Um cenário de cessar-fogo entre Israel e Hamas na guerra em curso no Oriente Médio será de alívio para as populações israelense e palestina, mas tende a trazer um novo desafio político para o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. Especialistas ouvidos pela Coluna avaliam que ele será emparedado pela sociedade civil e até mesmo por aliados pelas falhas de segurança e inteligência que levaram ao ataque terrorista do Hamas no seu território.
Membro do Instituto Brasil-Israel o jornalista Henrique Cymerman afirmou que, logo após a guerra, “vamos ver centenas de milhares de pessoas nas ruas exigindo a demissão de Netanyahu”. Cymerman cobre os conflitos no Oriente Médio há quase três décadas e já entrevistou cinco líderes do Hamas.
“Netanyahu falhou e eu acho que chegou o momento (de ele ser afastado) depois de 16 anos não consecutivos no poder”, disse em entrevista à Coluna do Estadão. “No momento em que acabar a guerra, no momento em que a situação esteja estável, nós vamos ver toda a sociedade de Israel, não só com 150 mil pessoas na rua, como aconteceu nos últimos 10 meses devido à revolução judicial que ele tentou fazer”, completou.
Netanyahu governa atualmente com o apoio da oposição no gabinete de guerra montado para manter a coesão nacional durante o período em que durar o conflito com as tropas do Hamas. O governo emergencial é composto por líderes da oposição, como Benny Gantz, mas a avaliação é que o apoio temporário ao primeiro-ministro para enfrentar os terroristas deve se esvair rapidamente após o cessar-fogo.
O professor de Relações Internacionais da Universidade Federal Fluminense (UFF) Vitelio Brustolin avalia a “imagem de defensor da segurança” criada por Netanyahu foi “abalada”. “Muitos dos seus próprios eleitores não têm mais a imagem do Netanyahu como alguém que defenda efetivamente e eficazmente a segurança de Israel. Não tem como recuperar isso”, completou, ele que também é pesquisador na Universidade de Harvard.
O professor Brustolin coloca em perspectiva a situação, comparando com a renúncia da ex-primeira-ministra Golda Meir, após as falhas em prever a guerra do Yom Kipur. “Se a gente olhar para a história tem argumentos para prever, ou fatores para criar hipóteses, o que vai acontecer com Netanyahu”, disse.
“Há uma tradição em Israel de tratar os culpados por derrotas como essa de maneira muito cruel. Tem três casos muito importantes: Golda Meir, Ariel Sharon e agora Netanyahu”, avaliou o professor Michel Gherman, que é professor de sociologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Gherman e Brustolin têm avalições semelhantes. “Bibi Netanyahu perdeu completamente a legitimidade, porque nada do que ele prometeu conseguiu cumprir. Nem segurança, nem imagem de Israel no mundo”. Os setores mais liberais e progressistas da sociedade israelelense já estão entendendo que Netanyahu não é mais relevante”, avaliou o professor da UFRJ.
Além da situação da guerra, o primeiro-ministro israelense enfrenta processos na Justiça por acusações de suborno, fraude e quebra de confiança. Para Brustolin, é esperado que Netanyahu não deixe o governo sem lutar, o que pode colocar me risco a democracia do País.