São Paulo planeja leiloar a PPP (Parceria Público-Privada) do Lote Litoral Paulista, conforme reportagem de Taís Hirata, do jornal Valor.
O setor de rodovias enfrenta dúvidas sobre o interesse de investidores pelos novos projetos em estruturação. O mercado encerrou 2023 em alerta, após o cancelamento do leilão da BR-381 em Minas Gerais, em novembro, pela falta de propostas. Porém, a avaliação de analistas é que aquele era um projeto especialmente desafiador e problemático, e que o cenário não deverá se repetir nos leilões de abril. A previsão é que as duas licitações atraiam ofertas, mas há incerteza sobre o nível da concorrência.
“O mercado está difícil, mas a BR-381 é um ponto fora da curva. O trecho sul da BR-040 é atrativo, mais de nove empresas fizeram visitas. É um ativo com retorno interessante, volume de tráfego bom”, afirma Marcos Ganut, sócio-diretor da Alvarez & Marsal.
Ele também aponta desafios no projeto, pelo perfil da rodovia, com fluxo alto de caminhões, o que demanda gastos de manutenção elevados. “Mas o balanço entre obra, custos operacionais e risco de tráfego é positivo.”
A concessão da BR-040 vai da capital mineira a Juiz de Fora e prevê R$ 5 bilhões em obras, além de custos operacionais estimados em R$ 3,53 bilhões, nos 30 anos de contrato. Na disputa, vencerá quem oferecer o maior desconto sobre a tarifa de pedágio.
Entre os potenciais interessados no leilão, são citadas companhias como CCR, Pátria, EPR (Equipav e Perfin), EcoRodovias, além de empresas de construção.
Concessão devolvida
O leilão também é emblemático porque traz uma solução parcial ao imbróglio da relicitação da Via040, concessão da Invepar que deu errado e está sendo devolvida ao governo, para que seja entregue a um novo operador.
A Invepar tenta devolver a concessão desde 2017, mas só em 2020 conseguiu firmar o contrato de relicitação. Naquele momento, a expectativa era que o novo leilão fosse feito até 2022, mas houve uma série de atrasos, até que, em 2023, a Justiça teve que garantir que a Invepar seguiria operando a via até a relicitação. O leilão, porém, não resolve totalmente o problema: ainda faltará relicitar outro trecho da Via040, de Belo Horizonte a Goiás.
Apesar de o projeto estar ligado à relicitação, a avaliação é que isso não traz risco jurídico ao leilão porque os processos foram desvinculados pelo desenho do edital, aponta Lucas Sant’anna, sócio do Machado Meyer.
PPP do Litoral Paulista
O segundo leilão de abril, da PPP do Lote Litoral Paulista, também passou por idas e vindas nos últimos anos, mas a expectativa é que, agora, será bem-sucedido. “São trechos que a iniciativa privada já conhece e estuda há muito tempo. Deve haver interessados”, avalia Sant’anna.
Na PPP, que prevê R$ 4,3 bilhões em obras, parte dos recursos virão do Estado, que pagará anualmente uma contraprestação à concessionária de, no máximo, R$ 199 milhões por ano. No leilão, vencerá quem oferecer o maior desconto sobre esse montante. Existe ainda a possibilidade de interessados oferecerem deságio de 100%, zerando a contraprestação. Neste caso, a disputa passa a ser pela maior outorga.
O projeto do Litoral Paulista foi iniciado pelo governo paulista na gestão passada, que não conseguiu tirar o leilão do papel devido à resistência da prefeitura de Mogi das Cruzes, pela qual passa o trecho licitado. A solução dada pela nova equipe foi transformar o contrato em uma PPP, o que permitiu uma tarifa de pedágio menor e reduziu as críticas.
Um dos grupos que analisa a licitação é EcoRodovias. A empresa tem especial interesse no projeto porque já opera o sistema Anchieta-Imigrantes, que liga a capital ao litoral paulista e cuja demanda concorre em parte com rodovias do novo lote. A avaliação no mercado é que a companhia pode querer garantir a hegemonia no trajeto. Outras companhias como CCR, EPR e Starboard (que estreou no setor em 2023, com a vitória no leilão do Rodoanel Norte) também são apontadas como possíveis concorrentes.
Procurada, a EcoRodovias diz que acompanha “com interesse os programas de concessões anunciados pelos governos federais e estaduais para avaliar oportunidades”. A CCR afirma que “analisa todas as oportunidades nas três plataformas em que atua, com seletividade”. A EPR diz que “tem como disciplina avaliar as oportunidades do setor”. A Starboard e o Pátria não comentam.
Cenário difícil
Apesar da expectativa de sucesso nos leilões em abril, entre analistas a perspectiva é que o cenário para os leilões de rodovias em 2024 será difícil, devido ao volume elevado de novas concessões em estruturação pelos governos.
“Pode haver um excesso de lotes no calendário de licitações. Por um lado, há uma multiplicidade de perfis de projetos, o que pode atrair entrantes. Mas há preocupação de que os grupos do setor não consigam dar conta de tantas licitações. Os leilões de abril serão um bom termômetro”, avalia Rodrigo Campos, sócio do Vernalha Pereira Advogados.
Na visão de Ganut, hoje, o cenário para a atração de novos investidores a concessões de rodovias não é otimista. “Está difícil. Ainda que os fundamentos econômicos do país estejam bem, a atratividade para o investidor é limitada. Um problema é o retorno dos projetos em dólar. Além disso, nos últimos anos vivemos mudanças de regras, isso ainda traz incerteza”, afirma.