O avanço de uma proposta que autoriza deputados e senadores a assumirem embaixadas sem que tenham de abrir mão do mandato mobilizou o Itamaraty, a Casa Civil e a Consultoria do Senado a se manifestarem de maneira contrária à medida.
Atualmente, conforme Marcela Mattos, do g1, a Constituição libera que parlamentares assumam, por exemplo, os cargos de ministro de Estado ou secretários estaduais sem perder o mandato.
Também podem ser chefes de uma missão diplomática – contanto que seja temporária.
A Proposta de Emenda à Constituição amplia a regra e permite que parlamentares também assumam uma embaixada de forma permanente.
Nesta quarta-feira (6), a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado pegou parlamentares de “surpresa” ao incluir o tema na pauta de última hora. O autor do projeto é o senador Davi Alcolumbre (União-AP), que também preside a comissão.
A votação da proposta acabou adiada após pedidos de senadores de oposição e da base governista.
Pouco antes do adiamento, o Ministério das Relações Exteriores publicou uma nota na qual afirma que a aprovação da PEC afetaria a cláusula pétrea da separação de poderes e a competência privativa do presidente da República.
“Todo embaixador deve obediência ao presidente da República, por intermédio de seu principal assessor de política externa, o ministro das Relações Exteriores. Há exemplos de eminentes ex-parlamentares, indicados pelo presidente e aprovados pelo Senado, que desempenharam com brilho a responsabilidade de embaixador. Nesse caso, o ex-parlamentar é servidor do Poder Executivo Federal, subordinado ao Presidente da República”, ressalta o texto.
No documento, o Itamaraty ainda pede um “saudável debate” com outros segmentos da sociedade e um processo deliberativo “ponderado e respeitoso” sobre o tema.
Casa Civil vê incompatibilidade
Em ofício, a Casa Civil também vê afronta à separação dos poderes e afirma que a proposta incorre em incompatibilidade com o exercício da função diplomática.
A Casa Civil pondera ainda que o texto leva a uma vulnerabilidade do regime de imunidades parlamentares – deputados e senadores têm, por exemplo, direito a foro privilegiado.
“Considerando, principalmente, a incompatibilidade no exercício da função diplomática e a manutenção em harmonia do sistema de tripartição de poderes, sugere-se posição contrária à PEC”, a Casa Civil.
‘Cooptação política’
Já a consultoria do Senado, em resposta a questionamento feito pelo senador Espiridião Amin (PP-SC), além de ressaltar a quebra do princípio da separação entre os poderes, aponta para o risco de que os cargos sejam utilizados para negociações políticas.
O documento aponta que há quase 200 cargos, entre embaixadas, consulados e outras funções de representação no âmbito do Itamaraty, o que seria um “ativo político” qualificado que pode impactar o funcionamento do Congresso e comprometer a isenção na deliberação de matérias.
“A investidura de parlamentares em cargos de chefia de missão diplomática permanente, assim como a investidura dos suplentes nos mandatos parlamentares, poderia caracterizar forma de cooptação política com vistas à adesão aos projetos e propostas do Poder Executivo”, afirma parecer da Consultoria do Senado.