sexta-feira 22 de novembro de 2024
Foto: EBC
Home / NOTÍCIAS / Lei da alienação faz dez anos e pode ser alterada no Congresso
domingo 15 de março de 2020 às 09:57h

Lei da alienação faz dez anos e pode ser alterada no Congresso

NOTÍCIAS


A lei da alienação parental completa uma década neste ano em meio a embates entre críticos e defensores da medida e movimentações no Congresso para alterá-la ou revogá-la.

A alienação é definida na legislação como interferência na formação psicológica da criança ou adolescente por um dos pais ou outro responsável contra um dos genitores.

Dificultar o contato com o filho, omitir informações, mudar para um local distante para dificultar a convivência e apresentar falsa denúncia contra o pai são alguns exemplos de atos de alienação. As penalidades vão de advertência ao compartilhamento da guarda ou a sua inversão.

A lei foi criada com a promessa de garantir a boa convivência entre pais e filhos e, segundo algumas entidades, cumpre esse papel. Mas críticos afirmam que foi aprovada sem a devida discussão, que parte de conceito controverso e que consequências da medida foram desde a estigmatização de mulheres até a facilitação do abuso sexual.

Mulheres que perderam a guarda dos filhos em decorrência da lei de alienação parental criaram um coletivo em 2016, intitulado Mães na Luta, para trocar informações.

Segundo a arquiteta que coordena o grupo, moradora de São Paulo, que não quis se identificar, a maioria das mais de 200 mulheres que compõem o coletivo perderam a guarda dos filhos por denunciar abuso sexual e não conseguir comprovar –as queixas foram consideradas falsas.

Essa questão está no centro da polêmica em torno da lei da alienação. “A Justiça é machista e preconceituosa. Vivemos uma caça às bruxas”, diz ela, que perdeu a guarda do filho há cinco anos após denunciar abuso que seria cometido pelo pai. O coletivo se articula para tentar revogar a lei.

“A lógica da lei é de acirrar as disputas entre o casal que está em processo de divórcio ou de discussão de guarda, em vez de oferecer instrumentos que ajudem famílias a solucionar problemas”, diz a psicóloga Iolete Ribeiro, presidente do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente).

Para ela, a norma não é necessária porque já existem instrumentos legais para lidar com a separação, como a lei da guarda compartilhada, aprovada em 2014.

A advogada Myllena Calazans, colaboradora do Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher, diz que a lei leva a estigmatização das mulheres ao tachá-las de alienadoras e prejudica a convivência das crianças com os genitores. Segundo ela, o Brasil foi o primeiro país a aprovar uma lei do tipo.

O Conselho Federal de Psicologia se opõe à medida, por avaliar que a teoria da alienação parental, criada pelo psiquiatra americano Richard Gardner (1931-2003), carece de sustentação científica. Ele defendia que um genitor pode, por vingança, desconstruir a imagem do outro para a criança, inclusive criando falsas memórias de abuso sexual.

“A lei produz prejuízos para partes, principalmente para crianças e adolescentes, que muitas vezes são afastados dos pais e mães sem necessidade”, diz a conselheira do CFP Marina de Pol Poniwas.

A lei prevê que, quando houver indícios de alienação, o juiz pode determinar perícia psicológica ou biopsicossocial. A avaliação envolve entrevistas, exame de documentos, histórico do relacionamento e cronologia de incidentes.

“Atos objetivos são fáceis de identificar. Mas não são suficientes para tornar a criança alienada”, diz Lorena Braga, presidente da Comissão Especial de Direito de Família e Sucessões da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

É preciso tomar cuidado para não confundir questões naturais com alienação, diz Giselle Groeninga, diretora nacional do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família), entidade que se posiciona a favor da lei: “Quando há uma separação, o filho pode ficar mais perto da mãe ou do pai, faz parte do desenvolvimento. Muitas vezes é só uma situação transitória.”

Na esteira das polêmicas, foi instaurada a CPI dos Maus-Tratos, presidida pelo ex-senador Magno Malta, cujos trabalhos foram encerrados em dezembro de 2018. Deu origem a projeto de lei que pedia a revogação da norma por propiciar “o desvirtuamento do propósito protetivo da criança ou adolescente.”

Em 18 de fevereiro, a Comissão de Direitos Humanos do Senado aprovou um substitutivo ao projeto fruto da CPI, de autoria da senadora Leila Barros (PSB-DF): em vez da revogação, propõe alterações.

Uma das mudanças é em ponto que fala sobre falsa denúncia. A senadora propõe que, em vez de “apresentar falsa denúncia”, o trecho fale em apresentar denúncia “sabendo-a falsa”. “Não importa se a denúncia é de fato falsa, mas, sim, se é sabidamente falsa no momento em que é formulada”, diz o parecer.

Também sugere que o juiz promova audiência com as partes antes de tomar decisão e proponha a mediação ou outros métodos de solução de conflito como alternativa.

E acrescenta um novo artigo à lei, que criminaliza a falsa acusação de alienação parental. A pena proposta é de reclusão de 2 a 6 anos e multa.

O substitutivo está agora na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) do Senado e aguarda parecer da relatoria. Depois de votada na CCJ, será encaminhada para análise na Câmara.

Braga, da OAB, avalia a proposta como positiva. “Vai promover a melhor aplicação da lei e evitar a revogação de norma que, apesar de casos de má aplicação, também permitiu evitar alienação parental”, diz.

O advogado Analdino Paulino, da Apase (Associação de Pais e Mães Separados), organização envolvida na elaboração da lei de 2010, diz que a norma não pode ser revogada porque corrige desigualdades.

“Uma fatia do Judiciário acha que homem não serve para cuidar do filho, entendimento arcaico”, diz. “O que a gente busca é igualar direitos e poderes de homens e mulheres na criação dos filhos.”

Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo, os processos de alienação parental no estado quase dobraram de 2016 para 2019: de 232 para 458.

Perguntas e respostas

O que diz a lei da alienação parental?

Sancionada em agosto de 2010, a lei 12.318,classifica o ato de alienação parental como a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente por um dos pais ou outro responsável contra um dos genitores. A proposta é garantir a boa convivência entre pais e filhos.

Quais são as punições para quem infringir a lei?

Advertência, multa, compartilhamento ou inversão da guarda e, em casos mais graves, suspensão da autoridade parental, entre outras.

Por que a lei é controversa?

Os defensores dizem que garante a boa convivência entre pais e filhos e iguala direitos de homens e mulheres sobre os cuidados dos menores.

Já os críticos afirmam que foi aprovada sem a devida discussão, que parte de um conceito controverso e que as consequências da medida foram desde a estigmatização de mulheres até o abuso sexual de crianças.

A lei pode ser alterada?

Uma proposta que pede a alteração de alguns pontos da lei tramita no Senado. Sugere, por exemplo, que o juiz proponha a mediação como alternativa à judicialização e criminaliza a conduta de falsa acusação de alienação parental.

Folhapress

Veja também

Bolsonaro pode ser preso após indiciamento? Entenda os próximos passos do processo

Jair Bolsonaro (PL) foi indiciado pela Polícia Federal nesta quinta-feira (21) pelos crimes de abolição …

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

error: Content is protected !!