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sexta-feira 17 de junho de 2022 às 16:20h

Infraestrutura: o caminho para o desenvolvimento do Brasil

DESTAQUE, NEGÓCIOS, NOTÍCIAS


O aumento da participação privada na área de infraestrutura é principal medida para a modernização dos setores de transportes, energia, saneamento básico e óleo e gás no Brasil. A solução dos atuais gargalos passa, obrigatoriamente, pelo aumento dos investimentos – capacidade que o poder público não tem hoje – e a maior entrada do capital privado na gestão da infraestrutura.

Além da maior capacidade de mobilização de recursos, o setor privado é mais flexível e consegue responder mais rapidamente às oportunidades de mercado. Parcerias entre os setores público e privado são imprescindíveis para a redução do déficit na área de infraestrutura. É preciso eliminar obstáculos, como o atraso das obras, burocracia e demora no licenciamento ambiental.

Na última década, a redução progressiva dos investimentos públicos, a crise fiscal e os problemas históricos de governança e gestão de ativos e empresas dos governos federal e estaduais evidenciaram a necessidade das concessões e privatizações se consolidarem como uma agenda de Estado. Desde 2016, o total de empresas estatais no âmbito federal se reduziu de 230 para 155.

A queda ocorreu principalmente com a venda de subsidiárias das holdings sob controle direto da União, no caso da Eletrobrás e Petrobrás. O total considerável de empresas ainda sob gestão do estado revela que há espaço para novas desestatizações, especialmente no setor de infraestrutura. Nesse sentido, a agenda de concessões e privatizações precisa ser cada vez mais priorizada pelo poder público. Há um leque de oportunidades para investidores nos mais diferentes setores da infraestrutura.

A privatização da Eletrobrás, potencialmente a maior operação do tipo a ser realizada no país, está prevista para o primeiro semestre de 2022 e deverá ocorrer por meio de uma oferta primária de ações detidas pela União, o que assegurará o controle da empresa pelo setor privado. Em conjunto com outras desestatizações, como a do Porto de Santos, Correios, e a médio e longo prazo, da Telebrás, o Brasil passará a ter ativos de grande importância governados e geridos em bases sólidas, sem interferências indevidas e capazes de realizar os investimentos necessários. Há também importantes aeroportos na lista de concessões previstas.

Um importante passo dado pelo país no sentido de modernizar sua infraestrutura foram as recentes aprovações de marcos legais como o do saneamento básico, do gás natural e das ferrovias. A definição de regras claras e o consequente aumento da segurança jurídica atrai investidores nacionais e estrangeiros. Nas próximas páginas, VEJA INSIGHTS em parceria com a Confederação Nacional da Industria (CNI) traz uma avaliação do setor de infraestrutura e os próximos passos a serem adotados nas concessões e privatizações.

Boa leitura!

INVESTIMENTOS PARA O BEM DO BRASIL

Por Robson Braga de Andrade*

Diante das conhecidas restrições fiscais do setor público, o crescimento econômico do Brasil, nos próximos anos, será tão mais expressivo e consistente quanto maior for o investimento privado. Não há como escapar dessa fórmula. É preciso incentivar, com todos os meios disponíveis, novos projetos produtivos e nas diversas áreas da infraestrutura.

O tão desejado crescimento sustentado ao longo do tempo, sem bolhas nem inflação fora do controle, tem mais condições de se viabilizar pelos investimentos do que pelo consumo. Somente com o aumento do volume de recursos aplicados na economia real será possível aperfeiçoar nossa deficiente infraestrutura, além de inovar, ampliar a competitividade e a produtividade, e melhorar a qualidade de produtos e serviços. Apostar nesse rumo é gerar emprego, riqueza e bem-estar para a população.

Infelizmente, o volume de investimentos como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) permanece muito aquém do necessário. Estava em 20,9% em 2013, quando iniciou uma trajetória contínua de queda. Em 2017, chegou à marca histórica de 15% do PIB. Em 2018, 90% dos países investiram mais do que o Brasil, o que mostra o tamanho da estagnação nacional na comparação com o resto do mundo. Em 2020 – mesmo com a forte contração da economia, em função da pandemia da Covid-19 –, a taxa de investimentos subiu um pouco e chegou a 16,4% do PIB.

“As políticas liberalizantes adotadas nos últimos anos têm a direção correta, mas é indispensável aprofundá-las.”

É pouco por qualquer parâmetro que se queira analisar, tanto em relação aos nossos principais concorrentes no plano global quanto ao que já fizemos no passado. Para investir, os empresários precisam de confiança no desempenho da economia e na possibilidade de sucesso em seus negócios. Esse otimismo nasce naturalmente quando as políticas públicas vão no sentido de aumentar a segurança jurídica, cortar a burocracia, em especial a tributária, diminuir os custos de empreender, facilitar o crédito e estimular o emprego.

As políticas liberalizantes adotadas nos últimos anos têm a direção correta, mas é indispensável aprofundá-las. Nunca é demais insistir na necessidade das grandes reformas estruturais que possam diminuir o peso do Estado sobre as empresas e capacitar a economia a se expandir. O impulso aos investimentos a ser dado por uma ampla modernização do sistema tributário nacional é incalculável – o emaranhado de obrigações desnecessárias hoje existentes desanima qualquer um que pense em iniciar ou ampliar seu negócio no país.

A ampliação da participação privada na infraestrutura brasileira por meio das concessões de portos, aeroportos, ferrovias e rodovias, conforme tivemos a satisfação de observar recentemente, é um requisito para o aumento dos investimentos na economia. Além disso, é imprescindível avançar decididamente na privatização das empresas estatais, como a Eletrobras e as companhias de saneamento. O Estado não tem mais condições fiscais e gerenciais de fazê-las se desenvolver e prestar serviços de qualidade.

Mais do que nunca, é fundamental o estímulo à participação privada na infraestrutura para remover os crônicos obstáculos ao nosso desenvolvimento econômico. Trabalhar pela promoção dos investimentos das empresas significa fortalecer a economia, gerar empregos e aumentar a renda da população. É atuar pelo bem do Brasil.

*Robson Braga de Andrade, presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI)

SANEAMENTO BÁSICO: O MOTOR DO DESENVOLVIMENTO

ESTAÇÃO DE TRATAMENTO - Marco legal abre espaço para solucionar décadas de serviços precários no país -
ESTAÇÃO DE TRATAMENTO – Marco legal abre espaço para solucionar décadas de serviços precários no país – Iano Andrade/CNI/.

O novo marco legal do saneamento básico, sancionado em julho de 2020 e regulamentado cinco meses depois, abre caminho para a aplicação de R$ 498 bilhões de investimentos diretos na expansão das redes de distribuição de água e coleta de esgoto no país até 2033. É o que mostra estudo da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon). É um movimento notável que deu partida a uma mobilização em prol da universalização do atendimento a uma necessidade básica da população e que terá efeito decisivo para a economia.

“Acreditamos que avançar no saneamento básico é tarefa urgente. Os benefícios para a saúde da população e para o setor produtivo são enormes. O saneamento pode se tornar o principal motor do crescimento da infraestrutura no processo de recuperação da economia brasileira”, pontua Mônica Messenberg, diretora de Relações Institucionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

De acordo com ela, a ampliação da cobertura do saneamento levará oportunidades para segmentos da indústria que vendem produtos e prestam serviços para o setor de água e esgoto, como a construção civil, produtos químicos, plástico, máquinas e equipamentos, aço e metalurgia, entre outros.

O sucesso de leilões que já ocorreram demonstra que o modelo de licitações, com a concorrência entre setor privado e público, é o caminho para a universalização do saneamento. O presidente do Conselho de Administração da Abcon, Carlos Henrique Lima, acredita que o setor vive um momento especial, em razão do novo marco e do sucesso dos recentes editais publicados. “Um bom exemplo é a licitação de Maceió, que reuniu já em 2020 os elementos necessários para apontar que estamos no caminho certo. Houve competição limpa e acirrada, com sete grupos privados e públicos, incluindo novos entrantes de outros setores de infraestrutura, que vêm se aproximando desse mercado de saneamento. São todos muito bem-vindos, uma vez que ainda há muito a ser feito ”, disse.

O potencial do setor

O estudo produzido pela Abcon reforça a relevância do saneamento para a retomada do crescimento econômico. Segundo o levantamento, serão necessários R$ 750 bilhões de investimentos para que o país universalize o abastecimento de água e a coleta/tratamento de esgoto nos próximos 13 anos, como prevê o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), sendo R$ 498 bilhões específicos para a ampliação das redes.

Ao longo do tempo, esses contratos de longo prazo tendem a se tornam seguros em termos de receita. Esse é um setor mais resistente a crises econômicas, com exceção de crises hídricas. Mas o maior desafio tem sido a segurança jurídica do setor. O investimento em saneamento vai gerar demanda no setor de construção civil e da indústria de equipamentos, que vão gerar demanda em outros setores como os de brita, pedras e aço.

O trabalho da Abcon destaca que a cada real investido em saneamento para extensão de redes, cerca de 76 centavos irão para a construção civil e 6 centavos para máquinas e equipamentos. O estudo mostra ainda que o setor de saneamento poderá movimentar indiretamente R$ 1,4 trilhão na economia e gerar até 14 milhões de empregos ao longo dos próximos 13 anos.

Para o superintendente da Área de Estruturação de Parcerias de Investimentos do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), Cleverson Aroeira, a instituição terá papel cada vez mais estratégico na modelagem de editais e no financiamento do setor de saneamento. Segundo ele, o projeto desenvolvido para a região metropolitana de Maceió foi iniciado há três anos. “Para levar um projeto desse adiante é preciso de muito comprometimento do governo estadual, que precisou superar obstáculos. Temos de celebrar essa iniciativa de Alagoas, que teve um leilão bem-sucedido e é um caminho a ser perseguido”, afirmou.

A realização leilão da Cedae em duas etapas, em abril e em dezembro do ano passado, é outro exemplo da relevância do setor. “É um projeto muito grande, que envolve quatro concessões, abrangendo mais de 50 municípios, com investimento de R$ 30 bilhões, que o insere entre os maiores leilões de infraestrutura do país”, disse o superintendente do BNDES. Na lista de leilões também estão as companhias dos estados do Acre e Amapá.

O saneamento básico está entre os maiores desafios da infraestrutura nacional e reflete o atraso no setor. Atualmente, 100 milhões de brasileiros vivem em residências que não têm coleta de esgoto. Um levantamento realizado pela CNI aponta que 57% das cidades brasileiras que têm contrato para prestação do serviço de esgotamento sanitário operam em situação irregular e que os índices relacionados às perdas de água vêm crescendo nos últimos anos. Confira a seguir, as principais questões envolvendo o assunto.

GESTÃO E SERVIÇOS DE QUALIDADE - Investimento privado para resolver deficiências públicas -
GESTÃO E SERVIÇOS DE QUALIDADE – Investimento privado para resolver deficiências públicas – Iano Andrade/CNI/.

Os serviços do saneamento básico

Um total de 1 277 cidades brasileiras mantêm contrato para coleta de esgoto, mas não contam com o serviço. Outros 206 municípios mantêm serviços de saneamento, embora suas delegações estejam vencidas e 36 se valem de contratos precários. É o que mostra estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), que calculou os números com base em dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS).

De acordo com o levantamento, 1 519 cidades brasileiras – o que representa 57% das 2 677 que têm delegações para serviços de esgotamento sanitário – se encontram em situação irregular, o que significa contrato vencido, inexistente ou delegação em vigor sem a prestação do serviço. “Em termos práticos, temos uma prestação de serviço sem definição formal de como esse serviço deveria ser prestado, sem qualquer exigência de qualidade ou expansão”, afirma o gerente-executivo de Infraestrutura da CNI, Wagner Cardoso.

As irregularidades contratuais implicam na falta de metas de cobertura para coleta de esgoto e de previsão de investimento em saneamento básico nas cidades afetadas. Hoje, o principal instrumento para prestação de serviços de saneamento é o chamado contrato de programa. Nele, um ente federativo faz a transferência da execução de serviços. No caso do saneamento básico, ele costuma ser celebrado entre o município e a concessionária pública estadual.

A Região Norte concentra a maior parte dos contratos problemáticos de esgotamento sanitário: 90% dos municípios operam de forma irregular. O Nordeste não está muito atrás e tem 80% de contratos irregulares. Na sequência, aparecem o Sul (69%), Centro-Oeste (61%) e Sudeste (14%).

Atraso e desigualdade

O saneamento básico é um desafio monumental para o Brasil. Os dados mais atuais do SNIS, referentes a 2018, mostram que apenas 53,2% da população brasileira tem acesso à coleta de esgoto. Isso significa que cerca de 100 milhões de pessoas não são atendidas por redes de saneamento básico. Os números ainda revelam que, do total do esgoto gerado, nem metade (46,3%) é tratado.

A realidade dificilmente será revertida se o ritmo de investimentos continuar como está. O Plano Nacional de Saneamento Básico prevê a universalização do serviço de coleta de esgoto até 2033. Mas o valor investido em 2018 foi de R$ 13 bilhões, quantia bem inferior à média anual necessária de R$ 23 bilhões para a universalização.

O gerente-executivo de Infraestrutura da CNI avalia que o caminho para mudar o cenário de atraso começa com o marco legal do saneamento básico, que obriga os municípios a realizarem licitações para a prestação dos serviços de saneamento e estabelece a Agência Nacional de Águas (ANA) como a entidade responsável pela regulação do setor de saneamento.

Com o marco, a ANA tem competência para instituir normas de referência para a regulação dos serviços de saneamento básico. Essa alteração traz maior estabilidade regulatória, viabilizando um ambiente de negócios mais atrativo a investidores e uma prestação de serviços mais segura para a população.

Atualmente, há ao menos 52 agências reguladoras de saneamento básico em todo o país, embora 40% das cidades brasileiras não estejam vinculadas a nenhuma delas. “De modo geral, as agências não atendem a requisitos mínimos de uma regulação adequada, como autonomia decisória, independência financeira e quadro técnico capacitado”, diz Wagner Cardoso.

O presidente-executivo do Instituto Trata Brasil, Édison Carlos, afirma que é preciso dar visibilidade ao problema para que haja uma mobilização em prol de melhorias no setor. “O novo marco legal do saneamento básico abre espaço para o setor privado atuar mais nos serviços de saneamento junto com o setor público”, defende. “A aprovação do marco legal foi fundamental para reverter esse sistema muito antigo, com troca de tubulação e expansão do sistema para quem não tem saneamento. Isso é imprescindível para o progresso dos serviços de saneamento no Brasil”, acrescenta.

Desperdício e cladestinidade

Além de 34 milhões de brasileiros não terem água encanada, quase 40% dos recursos hídricos se perdem na rede por desvios clandestinos e infraestrutura deteriorada. Nos últimos anos, diversas regiões brasileiras têm vivenciado graves crises hídricas. Recentemente, São Paulo e Brasília, por exemplo, chegaram a decretar racionamento de água para evitar o desabastecimento. Não bastasse o impacto das mudanças no clima sobre a disponibilidade de recursos hídricos, o Brasil retrocedeu na diminuição de perdas de água.

O índice médio do país chegou a 36,7%, em 2015, mas desde então vem piorando, mostra um levantamento da CNI, com base no SNIS. O último registro, de 2018, mostra que 38,5% da água distribuída pelas companhias de saneamento básico se perderam no meio do caminho por problemas nos canos, deterioração dos equipamentos e desvios no sistema, os chamados “gatos”.

“O nível de perdas tem subido gradativamente desde 2016. Esse retrocesso é resultado nítido da queda no nível de investimentos”, pontua Ilana Ferreira, especialista em Infraestrutura da CNI.

O índice de perdas é um indicador importante para o setor de saneamento, uma vez que reflete as condições de operação das companhias que distribuem água. O aumento no volume de água perdida antes da chegada às residências significa que a situação das redes tem piorado, o que remete aos investimentos insuficientes para manutenção do sistema.

Minimizar as perdas de água é uma condição essencial para que as companhias consigam investir na ampliação das redes. É o que fez o grupo privado Águas do Brasil, que opera a concessionária de água e esgoto de Niterói (RJ). Em duas décadas, reduziu as perdas de água, que superavam a casa dos 50%, para o atual índice de 16% a 18%.

“Melhoramos os índices com correção de todo o parque, com novos hidrômetros. Havia fraudes de toda a ordem, os chamados gatos. Substituímos as redes, o que exigiu investimento e gestão”, destaca o presidente do Conselho de Administração do Grupo Águas do Brasil, Carlos Henrique Lima.

“Em dois anos, colocamos 150 000 pessoas que não pagavam conta para dentro do sistema. Como reduzimos as perdas, sobrou água no sistema para abastecer as casas dessas pessoas. Em 1999, comprávamos 1,8 metros cúbicos por segundo de água da Cedae para distribuir à população de Niterói. Hoje, a cidade tem 550 000 pessoas, 200 000 pessoas a mais que 21 anos atrás, e continuo comprando a mesma quantidade de água. Muita gente desperdiçava água porque não pagava conta. Agora, 100% da população é atendida por água”, acrescenta Carlos Henrique.

A cidade de Limeira (SP) também reverteu índices que superavam a média nacional de desperdício de água depois que os serviços de abastecimento de água e a coleta e tratamento de esgoto foram concedidos à iniciativa privada.

Operada pela BRK Ambiental, a companhia Água Limeira registra, atualmente, índice de apenas 15,5% de perdas de água, números semelhantes aos melhores exemplos da Europa e próximos aos do Japão.

INSTALAÇÃO DE PROCESSAMENTO SANITÁRIO - Apenas 53% dos brasileiros tem coleta de esgotos -
INSTALAÇÃO DE PROCESSAMENTO SANITÁRIO – Apenas 53% dos brasileiros tem coleta de esgotos – Iano Andrade/CNI/.

Abastecimento estagnado

Na contramão da meta brasileira de universalizar o abastecimento de água até 2033, o país não tem conseguido aumentar o acesso da população à água tratada. Levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que o índice de abastecimento de água está estagnado.

Em 2014, o percentual de brasileiros atendidos era de 83%. Em 2018, 83,6% da população tinham acesso ao abastecimento de água. O dado mais novo, atualizado no começo deste ano, se refere a 2018 e mostra que mais de 34 milhões de brasileiros ainda não têm acesso à água encanada.

A especialista em Infraestrutura da CNI Ilana Ferreira considera que a ampliação de investimentos e o consequente aumento da cobertura por redes de água depende da abertura do mercado para concorrência. Nesse sentido, ela avalia como imprescindível o marco legal do saneamento básico.

O caminho para a universalização dos serviços de coleta de esgoto e abastecimento de água não passa apenas pelo aumento de investimentos no setor mais atrasado da infraestrutura nacional. Especialistas e empresários da área de saneamento básico consideram a ampliação do aporte de recursos fundamental, mas enumeram três outros fatores como imprescindíveis: bons projetos, capacidade de gestão e eficiência na operação dos serviços.

A BRK Ambiental, com uma base de operação em mais de 100 municípios de 12 estados, avalia que o marco legal abriu caminho para mais investimentos no setor, por estabelecer medidas que darão segurança jurídica ao investidor e garantias para a população de cumprimento de metas para ampliação de redes de serviços de saneamento. “Não podemos conviver com a incerteza em relação ao cumprimento dos contratos. É impensável esse modelo no qual há mudança da regra do jogo no meio da competição, como mudar regra da tarifa no meio do contrato”, afirma a presidente da BRK Ambiental, Teresa Vernaglia.

A abertura do mercado se mostra o único caminho para que os investimentos no setor sejam ampliados. Segundo a executiva da BRK Ambiental, há muitos investidores interessados no saneamento básico, que só começarão a operar quando houver regulação adequada. “Não existe hoje no setor público, em qualquer esfera, companhia com capacidade de fazer esse investimento necessário para a universalização. O setor privado tem. E não falta recurso para investimento em saneamento, o que falta são projetos com atratividade e a segurança jurídica no momento que esse contrato entra em vigor”, pontua.

Operadas pela BRK, as companhias de saneamento de Limeira (SP) e Uruguaiana (RS) deram saltos enormes nos índices de coleta e tratamento de esgoto, assim como de abastecimento de água. Na cidade gaúcha, por exemplo, desde que iniciou suas operações há 8 anos, a concessionária ampliou o atendimento de esgoto de 9% para 100% e reduziu o índice de diarreia de 3.002, em 2012, para 106, em 2018.

Melhorias na gestão

Na avaliação da CNI, a exigência da comprovação da capacidade econômico-financeira do prestador será um requisito para que o titular do serviço de saneamento e a população atendida tenham segurança quanto aos compromissos de investimento do operador escolhido. Esse dispositivo tende a elevar o nível qualitativo dos operadores do setor e a reduzir o risco da atuação de agentes aventureiros.

“Precisamos de mais investimento, mas associado a isso é necessária uma melhoria na prestação do serviço. Despejar muito dinheiro e fazer muita obra é fundamental, mas não garante que a população vai ter acesso a um serviço de qualidade. Precisamos embarcar tecnologia e ter eficiência na gestão”, diz Percy Soares Neto, diretor-executivo da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon).

“O setor público não tem como pegar dinheiro de investimento público nem do governo federal muito menos de banco privado. Já o setor privado não tem as mesmas amarras. Há grandes players internacionais querendo investir em saneamento no Brasil, além dos grupos que já estão aqui no setor privado”, afirma.

“Acreditamos que o setor privado sozinho não vai resolver o problema, até porque 94% dos municípios estão sendo operados por empresas públicas. Mas a parceria entre o setor público e o privado pode endereçar bons resultados para o saneamento nas próximas duas décadas, que é o prazo que a gente estima que o problema pode ser solucionado”, diz Édison Carlos, do Instituto Trata Brasil.

ENERGIA: UMA CONTA ALTA DEMAIS

REDE DE TRANSMISSÃO DE ENERGIA - Alto custo para as empresas acaba onerando preços dos produtos -
REDE DE TRANSMISSÃO DE ENERGIA – Alto custo para as empresas acaba onerando preços dos produtos – ./Shutterstock

O peso da energia sobre a indústria é cada vez mais alto e impacta diretamente no custo do produto vendido para o consumidor. Levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que os principais fatores responsáveis pela elevada tarifa da energia elétrica no país são os 16 encargos e taxas setoriais incorporados à conta de luz, que têm impacto de R$ 33,1 bilhões no orçamento de 2020. Os caminhos para reduzir o preço da energia para a indústria são alvo de debates entre empresários e entidade setoriais, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI).

“O gás natural e a energia elétrica são insumos decisivos para a indústria brasileira. Suas disponibilidades e custos são determinantes para a competitividade do Brasil. Os diversos problemas enfrentados ao longo dos últimos anos e custos crescentes para o consumidor evidenciam a necessidade de reformas”, afirma Robson Andrade, presidente da CNI.

Segundo levantamento da entidade, nove dos 16 encargos estão incluídos na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), fonte de financiamento de diferentes subsídios que incidem sobre a conta de luz, como o Programa Luz para Todos, a Tarifa Social de Energia Elétrica (TSEE) e a Conta de Consumo de Combustíveis (CCC).

O orçamento para os encargos que incidem nas tarifas de energia em 2020 totaliza R$ 33,1 bilhões, dos quais R$ 22 bilhões estão destinados às despesas da CDE. Na avaliação da CNI, esses penduricalhos não são sustentáveis. Os encargos se tornaram o principal vetor do aumento persistente das contas de luz no Brasil.

A CNI defende que as políticas de subsídio dos governos sejam discutidas no Orçamento, para que não se tornem subsídios eternos incorporados à conta de energia. Os dados do levantamento mostram que o país tem hoje um peso de tributos e encargos que chegam a 38% do custo tarifário total da energia elétrica.

O presidente-executivo da Associação Brasileira do Alumínio (Abal), Milton Rego, defende que o sistema elétrico seja racionalizado no país e que as informações sobre a conta de luz sejam mais transparentes. Ele comenta que o custo da energia tem tirado a competitividade do alumínio brasileiro.

Para exemplificar, Milton menciona que o peso da energia elétrica na produção de alumínios chega de 60% no Brasil enquanto no mundo varia, em média, entre 30% e 35%.

“O Brasil teve que fechar várias fábricas de alumínio e hoje produz metade do que fazia em 2008, por conta única e exclusivamente da energia elétrica, que teve aumento de tarifas tanto em reais quanto em dólar”, pontua o dirigente da Abal. “A gente sangra na competitividade por causa do preço da energia. Não à toa o Brasil é o país da energia barata e da conta cara”, acrescenta.

A energia é um dos principais insumos da indústria brasileira. A segurança do fornecimento e o seu custo são determinantes fundamentais da competitividade da indústria. O sistema elétrico brasileiro já foi considerado um dos mais eficientes do mundo. Os grandes reservatórios hidrelétricos garantiam a segurança do sistema e o baixo custo da eletricidade.

Essa situação representava uma vantagem competitiva para a economia brasileira e para a indústria nacional. No entanto, desde o começo da década de 2000 o Brasil passou a integrar a lista de países com elevadas tarifas de energia elétrica. Isto foi resultado não apenas da elevação dos custos setoriais, mas, também, do impacto crescente dos impostos e encargos setoriais sobre as tarifas.

O custo de energia, que no passado estimulou a competitividade da indústria brasileira, hoje é visto como uma barreira para a sua expansão. O caso do gás natural é emblemático. Aumentos nas tarifas de gás, que recentemente chegaram a ser anunciadas na ordem de 36% (em média), produzem efeito devastador nos segmentos da indústria brasileira que utilizam o insumo.

Desafios e oportunidades do setor de energia no Brasil andam lado a lado. A conhecida abundância de recursos naturais do país, aliada às perspectivas de forte aumento da oferta de gás natural e as mudanças tecnológicas no setor elétrico representam uma grande oportunidade. Porém, o excesso de intervenção governamental, problemas regulatórios, monopólios e insegurança jurídica têm limitado esse aproveitamento. Uma ação estratégica e coordenada é necessária para que as oportunidades no setor de energia não sejam perdidas.

FORNECIMENTO DE ENERGIA - Encargos nas tarifas superaram R$ 33 bilhões no ano de 2020 -
FORNECIMENTO DE ENERGIA – Encargos nas tarifas superaram R$ 33 bilhões no ano de 2020 – CNI/Divulgação

Empenhado na aprovação do Projeto de Lei 414/2021, que está em tramitação na Câmara dos Deputados, o secretário de Energia Elétrica do Ministério de Minas e Energia (MME), Rodrigo Limp, defende o apoio do setor produtivo à proposta que moderniza o setor elétrico.

O PL 414 prevê a portabilidade da conta de luz entre as distribuidoras, a partir da alteração do marco regulatório do setor elétrico, para criar um mercado livre de energia no país. Para Limp, é preciso haver maior abertura desse mercado, que hoje opera muito abaixo de sua capacidade.

Limp aponta medidas que poderão modernizar o setor elétrico, entre as quais o processo de descarbonização da matriz (transição energética), o aumento da segurança e eficiência alocativa, a ampliação do poder de escolha do consumidor, o fomento à concorrência, a racionalização de subsídios e a abertura às inovações tecnológicas.

Em sua visão, os passos da modernização do setor incluem o aprimoramento na formação de preços, a lei do gás, o novo marco regulatório do setor elétrico e a expansão da geração distribuída. Outras ações destacadas pelo secretário são o fim da judicialização do risco hidrológico e o retorno da liquidez do mercado de curto prazo, a partir de mudança de normas que levarão segurança jurídica para investidores.

Limp também ressalta a importância da redução de subsídios no setor elétrico, com medidas como a extinção gradual dos descontos para consumidores rurais e do fim de descontos para a geração de energia das fontes incentivadas. Ele defendeu também a desestatização da Eletrobras. Para o secretário, a edição da Medida Provisória 1.031/2021 é um passo importante para a venda da estatal, uma vez que permite o início dos estudos para fins de privatizar a empresa.

A MP autoriza o início do procedimento necessário para viabilizar futura troca de controle da Eletrobras e de suas subsidiárias, com exceção da Eletronuclear e de Itaipu Binacional.

Para o gerente-executivo de Infraestrutura da CNI, Wagner Cardoso, a privatização da Eletrobras é imprescindível para a retomada do crescimento da área de energia elétrica no Brasil e para a geração de novos negócios no país. Ele avalia que a gestão privada da empresa proporcionará a redução de custos e aumentará a eficiência do setor.

“A desestatização será um desafio para o aperfeiçoamento da regulação e da governança da empresa. É uma excelente oportunidade para a introdução de mecanismos competitivos, aprimoramento da gestão e a conseguinte mitigação de riscos”, afirmou Wagner Cardoso.

GÁS: UM MARCO PARA COMPETITIVIDADE

UNIDADE DE PROCESSAMENTO - insumo energético mais limpo e mais barato para a indústria brasileira -
UNIDADE DE PROCESSAMENTO – insumo energético mais limpo e mais barato para a indústria brasileira – José Paulo Lacerda/CNI/.

A Nova Lei do Gás, medida legislativa que modernizou o marco legal do setor,foi sancionada pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, no dia 8 de abril do ano passado e regulamentada dois meses depois, mas ainda há muito a ser feito para que tenha efetividade e atinja o propósito de atrair investimentos para o setor. Um mercado de gás mais moderno e competitivo impulsionará investimentos e terá potencial para reduzir o preço do insumo para a indústria e para o consumidor final.

“A abertura do mercado à competição e a queda do preço do gás natural de forma consistente são cruciais para o país superar a grave crise provocada pela Covid-19”, afirma Robson Andrade, presidente da CNI.“O país terá agora melhores condições para atrair investimentos, enfrentar a acirrada concorrência externa e criar empregos no pós-pandemia”, acrescenta.

Desde 2013, a CNI vem apoiando de maneira sistemática a aprovação do novo marco legal, fundamental para o desenvolvimento do mercado de gás natural, e que pode inaugurar um novo ciclo de investimentos para a oferta de um insumo energético mais limpo e barato para a indústria nacional.

O diretor do Departamento de Gás Natural do Ministério de Minas e Energia (MME), Aldo Barroso Júnior, ressalta o papel estratégico da indústria para o mercado de gás e observou que a aprovação de leis e normas estaduais serão fundamentais para a abertura do setor e o aumento da concorrência, fatores imprescindíveis para a melhora do preço do insumo. Segundo ele, o governo agora se empenha em estimular as boas práticas regulatórias para os estados.

“A indústria é fundamental nesse processo. É importante que ela possa negociar gás e acessar esse mercado. Sabemos que a abertura do mercado não acontece com um virar de chaves, mas é um processo que leva alguns anos e não envolve apenas um único degrau, mas vários”, destacou o diretor do MME. “Queremos chegar ao momento de termos um hub para acessar uma gama de fornecedores diferentes. Essa é a meta e estamos caminhando a passos largos para isso”, completou.

Os pontos principais para se garantir a competitividade do setor são a classificação de gasodutos, com regras claras para transporte e distribuição do insumo, além da criação de mecanismos para harmonização de regulações federais e estaduais, e o detalhamento de autorizações para a construção de novos gasodutos.

“Há soluções regulatórias para serem implementadas, baseadas inclusive em outros países. Precisamos ajudar os estados a construir os caminhos para que tenham uma melhor regulação, para que no final o consumidor consiga acessar o mercado. A ideia é que o transporte de gás natural vire um ‘local’ onde todos os vendedores e compradores se encontrem para comprar e vender gás de forma líquida, com transparência e concorrência”, pontuou Aldo Júnior.

O marco legal do gás natural foi uma das treze propostas consideradas prioritárias na Agenda Legislativa da Industria 2020, lançada o pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Diante da grave crise provocada pela pandemia do coronavírus, o projeto se tornou ainda mais importante para o país superar os desafios da retomada do crescimento da economia. Com a abertura do mercado de gás e a redução das tarifas, o país passou a ter melhores condições para atrair novos investimentos, melhorar a competitividade do produto nacional e gerar empregos.

CENTRO DE DISTRIBUIÇÃO - Investimentos no setor de gás podem chegar a R$ 150 bilhões até 2030 -
CENTRO DE DISTRIBUIÇÃO – Investimentos no setor de gás podem chegar a R$ 150 bilhões até 2030 – CNI/Divulgação

Os preços mais competitivos de gás natural implicam em uma redução dos custos de produção e ampliação do consumo de gás pela indústria brasileira. O gás competitivo representa um fator extremamente relevante para atração de investimentos. Considerando a crise que o país atravessa, tornou-se ainda mais urgente enfrentar o debate sobre a abertura do mercado de gás, com a modernização das regras do setor, que ainda hoje enfrenta monopólios.

Na avaliação da CNI, estamos diante de uma grande oportunidade com as projeções de aumento de oferta do gás nos próximos anos e quebra do monopólio da Petrobras. Não há dúvida em relação ao tamanho do desafio, mas é certo que o país precisa caminhar na direção de um mercado mais aberto e competitivo, com preços de gás atrativos.

A CNI vem chamando atenção para a importância de o Brasil contar com um novo e moderno marco legal como forma de atrair os investimentos necessários para a abertura do mercado de gás e redução dos preços do insumo.

A fim de colaborar com o Congresso Nacional e os governos federal e estadual na construção de regras que contribuam para a modernização e abertura do mercado de gás, a CNI tem produzido estudos que mostram o potencial impacto econômico dessa abertura ao mesmo tempo em que tem apresentado propostas para aumento da segurança jurídica e abertura do mercado, condições fundamentais para se fazer frente ao volume necessário de investimentos para a modernização e ampliação do setor.

Estudo elaborado pela CNI avaliou o potencial impacto econômico e energético do gás para o consumidor industrial energointensivo – categoria que inclui as indústrias química, siderúrgica, pelotização de minério de ferro, alumínio, cerâmica, vidro e papel e celulose, que, juntas, utilizam 80% do gás consumido pela empresas. O trabalho mostra o processo de perda da competitividade da indústria nos últimos anos, sendo o elevado preço do gás um dos fatores que mais contribuiu para a deterioração da competitividade.

Dados da CNI apontam que a indústria brasileira tem potencial para se tornar uma grande consumidora de gás natural, com possibilidade de triplicar a demanda até 2030 em um cenário de queda dos preços de gás pela metade. Em relação aos investimentos potenciais, o estudo detalha que os números poderiam chegar a R$ 150 bilhões em 2030, com preços de gás competitivos.

O documento destaca também que o gás mais barato poderá substituir outras fontes, como o carvão, óleo combustível e GLP, contribuindo para redução de emissões por ser o combustível fóssil menos poluente. Além disso, o gás natural é o principal energético da transição para uma economia de baixo carbono, pode ser usada para a geração de energia elétrica, produção de calor, como matéria-prima ou combustível em veículos.

O gás pode representar de 20% a 40% do custo de produção, dependendo da indústria. No setor químico, a participação é muito diversificada, com custo médio de 30%. Em diversos segmentos, o gás é a principal matéria-prima e insumo energético. Como matéria-prima para a fabricação, por exemplo, de amônia e metanol, os custos com gás podem chegar a representar entre 70% e 80%. Amônia é a matéria-prima usada na fabricação de fertilizantes agrícolas, fibras e plásticos e produtos de limpeza. O metanol é um insumo muito usado na indústria química como solvente e na fabricação de biodiesel.

Existe um grande potencial para a elevação do uso do gás natural em setores em que o insumo tem participação pequena, como siderurgia, alumínio, papel e celulose e mineração, por meio de substituição de outras fontes de energia de pior qualidade técnica e ambiental. Com o gás mais caro e menos competitivo, segmentos da cadeia produtiva acabam optando pela importação dos produtos acabados, ou mesmo pela terceirização da produção para outros países.

TRANSPORTES: APOSTA NAS REFORMAS E CONCESSÕES

OBRA EM RODOVIA - Investimentos federais em transportes chegaram, em 2020, ao pior patamar desde 2005 -
OBRA EM RODOVIA – Investimentos federais em transportes chegaram, em 2020, ao pior patamar desde 2005 – José Paulo Lacerda/CNI/.

O total de investimentos federais na área de transportes em 2020 alcançou R$ 8,3 bilhões, valor 4% inferior ao investido em 2019 e o menor montante desde 2005. Os dados são referentes ao total de recursos investidos pelo Ministério da Infraestrutura, Infraero e pelas sete companhias docas federais, estatais responsáveis pela administração de parte dos portos públicos do país.

Os valores são corrigidos pelo IPCA e fazem parte de levantamento realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) com informações do Sistema Integrado de Administração Financeira do governo federal (SIAFI), compilados pela ONG Contas Abertas.

Os últimos dez anos foram marcados por uma redução progressiva da capacidade de investimento do setor público, reflexo da crise fiscal e econômica que o país ainda enfrenta. Após o pico de investimentos em 2010, os recursos federais liberados para investimentos no setor de transportes sofreram reduções sistemáticas.

Em 2010, o montante autorizado para investimentos do Ministério dos Transportes, Infraero e companhias docas alcançou R$ 31,4 bilhões, enquanto os investimentos foram de R$ 24,3 bilhões, em valores atualizados pelo IPCA. Em 2020, o orçamento autorizado para investimentos foi de R$ 9,8 bilhões, valor 68% inferior ao de 2010.

“Vale destacar que, nos últimos dois anos, o Ministério da Infraestrutura executou praticamente a totalidade dos recursos autorizados para investimentos, resultando em mais de 90 obras entregues apenas em 2020, ano ainda mais desafiador ao andamento dos empreendimentos em função da pandemia”, destaca o gerente-executivo de Infraestrutura da CNI, Wagner Cardoso.

Como resultado dessa execução, o volume de investimentos do ministério foi de R$ 7,8 bilhões, o que representa 92% do seu orçamento autorizado em 2020. A Infraero, por sua vez, investiu R$ 443,7 milhões (21% do autorizado) e o conjunto de companhias docas investiu apenas R$ 40,8 milhões (7% do total autorizado).

Na avaliação da CNI, a alavancagem do investimento em transportes depende invariavelmente da agenda de reformas do Estado brasileiro, especialmente a tributária e a administrativa.

No Congresso Nacional tramitam também projetos de lei que, se aprovados, vão permitir o aumento dos recursos aplicados nos diferentes setores de infraestrutura. É o caso do PLS 261/2018, que cria o regime de autorização para ferrovias.

Em janeiro, o presidente Jair Bolsonaro sancionou a Lei L 4.199/2020, que institui o Programa de Estímulo à Cabotagem – BR do Mar. que, entre outros pontos, flexibiliza o afretamento de embarcações estrangeiras para serem usadas no transporte de cargas na cabotagem brasileira.

A Lei nº 14.301 reúne série de medidas que visam aumentar de 11% para 30% a participação desse meio de transporte na matriz logística nacional, ampliando o volume de contêineres transportados para 2 milhões de TEUs – unidade equivalente a 20 pés – já em 2022, além de alavancar em 40% a capacidade da frota marítima dedicada à cabotagem para os próximos três anos.

Um dos grandes avanços será a possibilidade de incrementar a oferta e a qualidade do transporte por cabotagem, estimular a concorrência, incentivar a competitividade e aumentar a disponibilidade da frota dedicada à cabotagem no território nacional. Com mais concorrência na prestação do serviço, os custos de transportes de cargas entre os portos do país tendem a cair. Ações voltadas à formação, à capacitação e à qualificação dos trabalhadores do setor também estão previstas.

RODOVIA - Expectativa pelos leilões de concessão e transferência da gestão para a iniciativa privada -
RODOVIA – Expectativa pelos leilões de concessão e transferência da gestão para a iniciativa privada – FG Trade/Getty Images

Em uma realidade de intensa restrição fiscal, é essencial para o país se contrapor às falhas de Estado com uma maior participação da iniciativa privada, tanto nos investimentos, como na gestão da infraestrutura de transportes.

A agenda de transferência de ativos ao setor privado tem evoluído bem nos últimos anos e, até 2022, o governo prevê importantes leilões para o setor de transportes, seja no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), seja em outras esferas de planejamento (Programa Pró-Brasil).

É o caso dos leilões de aeroportos da Infraero previstos para as próximas rodadas de licitação (22 já foram leiloados); e da transferência ao setor privado de sete companhias docas federais, a ser iniciada com a desestatização da Cia. Docas do Espírito Santo (CODESA).

“A continuidade e aprofundamento dos processos de concessão e de privatização adotados até o momento são questões chave para intensificar o processo de recuperação e auxiliar na pavimentação de um novo ciclo de crescimento com base na expansão do investimento”, enfatiza o especialista em Infraestrutura da CNI, Matheus de Castro.

“A ampliação e modernização dos investimentos em infraestrutura no Brasil tem um longo caminho pela frente. A solução dos atuais gargalos passa obrigatoriamente pela expansão da participação privada nos investimentos e na gestão da infraestrutura, que, por sua vez, dependem de mudanças nos marcos legais e regulatórios”, acrescenta.

PORTOS: COMBATE À INEFICIÊNCIA

OPERAÇÃO PORTUÁRIA - Apenas 30% dos recursos destinados pela União em dezenove anos foram executados -
OPERAÇÃO PORTUÁRIA – Apenas 30% dos recursos destinados pela União em dezenove anos foram executados – José Paulo Lacerda/CNI/.

Depois do fechamento, em setembro de 2020, da Companhia Docas do Maranhão (Codomar), que não administrava nenhum porto há 10 anos, mas que, segundo dados do Ministério da Infraestrutura tinha gasto anual superior a R$ 8 milhões para os cofres da União, o governo federal deve dar prioridade à desestatização de outras sete docas. Todas dessa lista têm operação regular, mas vêm se mostrando pouco eficientes. Com o apoio do setor produtivo, o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) prevê desestatizar as cias docas. A primeira deve ser a Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), cuja transferência do controle e a concessão dos portos de Vitória e Barra do Riacho está previsto para 25 de março, na B3, em São Paulo.

Levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), com base em dados oficiais, mostra que menos de 30% dos recursos destinados pela União para investimentos nos portos foram executados entre os anos de 2000 e 2019. Um total de R$ 14,6 bilhões deixou de ser investido no período. No ano passado, o investimento das cias docas foi de R$ 59 milhões, o menor já registrado desde 2003, com execução de apenas 10,5% dos R$ 557 milhões disponíveis no orçamento.

“A capacidade gerencial dessas administrações públicas federais não é compatível para o enfrentamento dos elevados passivos trabalhistas e as transformações necessárias para elevar a eficiência dos portos públicos brasileiros a padrões internacionais”, afirma o gerente-executivo de Infraestrutura da CNI, Wagner Cardoso.

Além do leilão da Codesa também estão em estudo pelo governo federal a desestatização dos portos de São Sebastião, Itajaí e Santos. “Os portos apresentam uma estrutura similar à de um ‘shopping center’, onde a administração portuária é o síndico do shopping e as lojas os terminais. Hoje, todos os terminais são operados pela iniciativa privada, mas as cias docas, que funcionam como o síndico, são entes públicos, com problemas e ineficiências inerentes às empresas estatais”, explica Wagner Cardoso. O Brasil tem 37 portos públicos. Atualmente, a movimentação de carga nos terminais é realizada somente pelo setor privado. Estatais têm custo anual de R$ 30 bilhões por ano.

O Brasil tem 200 estatais de diferentes setores, incluindo 46 estatais sob controle direto da União e 154 subsidiárias. Essas empresas somam um quadro de pessoal efetivo de 476 600 funcionários. Só as despesas de pessoal com as Estatais Federais não dependentes do Tesouro somam R$ 30,5 bilhões por ano, conforme os dados mais recentes, referentes a 2019. Em 2000, as despesas com pessoal eram de R$ 20,2 bilhões, em valores atualizados para 2019.

Desde 2016, 28 estatais federais foram extintas. Na lista de próximas privatizações previstas pelo PPI estão empresas como a Infraero, Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), Cia Docas do Espírito Santo (Codesa), Eletrobras, entre outras.

TERMINAL DE CONTÊINERES - instalações e índices de eficiência inferiores ao padrão internacional -
TERMINAL DE CONTÊINERES – instalações e índices de eficiência inferiores ao padrão internacional – Miguel Ângelo/CNI/.

De acordo com os dados da CNI, das estatais federais com controle direto da União, 12 são da área de transporte; seis da área de energia, óleo, gás e energia nuclear; e de três do setor de telecomunicações. Entre as estatais de transporte, estão a Valec, a Empresa de Planejamento e Logística S.A. (EPL) e as Cias Docas da Bahia, Ceará, Espírito Santo, São Paulo, Pará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte.

Imprescindíveis para o comércio exterior brasileiro, os portos e seus acessos carecem de melhorias para que o país ganhe competitividade no cenário internacional. A prioridade número um é a transferência para o setor privado da administração das companhias docas, estatais responsáveis pela gestão dos portos.

A solução para o setor portuário passa por um caminho semelhante ao que vem acontecendo com os aeroportos, que gradualmente vêm sendo concedidos à iniciativa privada. Outras propostas da CNI para o segmento são a melhoria das condições de acesso marítimo aos portos, por meio de dragagem, a priorização das obras de acessos terrestres e a suspensão imediata da cobrança pelo escaneamento dos contêineres.

Embora a implantação do novo modelo portuário definido pela reforma de 2013 tenha resultado em uma significativa melhora e expansão desse sistema, os portos brasileiros ainda apresentam baixo nível de eficiência, custos elevados e reduzido volume de investimento. Essas deficiências podem ser atribuídas em boa medida à atuação das companhias docas na administração dos portos.

Os investimentos nos portos públicos brasileiros somaram, em 2017, apenas R$ 174,5 milhões, o menor nível dos últimos 14 anos. Os recursos aplicados representam apenas 26% da dotação do ano autorizada (de R$ 660 milhões) para investimentos nas cias docas, estatais marcadas por graves problemas de gestão empresarial e por interferências políticas.

Outro importante segmento da infraestrutura brasileira, o setor aeroportuário apresentava um baixo nível de eficiência e execução insuficiente de investimentos, motivo pelo qual o governo decidiu pela transferência dos aeroportos públicos ao setor privado. No entanto, para efeito de comparação, a Infraero investiu em média 67% da dotação autorizada entre 2000 e 2017 (aproximadamente R$ 1 bilhão por ano). No mesmo período, as cias docas investiram apenas 28% (R$ 294 milhões por ano), o que demonstra a urgência de se adotar um programa de concessão também para os portos públicos.

A transferência ao setor privado solucionaria o problema do acesso marítimo aos portos brasileiros. Nem as companhias docas nem a Secretaria Especial de Portos (SEP), hoje vinculada ao Ministério dos Transportes,Portos e Aviação Civil, conseguiram equacionar o problema da dragagem nos portos, resultando em graves prejuízos ao setor. Em caso de transferência da administração do porto organizado para investidores privados, será possível atribuir contratualmente ao concessionário a responsabilidade e o ônus da contratação do serviço de dragagem.

CARREGAMENTO DE NAVIOS - Investimento nos portos brasileiros foi o menor em 14 anos -
CARREGAMENTO DE NAVIOS – Investimento nos portos brasileiros foi o menor em 14 anos – Ricardo Botelho/MInfra/.

O Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do governo federal já deu o primeiro passo no sentido de privatizar cias docas, ao incluir, no ano passado, a desestatização da Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa) em sua carteira de projetos. Segundo o estudo da CNI, a escolha da Codesa como experiência pioneira decorre de ser a única, entre as oito cias docas, sem significativo passivo financeiro e trabalhista, o que permite atrair investidores sem um longo trabalho prévio de saneamento.

No entanto, o processo acabou interrompido em decorrência de manifestação do Ministério dos Transportes, que recomendou o abandono da proposta de privatização da Codesa e propôs a concessão apenas de Barra do Riacho, em Aracruz (ES). A CNI defendeu que o PPI retomasse a proposta e acelerasse a análise de concessão dos demais portos.

O estudo recomenda também que o setor público dê agilidade ao processo de arrendamento dos portos organizados. Atualmente, 55% dos terminais arrendados estão com contratos vencidos. A sugestão é que o próximo governo priorize a conclusão das definições das poligonais dos portos e enfrente a questão da judicialização em relação a terminais que estão com contratos vencidos, mas que continuam com a gestão em razão de liminares. Esta situação gera insegurança jurídica e inviabiliza a realização de novos leilões.

Outro problema que tem atingido exportadores e importadores e interferido na competitividade do produto nacional é a insistência dos terminais em cobrarem tarifas para o escaneamento de contêineres, em que a arrecadação supera – e muito – o valor do serviço prestado. A CNI verificou que já uma duplicidade de cobrança para um mesmo serviço, uma vez que a chamada “inspeção não-invasiva” já é paga dentro da cesta de serviços correlatos recolhida pelos terminais portuários.

Levantamento da CNI mostra que há variedade de preços tabelados para um serviço que requer o mesmo equipamento em todos os terminais. Esses preços variam entre R$ 200 e R$ 1.000 (descartados quatro casos, com preços inferiores a R$ 100 para a importação), com valores médios de R$ 412, na importação, e R$ 379, na exportação. Embora esses valores correspondam a preços tetos sujeitos a negociação, são indicativos do grau de liberdade que os terminais se concedem. A CNI aguarda decisão da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) sobre o tema, pois considera ilegal a forma de cobrança das tarifas.

FERROVIAS: O PAÍS ENTRA NOS TRILHOS

RETOMADA - Marco aprovado em dezembro de 2021 amplia a participação do trem na matriz de transporte nacional -
RETOMADA – Marco aprovado em dezembro de 2021 amplia a participação do trem na matriz de transporte nacional – ./Shutterstock

O Congresso aprovou no fim de 2021 o novo marco legal das ferrovias, que permite a realização de outorgas de autorização para o funcionamento de ferrovias, especialmente em trechos curtos e conectados à malha atual. A aprovação do marco legal das ferrovias pela Câmara dos Deputados é um passo fundamental para a modernização do setor ferroviário no país. O projeto cria o regime de autorização para a gestão de ferrovias pelo setor privado e permite a exploração de trechos ociosos por novos grupos.

O presidente da CNI, Robson Braga de Andrade, considera que o novo marco regulatório para o setor ferroviário atrairá investimentos para aumentar a oferta de infraestrutura, reduzir os custos logísticos e promover a concorrência no setor ferroviário. “O marco legal das ferrovias vai alavancar a participação do modal ferroviário em nossa matriz de transporte, que, excluindo-se o minério de ferro, é de apenas 4%”, afirma Robson Andrade. “Este é um importante passo para que o transporte ferroviário de cargas cresça no país e para que trechos ociosos da atual malha concedida possam ser transferidos para operadores em regime de autorização”, acrescenta o presidente da CNI.

A principal novidade regulatória são as regras do procedimento de outorga em regime de autorização para a construção, operação e exploração de trechos ociosos ou abandonados, viabilizando o surgimento de serviços dedicados em curtas e médias distâncias (conhecidos como shortlines).

Esta possibilidade de exploração por autorização, de forma similar ao que ocorre com os terminais portuários privados, é fundamental para a expansão e o melhor aproveitamento de malha ferroviária nacional. A operação das shortlines oferecer a perspectiva de estímulo aos investimentos, à integração e à utilização da malha. Nos Estados Unidos, existem 550 trechos de shortlines, que somam 80 000 quilômetros de extensão ou quase 30% da rede do país.

O Brasil tem cerca de 30 000 quilômetros de ferrovias, mas 30% dessa extensão encontra-se ociosa. Existem, no entanto, alguns corredores ferroviários que apresentam altos níveis de utilização e padrões internacionais de eficiência. São por esses trechos economicamente rentáveis aos concessionários atuais que transitam a maior parte das cerca de 500 milhões de toneladas movimentadas anualmente na malha, em sua maioria minério de ferro (73% do total) e soja em grãos ou farelo (7% do total).

Entre os principais avanços do novo marco legal das ferrovias estão a criação de regras para o compartilhamento da infraestrutura de ferrovias e a viabilização de pequenos trechos ferroviários, a partir de outorgas de autorização ao operador privado.

Com a sanção do novo Marco Legal das Ferrovias, o programa Pro Trilhos, que instaurou no ano passado o instituto da outorga por autorização para o setor ferroviário, alcançou 64 requerimentos – 60 pedidos para instalação de linhas férreas e outros quatro para pátios ferroviários. Com isso, ultrapassou R$ 180 bilhões em investimentos projetados, que representam acréscimo de 15 mil quilômetros à malha ferroviária implantada no país.

As propostas reunidas no Pro Trilhos foram protocoladas por 22 diferentes empresas e têm 16 unidades da Federação como origem e destino. Os projetos contemplam áreas nos estádios Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Pernambuco, Piauí, Bahia, Tocantins, Pará e Roraima.

A marca alcançada hoje pelo Pro Trilhos representa 50% de toda a malha ferroviária nacional, que atualmente é de cerca de 30 mil km. Os investimentos privados para execução das novas ferrovias autorizadas somam 23 vezes o orçamento de todo o Ministério da Infraestrutura em 2021, que cuida não só das ferrovias, mas de todos os ativos de infraestrutura de transportes federais, incluindo portos, aeroportos, rodovias e hidrovias.

AEROPORTOS: UM MODELO DE SUCESSO

AVIÃO NA PISTA - Privatização melhorou a qualidade dos serviços prestados às empresas e aos passageiros -
AVIÃO NA PISTA – Privatização melhorou a qualidade dos serviços prestados às empresas e aos passageiros – Miguel Ângelo/CNI/.

A falta de investimentos levou os aeroportos brasileiros a operarem por anos no limite da capacidade e, em alguns casos, próximos ao colapso. Com a escolha do Brasil como sede da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016, o poder público não teve outra alternativa senão abrir a exploração dos terminais aeroportuários ao capital privado, iniciativa que transformou o setor de aviação civil e tem contribuído para o país ter aeroportos cada vez mais eficientes, confortáveis e com capacidade operacional adequada.

Diversos modelos de concessão foram experimentados por todo o país. O Brasil já conta com 22 aeroportos geridos pela iniciativa privada. Juntos, responderam por 66% do total de passageiros movimentados em 2019. A segunda e a terceira rodada de concessões de aeroportos no Brasil previam a participação da Infraero. A partir da quarta, os investimentos foram 100% alocados ao capital privado. No último edital, a opção foi por conceder aeroportos em blocos, de forma que o grupo que arrematasse um grande aeroporto também ficaria responsável pela administração de outros pequenos terminais, normalmente de cidades do interior.

Para 2022, o governo planeja realizar a 6a Rodada de Concessões Aeroportuárias, com a previsão de leilão para mais 22 aeroportos, distribuídos em três blocos (Sul, Norte I e Central). Também há planos de venda da participação da Infraero nas concessões atuais de Brasília (DF), Confins (MG), Guarulhos (SP) e Galeão (RJ), além da realização de uma 7a rodada com a licitação de mais 20 aeroportos, incluindo Congonhas, em São Paulo, o maior aeroporto em termos de movimentos gerido pela Infraero.

Satisfação dos passageiros cresceu

Os dados da pesquisa de satisfação dos passageiros comprovam a mudança para melhor nos aeroportos. De acordo com o levantamento atualizado a cada trimestre pela Secretaria de Aviação Civil, do Ministério da Infraestrutura, o índice de qualidade dos aeroportos brasileiros vem aumentando a cada ano. Cálculo da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que, na comparação com 2013, houve melhora de 16% na satisfação dos passageiros, considerado um grupo de 14 aeroportos, sendo nove privados e cinco públicos.

A movimentação de passageiros também aumentou consideravelmente desde o começo do processo de concessões. Em 2010, 155,3 milhões de pessoas passaram pelos aeroportos brasileiros, enquanto em 2019 foram 213,8 milhões. O sucesso da operação da iniciativa privada no setor também se reflete nos investimentos em melhorias.

De acordo com levantamento apresentado no artigo “A Efetividade das Concessões de Aeroportos no Brasil”, produzido por especialistas em infraestrutura da Universidade de Brasília (UnB), os aeroportos concedidos nas 2a e 3a rodadas investiram, entre 2011 e 2017, 4,5 vezes mais por passageiro e realizaram 10,6 vezes mais gasto de capital do que um grupo de aeroportos similares sob gestão da Infraero até 2017 (Curitiba, Manaus, Cuiabá, Congonhas, Santos Dumont, Porto Alegre, Fortaleza, Salvador e Florianópolis). No período, o investimento total pelos aeroportos privados foi de R$ 12,2 bilhões, o que viabilizou um aumento de 109% na área dos terminais de passageiros.

“Os aeroportos concedidos conseguiram desafogar parte da demanda reprimida por seus serviços e reduzir os níveis de saturação dos terminais, mesmo com áreas e níveis de crescimento da movimentação de passageiros superiores aos demais aeroportos ainda sob gestão da Infraero”, afirma o especialista em infraestrutura da CNI Matheus de Castro.

Ele acrescenta que há claramente uma relação de causa e efeito entre o maior volume de investimentos dedicados ao conforto dos passageiros e a qualidade percebida pelos mesmos, além de um “efeito aprendizagem”, pelo qual os aeroportos competem por melhorias em suas instalações na medida em que os investimentos são realizados.

ATERRISAGEM - Investimento nas unidades sob concessão foi maior do que nas controladas pela Infraero -
ATERRISAGEM – Investimento nas unidades sob concessão foi maior do que nas controladas pela Infraero – Claudio Capucho/Getty Images

Depois de concedido à iniciativa privada, o Aeroporto Internacional de Brasília se tornou o principal hub de voos domésticos do país: o terminal é o único a ter voos para todos os 26 estados. O aeroporto, que estava imensamente defasado antes da concessão, deu certo em razão do projeto de ampliação, de investimentos robustos e da experiência da concessionária, subordinada ao grupo Corporacion America Airports, que já operava aeroportos, como o de Ezeiza (na região metropolitana de Buenos Aires, na Argentina). Entre os destaques em seu modelo de operação, está o funcionamento simultâneo de duas pistas de pouso e decolagem paralelas.

“Dois pontos principais fizeram com que o aeroporto de Brasília se tornasse referência: o grupo responsável tem bastante expertise, com 52 aeroportos em sete países, e soube fazer um desenho de expansão com operação fluida. Além disso, foram investidos R$ 1,5 bilhão em melhorias de processos, modernização de equipamentos e tecnologia”, destaca o diretor de assuntos corporativos da Inframérica, Rogério Coimbra. “Há aeroportos grandes que não favorecem conexão. Esse é um diferencial em Brasília”, acrescenta.

De acordo com o diretor da Inframérica, as concessões de aeroportos no Brasil se mostraram um iniciativa bem-sucedida. “O governo federal tem aprimorado os modelos de concessão a cada leilão. Nos primeiros cinco anos das concessões foi investido nos aeroportos brasileiros mais do que nos 16 anos anteriores. Isso tudo de forma sustentada. O resultado é que o governo deixou de fazer investimentos, passou a arrecadar com outorgas e impostos, e viu o serviço melhorar”, pontua.

“Sem dúvida, o aeroporto de Brasília é um caso de sucesso e acho que o melhor termômetro é ver a satisfação dos passageiros como mostra a pesquisa realizada pelo Ministério da Infraestrutura. Desconheço algum serviço público que preste serviço melhor que o do aeroporto de Brasília”, completa Coimbra.

O Aeroporto de Brasília já foi escolhido 12 vezes o melhor do Brasil entre os que movimentam mais de 15 milhões de passageiros ao ano, na pesquisa do Ministério da Infraestrutura.

Desde o começo da transferência de aeroportos para o setor privado, o único caso que evolui para problemas na concessão é o do aeroporto de Campinas, por questões diversas relacionadas a exigências e contrapartidas contratuais, que foram agravadas por previsões otimistas de crescimento econômico do país e da demanda de passageiros. O pedido de relicitação pela concessionária foi protocolado na Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) em março e está previsto no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI).

Apesar dos problemas, o aeroporto foi ampliado, modernizado e oferece infraestrutura aos seus usuários muito superior à época em que era administrado pela Infraero.

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