A força-tarefa da Operação Lava Jato, no Paraná, e a Petrobras ajuizaram uma ação civil pública por improbidade administrativa contra os partidos PSB e MDB, os senadores Valdir Raupp (MDB-RO) e Fernando Bezerra (PSB-PE), o deputado federal Eduardo da Fonte (PP-PE) e os espólios do ex-senador e ex-deputado federal Sérgio Guerra (PSDB-PE) e do ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) – ambos mortos em 2014.
Também são acusados pelo Ministério Público Federal e pela estatal quatro investigados ligados aos políticos, a construtora Queiroz Galvão, a Vital Engenharia Ambiental, e outros cinco executivos e funcionários da Queiroz Galvão e o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa.
A ação pede o pagamento de mais de R$ 3 bilhões, perda dos cargos, suspensão de direitos políticos e perda dos direitos de contagem e fruição da aposentadoria pelo Regime Especial. O juízo da 1ª Vara Federal de Curitiba deferiu o pedido liminar dos autores e determinou o bloqueio de um precatório de R$ 210 milhões que a construtora Queiroz Galvão estava prestes a receber do estado de Alagoas.
A procuradora regional da República e integrante da força-tarefa Lava Jato, Isabel Vieira Groba, ressalta que ‘esse é o maior bloqueio individual de valores no país realizado até agora pela Lava Jato, feito sobre um dos maiores precatórios da história do Estado de Alagoas que corresponde sozinho a mais de quatro vezes tudo o que o Estado pagou no ano de 2017’.
As informações foram divulgadas nesta terça-feira, 18, pelo Ministério Público Federal.
Ações de improbidade administrativa são demandas que objetivam responsabilizar agentes públicos por desvios de conduta definidos em lei, assim como particulares que concorrem para o ato. A Lei nº 8.429/92 prevê, basicamente, três tipos de atos de improbidade, com diferentes sanções: os que importam enriquecimento ilícito, os que causam dano ao Erário e aqueles que atentam contra princípios da administração pública.
A ação detalha dois esquemas de desvios de verbas da Petrobrás: um envolvendo contratos vinculados à diretoria de Abastecimento, especialmente contratos firmados com a construtora Queiroz Galvão, individualmente ou por intermédio de consórcios, e outro referente ao pagamento de propina no âmbito da CPI da Petrobras em 2009. As atividades ilícitas foram enquadradas nas três modalidades de improbidade, mas se pediu que sejam aplicadas as sanções mais graves, referentes às situações que geram enriquecimento ilícito, e subsidiariamente as demais sanções.
O primeiro esquema
A Lava Jato descreve, na ação, ‘um enorme e complexo estratagema ilícito executado em prejuízo da Petrobras, ao menos no período de 2004 a 2014’. Segundo os investigadores, um cartel de empreiteiras fraudava procedimentos licitatórios da estatal em obras gigantescas, inflando indevidamente os lucros obtidos.
Os procuradores relatam que ‘o cartel contava com a corrupção de empregados públicos do alto escalão da Petrobrás, especialmente de diretores da estatal que favoreciam as fraudes nas licitações’. Na ação, a Procuradoria afirma que os recursos ilícitos obtidos passavam por um processo de lavagem por meio de operadores financeiros.
“As propinas eram entregues pelos operadores para os executivos da estatal, assim como para os políticos e partidos responsáveis pelo apadrinhamento dos funcionários públicos”, afirmou o Ministério Público Federal em nota.
“O avanço das investigações levou à descoberta de que esse amplo esquema criminoso se baseava no loteamento político-partidário das diretorias da Petrobrás.”
De acordo com a Lava Jato, parlamentares federais e os partidos PP, PT e MDB ‘obtinham, perante o governo federal, a nomeação para altos cargos diretivos da Petrobrás a fim de arrecadar recursos escusos’. Em troca do apadrinhamento, narram os procuradores, os executivos angariavam propinas que eram destinadas ao enriquecimento ilícito dos participantes e ao financiamento ilegal de campanhas eleitorais.
A ação mira, no âmbito deste esquema, ‘a atividade ilícita que beneficiou’ o PSB, o MDB e investigados vinculados aos partidos.
“As provas evidenciaram a atuação destacada de Valdir Raupp como representante dos interesses do MDB e de Fernando Bezerra e do falecido ex-governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), como representantes dos interesses do PSB no estado de Pernambuco”, descreve a Lava Jato.
“Raupp foi responsável por manter Paulo Roberto Costa no cargo de diretor de Abastecimento da Petrobras, dando prosseguimento ao esquema de corrupção político-partidário instaurado no âmbito da estatal. Já Bezerra e Campos, ainda conforme a ação, foram responsáveis por favorecer interesses das empresas cartelizadas, contribuindo com infraestrutura e incentivos tributários para construção da Refinaria do Nordeste ou Refinaria Abreu e Lima – RNEST, localizada em Pernambuco.”
A Procuradoria imputa ao MDB, a Valdir Raupp e a outros investigados o recebimento de propinas a partir de contratações realizadas no âmbito da Diretoria de Abastecimento da Petrobrás com a empreiteira Queiroz Galvão, individualmente ou por meio de consórcio. O montante de propinas originado dessas contratações chega, ao menos, a R$ 108.153.206,05, equivalentes a 1% dos valores de onze contratos da estatal com a Queiroz Galvão, que era pago a título de suborno.
Já ao PSB, Eduardo Campos, Fernando Bezerra e outros investigados, a Lava Jato atribui propinas a partir de contratos referentes à Refinaria do Nordeste ou Refinaria Abreu e Lima. O Ministério Público Federal afirma que o montante de propinas originado dessas contratações chega, ao menos, a R$ 40 milhões, provenientes das empreiteiras Queiroz Galvão, OAS e Camargo Correa, que foi pago a título de suborno.
“As investigações revelaram que a aeronave em que ocorreu o acidente aéreo que vitimou Eduardo Campos e mais seis pessoas, no dia 13 de agosto de 2014, foi comprada, pelo menos em grande medida, com dinheiro de propina. O jato Cessna Citation, 560 XLS, prefixo PR-AFA, era utilizado por Eduardo Campos em sua campanha presidencial e foi comprado por João Carlos Lyra Pessoa de Mello Filho pelo valor de R$ 1.710.297,03”, aponta a Lava Jato.
Os procuradores relatam que João Carlos Lyra Pessoa de Mello Filho ‘desempenhou o papel de operador das propinas recebidas por Eduardo Campos’ e é acusado de ter recebido subornos para o ex-governador por diversas vezes.
Segundo a ação, o operador recebeu, em conta pessoal, R$ 920 mil da OAS, que se originaram de contas de empresas controladas pelos operadores financeiros Roberto Trombeta e Rodrigo Morales, os quais trabalhavam para a empreiteira. A Lava Jato afirma que João Carlos Lyra Pessoa de Mello Filho era o proprietário de fato da empresa Câmara & Vasconcelos – locação e terraplenagem Ltda, a qual simulou a prestação de serviços para empresas dos operadores financeiros que trabalhavam para a OAS Roberto Trombeta e Rodrigo Morales, no valor de R$ 1.925.000,00, além de simular a prestação de serviços para a própria Construtora OAS no valor de R$ 13.094.643,33. Segundo os investigadores, o operador ainda intermediou o recebimento de subornos da Camargo Corrêa que alcançaram o montante de R$ 14.685.229,14, mediante a simulação da prestação de serviços entre o Consórcio Nacional Camargo Corrêa e a empresa Master Terraplanagem, que não tinha atividade real e de fato era igualmente utilizada para receber propina destinada a Eduardo Campos.
As investigações apontam ainda que a compra da aeronave foi realizada mediante o pagamento fracionado do seu valor total por diversas pessoas físicas e jurídicas, em operação típica de lavagem de capitais, destacando-se os seguintes pagamentos feitos pelo próprio João Carlos Lyra Pessoa de Mello Filho, que transferiu R$ 195.000,00; pela empresa utilizada por João Carlos para receber propina, a Câmara & Vasconcelos, que efetuou uma transferência de R$ 159.900,00; pelo advogado pernambucano Luiz Piauhylino de Mello Monteiro Filho, filho do ex-deputado federal do PSB Luiz Piauhylino de Mello Monteiro, padrasto de João Carlos Lyra Pessoa de Mello Filho, que transferiu R$ 325.000,00; pela Ele Leite Negócios Imobiliários Ltda., empresa utilizada para lavagem de capitais e pertencente ao empresário pernambucano Eduardo Freire Bezerra Leite, muito próximo de João Carlos Lyra Pessoa de Mello Filho, que efetuou transferência de R$ 727.000,00; e por duas empresas “fantasmas”, constituídas em nome de interpostas pessoas (“laranjas”), a RM Construções Ltda. e a Geovane Pescados Eireli, que transferiram o restante dos valores.
O procurador da República e coordenador da força-tarefa Lava Jato, Deltan Dallagnol, vê o fato com preocupação. “Trata-se de propinas canalizadas para a campanha de um presidenciável que, não tivesse falecido, poderia ter sido presidente do Brasil ou ocupado outra alta função pública na esfera federal. O fato de que presidenciáveis, presidente e três ex-presidentes estão acusados por crimes graves deve gerar uma profunda reflexão sobre a necessidade de reformas no sistema político brasileiro”, afirmou.
O segundo esquema
A Lava Jato identificou também que Eduardo da Fonte e Sérgio Guerra receberam propina para que a CPI da Petrobrás em 2009 não tornasse público e cessasse o esquema de pagamento de propinas arrecadadas de contratos celebrados entre a estatal e empresas privadas. Segundo a operação, os políticos solicitaram e receberam R$ 10 milhões das empreiteiras Queiroz Galvão, Galvão Engenharia e IESA.
A CPI da Petrobrás de 2009 foi instaurada para apurar irregularidades na estatal relacionadas, entre outros fatos, ao possível superfaturamento na construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, apontado por relatório do Tribunal de Contas da União. Ninguém foi indiciado nem foi promovido encaminhamento para aprofundamento de investigações sobre as obras da Refinaria Abreu e Lima.
“Foram feitas apenas ‘sugestões’ para sanar ‘divergências metodológicas’ quanto à ‘estimativa de custos’, sem qualquer repercussão criminal. Nenhum executivo da Queiroz Galvão nem da Galvão Engenharia foi ouvido. As empresas Queiroz Galvão e Galvão Engenharia não foram nem sequer citadas no relatório final da CPI de 2009”, narra a Lava Jato.
Para o procurador da República e integrante da força-tarefa Lava Jato, Felipe Camargo, ‘esta é mais uma vez em que a Lava Jato constata que uma CPI foi usada para arrecadar propinas e não alcançou qualquer resultado efetivo em apurar ilegalidades que existiam às milhares, o que também reflete uma disfunção no sistema político que precisa ser objeto de atenção’.
“Se o sistema fosse funcional, os prejuízos à Petrobrás poderiam ter sido estancados pelo menos cinco anos antes do começo da Lava Jato”, afirma.
Pedidos apresentados ao Judiciário
Nesta ação de improbidade administrativa, o Ministério Público Federal e a Petrobrás pedem que o MDB, Valdir Raupp, Queiroz Galvão, Vital Engenharia Ambiental, André Gustavo de Farias Ferreira, Augusto Amorim Costa, Othon Zanoide de Moraes Filho, Ildefonso Colares Filho e Petrônio Braz Junior sejam condenados: ao ressarcimento ao erário no valor total de R$ 595.320.614,50, equivalente à propina paga e às irregularidades presentes nos contratos da estatal com a Queiroz Galvão; ao pagamento de multa civil (exceto Ildefonso por ser falecido) de três vezes o valor da propina e duas vezes o valor das irregularidades contratuais; e ao pagamento de danos morais coletivos e individuais em montante não inferior a R$ 595.320.614,50 cada um. O valor pedido totaliza R$ 3.454.727.308,06.
Já em relação ao PSB, Eduardo Campos e Fernando Bezerra, o Ministério Público Federal e a Petrobrás pedem que sejam condenados: ao ressarcimento ao erário no valor total de R$ 258.707.112,76, equivalente à propina paga e às irregularidades presentes em contratos referentes à Refinaria do Nordeste ou Refinaria Abreu e Lima; ao pagamento de multa civil (exceto Eduardo Campos por ser falecido) de três vezes o valor da propina e duas vezes o valor das irregularidades contratuais; e ao pagamento de danos morais coletivos e individuais em montante não inferior a R$ 258.707.112,76 cada um. O valor pedido totaliza R$ 1.334.260.436,27.
Ainda, em relação a Sérgio Guerra e Eduardo da Fonte, a Procuradoria e a estatal pedem que sejam condenados: ao ressarcimento ao erário no valor total de R$ 107.781.450,00, equivalente à propina paga e às irregularidades presentes em contratos referentes ao Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (COMPERJ); ao pagamento de multa civil (exceto Sérgio Guerra por ser falecido) de três vezes o valor da propina e duas vezes o valor das irregularidades contratuais; e ao pagamento de danos morais coletivos e individuais em montante não inferior a R$ 107.781.450,00 cada um.
O Ministério Público Federal e a Petrobrás requerem também em relação a Maria Cleia Santos de Oliveira e Pedro Roberto Rocha, o ressarcimento de R$ 500 mil (propina paga), multa civil de R$ 1,5 milhão, e dano moral de R$ 1 milhão; e em relação a Aldo Guedes Álvaro e João Carlos Lyra Pessoa de Mello Filho, o ressarcimento de R$ 40.724.872,47 (propina paga), multa civil de R$ 122.174.617,41, e dano moral de R$ 81.449.744,94,
Além disso, pede-se a condenação de todas as pessoas físicas nas demais sanções da Lei de Improbidade Administrativa, como a suspensão dos direitos políticos por 10 anos, a proibição de contratar com o Poder Público e a vedação de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios. Pede-se, em decorrência das sanções aplicáveis em razão do ato ímprobo, a cassação da aposentadoria e/ou a perda do direito à contagem de tempo e fruição da aposentadoria, ainda que se trate de aposentadoria proporcional, na forma especial prevista no Plano de Seguridade dos Congressistas (PSSC) instituído pela Lei n.º 9.506/97.
Apuração criminal
Os fatos objeto da Ação de Improbidade Administrativa estão sendo apurados criminalmente na Ação Penal n.º 1015/DF e no Inquérito n.º 4005/DF, com tramitação no Supremo Tribunal Federal, e nas Ações Penais n.sº 5046120-57.2016.4.04.7000 e 5045575-84.2016.4.04.7000, com tramitação na 13ª Vara Federal de Curitiba/PR.
Há poucos dias, em 12 de dezembro, a 2ª turma do Supremo Tribunal Federal, por maioria dos ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, vencidos os ministros Edson Fachin e Celso de Mello, rejeitou a acusação contra o senador Fernando Bezerra Coelho pela acusação de corrupção relacionada à Refinaria Abreu e Lima. Para os procuradores da Lava Jato, ‘tal decisão é incompreensível à luz das evidências, que não se resumem a depoimentos de colaboradores conforme alegaram os ministros que optaram pela rejeição da denúncia, existindo ampla prova documental, que embasa a ação de improbidade oferecida’.
COM A PALAVRA, CARLOS SIQUEIRA, PRESIDENTE NACIONAL DO PSB
O Partido Socialista Brasileiro (PSB) recebe com surpresa a notícia veiculada nesta terça-feira (18) sobre uma ação civil pública ajuizada por procuradores da Operação Lava Jato do Paraná contra o partido.
Afirmamos que as campanhas do PSB sempre foram financiadas de acordo com as normas legais.
Quanto à citação, na mesma ação, do ex-governador e ex-presidente do partido Eduardo Campos, embora este não esteja mais entre nós para se defender, temos confiança plena de que nada haverá de ser comprovado que macule o nome e a honra de um homem público com tantos e tão relevantes serviços prestados a Pernambuco e ao Brasil.
O PSB reafirma, por fim, seu apoio incondicional ao trabalho de investigação, confiando que a condução isenta e equilibrada da apuração resultará no pleno esclarecimento dos fatos, isentando Eduardo Campos e o PSB de qualquer acusação.
CARLOS SIQUEIRA
Presidente nacional do Partido Socialista Brasileiro – PSB
COM A PALAVRA, O MDB
NOTA DO MDB
O MDB considera preocupante essa investida do Ministério Público contra um partido com mais de 50 anos de história e pilar da democracia brasileira. Responsabilizar instituições com base em depoimentos enviesados é um risco enorme para nossa estabilidade, ainda mais com uma peça que mais parece um panfleto político eleitoral. A verdade é que todos os recursos recebidos como doação pelo MDB foram contabilizados e todas as nossas contas foram aprovadas.
COM A PALAVRA, VALDIR RAUPP
O senador Valdir Raupp esclarece que a doação de R$ 500 mil – alvo da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal do Paraná foi feita ao diretório estadual do PMDB de Rondônia e não a sua campanha eleitoral, em 2010.
Ressalta, ainda, que as doações recebidas foram oficiais, legais, declaradas e aprovadas pela Justiça Eleitoral, conforme determinava à legislação em vigor, a época.
Por fim, diante da fragilidade das acusações provará que não cometeu nenhum ato ilícito.
COM A PALAVRA, PAULO ROBERTO COSTA
O jornal diz em publicação que tentou contato com a defesa do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. O espaço está aberto para manifestação.
COM A PALAVRA, FERNANDO BEZERRA
O senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) observa que o Supremo Tribunal Federal (STF) – instância máxima do Judiciário brasileiro – rejeitou recentemente (no último dia 11 e em setembro) o prosseguimento de investigações contra ele. Nas duas situações, o STF concluiu que as narrativas de supostos delatores não encontram qualquer ressonância com elementos de prova, posicionado-se contrário ao andamento dos inquéritos. Como reforça a defesa de Fernando Bezerra – representada pelo advogado André Callegari – “não há suporte mínimo de autoria e materialidade contra o senador e a consequência natural era a rejeição das denúncias pela Suprema Corte do país”.
COM A PALAVRA, EDUARDO DA FONTE
Eduardo da Fonte afirma que esses fatos apontados já foram analisados e rejeitados pela segunda turma do STF, após a apresentação de documentos que desmentem as delações.