O Itamaraty colocou sob sigilo de cinco anos telegramas diplomáticos sobre os irmãos Joesley e Wesley Batista e a ditadura de Nicolás Maduro.
Em dezembro do ano passado, a reportagem do blog da Malu Gaspar, do O Globo, solicitou acesso ao inteiro teor digitalizado de telegramas, despachos telegráficos e circulares telegráficas do Ministério das Relações Exteriores com a embaixada do Brasil em Caracas sobre os irmãos Batista, o grupo J&F, a JBS e a Âmbar Energia.
Entre os assuntos abordados está o relato de uma visita ao então ministro de Petróleo e presidente da PDVSA, Pedro Tellechea, que teria ocorrido em 27 de fevereiro do ano passado. Mas o Termo de Classificação da Informação, documento em que o Itamaraty informa a imposição do sigilo, não esclarece quem participou da audiência nem os assuntos tratados.
A J&F tem interesses em jogo na Venezuela e mantido reuniões com autoridades do regime de Maduro.
Em 2023, o grupo dos irmãos Batista entrou no setor de óleo e gás ao adquirir a Fluxus, petroleira de pequeno porte. Após a aquisição, Joesley e Wesley passaram a procurar campos de petróleo na Venezuela e no Peru.
Em outra frente de negócios, em abril do ano passado, o Ministério de Minas e Energia autorizou que a Âmbar Energia, dos Batista, negociasse a compra de energia elétrica da Venezuela. Em outubro, a Âmbar assinou termo de transferência para assumir o controle da distribuidora de energia do Amazonas.
O sigilo nas comunicações diplomáticas sobre os irmãos Batista e a Venezuela foi determinado pela embaixadora do Brasil em Caracas, Glivânia Maria de Oliveira.
Ao fundamentar a decisão, a embaixadora recorreu a um dispositivo da Lei de Acesso à Informação que permite restringir o acesso a dados que possam “prejudicar ou pôr em risco a condução de negociações ou as relações internacionais do País, ou as que tenham sido fornecidas em caráter sigiloso por outros Estados e organismos internacionais”.
Mas, para a diretora executiva da ONG Transparência Brasil, Juliana Sakai, “causa espanto” que o Itamaraty queira esconder por cinco anos informações referentes aos negócios dos irmãos Batista na Venezuela.
“Este tipo de postura contraria o princípio da publicidade da administração pública, ao retirar do escrutínio público atividades de figuras que já confessaram anteriormente ter pagado propina para obter vantagens para os seus negócios.”
Eleição presidencial
Esta não é a primeira vez que o governo Lula impõe sigilo a informações que envolvam o regime ditatorial de Maduro, um dos temas mais sensíveis para diplomacia brasileira.
Conforme revelou o blog, o Itamaraty impôs o mesmo tempo de sigilo para seis ofícios enviados pela diplomacia brasileira ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre as eleições presidenciais na Venezuela.
A reportagem solicitou os ofícios após revelar que o governo Lula pressionou o TSE a enviar servidores para acompanhar in loco a tumultuada eleição presidencial venezuelana. O tribunal depois recuou e não enviou seus funcionários.
O resultado da eleição não é reconhecido pela maioria da comunidade internacional até hoje por conta da postura do governo Maduro de não divulgar publicamente as atas com os números de cada seção eleitoral, o que permitiria uma verificação por instituições independentes não controladas pelo chavismo.
Procurado pelo blog, o Itamaraty não se manifestou sobre o sigilo nem esclareceu quem compareceu à reunião com a PDVSA.
Já o grupo J&F informou que “não solicitou ou obteve apoio da embaixada brasileira na prospecção de investimentos na Venezuela; não participou de reunião com autoridades locais na Venezuela em companhia de autoridades brasileiras; e não firmou negócio com a PDVSA”.