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sábado 4 de março de 2023 às 12:09h

Invasão do MST foi caso isolado e governo vai proteger propriedade privada, diz ministro

NOTÍCIAS, POLÍTICA


O ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, afirma que a invasão do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) nas fazendas da Suzano Celulose, no sul da Bahia, foi um caso isolado. Ele diz ainda que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai proteger a propriedade privada.

“O Ministério do Desenvolvimento Agrário vai atuar conforme a Constituição, proteger a propriedade privada e exigir o cumprimento da função social da propriedade”, afirmou em entrevista à Folha. “Caso ela não cumpra a função social da propriedade, ela será desapropriada para fins de reforma agrária.”

Teixeira diz também que não esperava essa atitude do movimento. “A mim agora cabe ajudar na superação desse conflito e cabe também estabelecer mecanismos preventivos de novos conflitos”, afirmou.

Na campanha, o presidente Lula disse que o MST só invadia terras improdutivas. O sr. conversou com ele sobre o episódio na Bahia?

Não conversei. Em primeiro lugar, o presidente Lula disse que o MST tem toda uma dedicação na organização de cooperativas. Isso é verdade. [Em relação a] essa ocupação havida na Bahia, eu fui procurado pela empresa Suzano pedindo para eu fazer uma mediação com o MST. Então me prontifiquei e indaguei por que não havia uma negociação. Ela disse que topava uma negociação, desde que eles se retirassem.

Eu liguei para o MST e eles disseram que a ocupação se deveu à interrupção de um acordo celebrado entre MST e Fibria em 2010 —e interrompido em 2016. O que o MST alegou é que, nesses anos, a Fibria teria sido comprada pela Suzano e não mais os recebeu. Essa ação do MST teria acontecido com o objetivo de restauração do diálogo.

O senhor considera ofensiva essa ação?

Eu mesmo, quando liguei para o MST, pedi que eles pudessem se retirar da área para a retomada do diálogo com a Suzano.

Avalia que ainda há um impasse?

Eles [MST] alegaram que, depois de mandar inúmeras mensagens, cartas, para a Suzano, nunca tiveram respostas. Aí se deu o momento desse conflito. A Suzano, ao me procurar… [eu] me prontifiquei a promover o diálogo. Deixamos uma data indicativa da próxima quarta-feira [8], em Brasília. E eles fizeram a exigência de que o MST se retirasse da área para que eles pudessem se sentar à mesa.

Em que estágio está a saída da fazenda?

Estamos aguardando uma resposta do MST para marcar a reunião. A reunião só acontecerá depois que eles se retirarem dessa área que foi ocupada. Na verdade, a partir da ocupação, há uma decisão da Suzano de retomar o diálogo.

Então o movimento foi bem-sucedido?

A retomada no diálogo não é, em si, o melhor resultado. O melhor resultado tem que ser a realização do programa de reforma agrária. Tendo em vista que, se nós estamos no papel de mediadores, enquanto mediadores eu não posso julgar quem errou nesse processo.

Os dois lados têm uma caixa de acusação em relação ao outro. A mim cabe ajudar na superação desse conflito e estabelecer mecanismos preventivos de novos conflitos.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) usou o MST como arma contra o Lula. A invasão dá munição para os bolsonaristas?

Desde o governo FHC, até antes, no governo Sarney, Itamar, aconteceram ocupações de terra. O fato é que nós precisamos acelerar o programa de reforma agrária. O governo Bolsonaro paralisou todo processo de aquisição de áreas para reforma agrária. Ele foi um inimigo frontal do programa. Havia muitas decisões em que a Justiça já tinha dado ganho de causa para a aquisição das áreas, e eles desistiram desse processo.

Há um represamento do programa de reforma agrária. E não só o represamento, o governo Bolsonaro estimulou a violência e o uso de armas no campo.

Ao acelerar o programa de reforma agrária, [queremos] estabelecer mecanismos de resolução de conflitos que possam solucioná-los de maneira que não tenha traumas na sociedade, que não tenha emprego de violência.

Na campanha, Bolsonaro insistiu que a eleição de Lula representaria a volta da violência no campo. A ação do MST reforça esse discurso?

Acho que não. O que reforçou a violência no campo foi a política dele, Bolsonaro. Muitos trabalhadores rurais foram mortos, indígenas foram mortos, ele ajudou a armar o povo do campo. Isso é violência. Em relação ao fato ocorrido anteontem, estamos agindo para a superação do conflito. Não me consta que tenha havido emprego de violência, que alguém tenha sido atingido [na ação do MST na Bahia].

Como o governo deve se posicionar diante de invasões a áreas privadas e produtivas?

Nós queremos acelerar o programa de reforma agrária, acelerar o atendimento às famílias que estão no campo. Já constituímos um núcleo de resolução de conflitos. Queremos diminuir os conflitos no campo no Brasil e implementar o programa de apoio à agricultura familiar. E, na nossa opinião, fenômenos como esses vão diminuir por conta da aceleração da reforma agrária.

Como avalia a possibilidade de uma punição? Seria pedagógica?

Na minha opinião, futuramente, quando tiver conflitos dessa natureza, eu vou colocar o ministério aberto para que o diálogo ocorra antes de qualquer tipo de ação.

Mas caso exista a ação, o movimento deve ser punido em caso de ocupação de terra produtiva com aplicação de multa, corte de verba?

A reforma agrária tem uma orientação constitucional para que possa acontecer em terras improdutivas. Ela não vai acontecer em terras produtivas. Assim, eu não estou vendo que essa ação do MST tenha como objetivo transformar essa terra em terra para reforma agrária. Foi um conflito havido, segundo eles, pela falta de diálogo. O que eu quero é ajudar a resolver esse conflito e criar uma jurisprudência para prevenção de novos conflitos que se possa resolver sem esse tipo de estressamento.

Diria que o MST não está dentro da legalidade nesse caso da Suzano?

Há já uma decisão judicial que manda eles se retirarem da área e também estabelece uma multa para frente. Cabe à Justiça essa definição. A nós, cabe diminuir esse grau de conflito, resolver essa situação que está mal parada e criar mecanismos de prevenção.

Considera legítima a ocupação de área improdutiva como forma de pressão pela reforma agrária?

A Constituição diz que a propriedade tem que cumprir a função social. Quando tiver a indicação de propriedade que não esteja cumprindo a função social, é dever do Estado desapropriá-la para fins de reforma agrária.

O que nós vamos fazer é tentar acelerar esse processo. Vamos procurar também arrecadar áreas de grandes devedores de impostos do Estado brasileiro, que poderão promover a doação em pagamento. Ao mesmo tempo, nós queremos que essas famílias possam se envolver com uma prática agrícola sustentável, produzindo produtos sem agrotóxicos, que possam se apropriar de técnicas agrícolas modernas, de equipamentos para o cultivo dessas áreas. Que tenham também capacidade de alimentar o povo brasileiro, que é o grande desafio do presidente Lula.

O governo pretende desapropriar áreas invadidas pelos sem-terra?

O programa de reforma agrária só pode desapropriar terras que não estejam cumprindo a função social, cuja produtividade seja baixa e esteja em patamares inferiores àqueles exigidos pela legislação. Logo, para haver a desapropriação, temos que cumprir a lei e a Constituição. Nós vamos fazer isso. Vamos cumprir a lei e a Constituição, não vamos nos distanciar desses parâmetros legais.

Agora, é um crime, num país como o nosso, processos tramitarem por sete, oito anos na Justiça, o Estado ganhar em todas as fases e, quando chega na fase final, o Estado desistir do processo. É um crime tantas pessoas aguardando terra para reforma agrária, morando em condições insalubres, em acampamentos em beira de estrada, é um crime o Estado desistir desses processos por questões de natureza ideológica.

O governo Michel Temer (MDB) também procedeu assim?

Houve uma desaceleração no governo Temer e uma paralisação no governo Bolsonaro. A Constituição brasileira protege a propriedade, mas exige o cumprimento da sua função social. O MDA [Ministério do Desenvolvimento Agrário] vai atuar conforme a Constituição, proteger a propriedade privada e exigir o cumprimento da função social da propriedade. Caso ela não cumpra a função social da propriedade, ela será desapropriada para fins de reforma agrária.

O presidente Lula tem uma dívida histórica com os sem-terra com a promessa de atualização dos índices de produtividade da reforma agrária. Isso será cumprido agora?

Todas as metas que o presidente Lula colocou em seu programa ele vai cumprir.

Qual a meta de assentamentos de famílias para este ano?

Houve uma desestruturação do programa de reforma agrária no Brasil. Agora estamos remontando o ministério para fazer um planejamento estratégico, o levantamento de áreas, o custo da aquisição dessas áreas.

O senhor se surpreendeu com a ocupação na Bahia? Esperava uma trégua?

Eu li uma entrevista com o João Paulo Rodrigues, do MST, em que ele disse que essa medida foi uma ação isolada. Eu não esperava e ele mesmo, na entrevista, diz que foi uma ação isolada. Não foi uma ação orquestrada do MST.

O senhor se sentiu traído? Acha que eles abriram mão de um canal preexistente?

As portas estão abertas para os movimentos. Nesse caso, quem procurou foi a empresa Suzano, o que mostra também que estamos disponíveis para toda sociedade brasileira.

Existe um esforço do governo de aproximação com o agronegócio. Ações como essa prejudicam esse esforço?

Eu vou reportar novamente à entrevista que eu li do João Paulo Rodrigues em que ele diz que foi um caso isolado. Ele já circunscreveu essa ação a um caso isolado. O bom leitor, qualquer leitor formador de opinião da sociedade brasileira, entenderá que essa ação foi uma ação isolada, que não se trata de uma política do MST.

Raio-X

Paulo Teixeira, 61 anos

Formado em Direito pela USP, foi eleito para o quinto mandato como deputado federal por São Paulo antes de ser convidado por Lula para comandar o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Foi deputado estadual em São Paulo de 1994 a 2000, além de vereador na capital paulista de 2004 a 2007.

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