Juiz dos EUA enfrenta processo por postar vídeos obsenos no TikTok

Sob o pseudônimo de “Sal Tortorella”, o juiz Gary Wilcox, de um fórum criminal de Nova Jersey, Estados Unidos, postou, de abril de 2021 a março deste ano, 40 vídeos no TikTok, 11 dos quais são “inapropriados e trouxeram descrédito para o Judiciário”, de acordo com uma queixa formal apresentada pelo Conselho Consultivo sobre Conduta Judicial ao tribunal superior do estado.

A queixa, segundo João Ozorio de Melo, do ConJur, que abre um processo disciplinar contra o juiz, sustenta que os vídeos “fazem referências a violência, sexo e misoginia”. Eles foram gravados no gabinete do juiz, no corredor do fórum, em um carro e na cama do magistrado. Em alguns, o magistrado está de toga, em outros, de camiseta com mensagem, e, no que está na cama, apenas parcialmente vestido.

A conselheira disciplinar do comitê Maureen Bauman afirma na queixa que, no vídeo, Wilcox fez sincronização labial de letras de raps populares, que “contêm profanidades, referências sexuais explícitas a partes do corpo feminino e masculino, violência, misoginia e termos racistas”. E deu alguns exemplos.

Em um vídeo gravado em seu gabinete, de camiseta, com seu rosto perto da câmera, ele faz a sincronização labial da música “Jump”, de Rihanna, que diz: “If you want it let’s do it. Ride it, my pony. My saddle is waitin’, come and jump on it. If you want it, let’s do it” (“Se você quer, vamos nessa. Monte, meu pônei. Minha sela está esperando, venha e pule nela. Se você quer, vamos fazê-lo”).

Em outro vídeo, com livros jurídicos como pano de fundo e usando terno e gravata, ele faz a sincronização labial desta letra: “All my life, I’ve been waiting for somebody to whoop my ass. I mean business! You think you can run up on me and whip my monkey ass? Come on. Come on!” (“Toda minha vida estive esperando por alguém que estimulasse minha bunda. Quero dizer, negócios! Você pensa que pode montar em mim e chicotear minha bunda de macaco. Venha, vamos!”).

Em um terceiro vídeo, o juiz, em seu gabinete, usando terno e segurando dinheiro na mão, finge acender um fósforo enquanto sincroniza labialmente a letra de “Sure Thing”, de Miguel: “If you be the cash, I’ll be the rubber band. You be the match, I will be a fuse, boom. Painter, baby, you could be the muse. I’m the reporter, baby, you could be the news. ‘Cause you’re the cigarette, and I’m the smoker. We raise a bet, ‘cause you’re the joker” (“Se você for o dinheiro, eu serei o elástico. Se for um fósforo, serei um estopim, bum! Pintor, bebê, você poderia ser a musa. Se sou repórter, você pode ser a notícia. Porque você é o cigarro e eu sou o fumante. Aumentamos a aposta, porque você é o curinga”).

O juiz também gravou um vídeo no TikTok usando uma camiseta dos personagens Beavis e Butt-Head, enquanto andava pelo fórum, com a música “Get Down”, de Nas, como trilha sonora. “A música contém letras explícitas relativas a um caso criminal e um tiroteio na sala de julgamento, bem como palavras aviltantes e discriminatórias, referências a drogas e a gangues e o assassinato em um hospital de um médico que tratou um membro de outra gangue”, diz a queixa.

Além disso, o juiz postou mais dois vídeos contendo palavrões e/ou referências sexuais, segundo a queixa. Em um deles, sentado em seu carro e usando uma camiseta com a mensagem “Liberdade de Expressão”, ele faz a sincronização labial da seguinte letra:

“Go ahead baby. You hittin’ them corners too god damn fast. You gotta slow this motha****a down. You understand? I almost spilled my [Cognac] on this 200-dollar suit” (“Vá em frente, bebê. Você está fazendo as curvas muito rápido. Você tem de desacelerar essa p***a. Você entende? Quase derramei meu [conhaque] neste terno de 200 dólares”).

No vídeo seguinte, Wilcox aparece sorrindo para a câmera, com um texto na tela que diz: “Quando sua namorada o chama de Papai Noel, é por causa de sua nova barba branca”. A trilha sonora ao fundo é da música “Touch it”, de Busta Rhymes, e se pode ouvir:

“For the record, just a second, I’m freakin’ it out. While she tryin’ to touch, see, I was peepin’ it out. She turned around and was tryin’ to put my d**k in her mouth. I let her” (“Para que conste, só um segundo, estou enlouquecendo. Enquanto ela tentava tocar, veja, eu estava espiando. Ela se virou e estava tentando colocar meu p** na boca. Eu deixei”).

A queixa conclui: “Por sua conduta, por postar esses e outros vídeos similares no TikTok, o inquerido mostrou mau discernimento e demonstrou desrespeito ao Judiciário, bem como uma incapacidade de se conformar aos altos padrões de conduta esperado dos juízes. Tal conduta mina a confiança do público no Judiciário, além de violar regras do Código de Conduta Judicial”.

O comitê acusa o juiz de violar as seguintes regras:

Cânon 1, Regra 1.1: Requer que os juízes observem altos padrões de conduta, de forma que a integridade e a independência do Judiciário sejam preservadas;
Cânon 2, Regra 2.2: Requer que os juízes evitem a impropriedade e a aparência de impropriedade e que ajam sempre de maneira que promova a confiança pública na integridade e imparcialidade do Judiciário;
Cânon 5, Regira 5.I(A): Requer que os juízes conduzam suas atividades extrajudiciais de uma maneira que não lancem dúvidas razoáveis na capacidade do juiz de agir imparcialmente como juiz, rebaixem o cargo judicial ou interfiram no desempenho apropriado de suas funções judiciais.

Informações adicionais

Além do que consta na queixa, o advogado Alexander Shalom, da American Civil Liberties Union (ACLU), disse aos jornais que o juiz terá, obviamente, direito ao devido processo legal para que seja decidida a possível medida disciplinar, que vai de reprimenda a afastamento do cargo.

No processo, “haverá muita discussão sobre questões que envolvem a liberdade de expressão e o que realmente prejudica a estatura do Judiciário”.

Wilcox é representado pelo advogado Robert Hille, que ainda está preparando a resposta à queixa do comitê. Informações adicionais dos jornais New York Times, The Independent e New York Post.