Embora o PT de Lula e PL de Jair Bolsonaro apontem indícios de corrupção nos gastos da pré-campanha do senador Sergio Moro (União Brasil-PR), é o suposto abuso de poder econômico pelo ex-juiz da Lava Jato que forma o eixo central do processo movido pelas duas siglas na Justiça Eleitoral do Paraná.
Isso tem ligação segundo Catarina Scortecci, da Folha, com a natureza do processo, que é uma Aije (ação de investigação judicial eleitoral) proposta pelos dois partidos.
O advogado do PT, Luiz Eduardo Peccinin, diz que a ação contra Moro se propõe a apontar provas de abuso de poder econômico nos termos do artigo 30-A da “Lei das Eleições” (lei 9.504/1997) e artigo 22 da “Lei das Inelegibilidades” (lei complementar 64/1990).
Já a apuração de eventuais crimes eleitorais (como caixa 2 ou apropriação indébita eleitoral) ou crimes comuns (como lavagem de dinheiro) caberia ao Ministério Público, que poderia propor uma ação penal pública.
“A competência é do Ministério Público. Nós podemos representar criminalmente denunciando ao MP [Ministério Público] ou o próprio TRE já pode mandar os autos para o MP analisar. Mas, nestas hipóteses, quem propõe a denúncia é o MP, e quem toca o inquérito é a Polícia Federal”, explica.
Na ação, os partidos apontam suposto abuso de poder econômico e, por isso, pedem a cassação do mandato de Moro. Mas também defendem que os indícios de corrupção sejam apurados.
Em nota encaminhada à reportagem, Moro afirma que os indícios de corrupção são “mera especulação dos advogados do PT e do PL” e “já foram refutados pelo MPF que não os reconheceu em seu parecer”.
Moro acrescenta que inexiste o abuso de poder econômico, “como esclarecido exaustivamente no processo”. Ele diz ainda que aguarda o julgamento com serenidade.
Os indícios de corrupção mencionados pelas siglas na ação estão ligados principalmente ao contrato de serviços jurídicos feito entre a União Brasil e o escritório do advogado Luis Felipe Cunha (União Brasil), que é amigo de quase 20 anos de Moro e se tornou seu primeiro suplente no Senado.
PT e PL acham suspeito o contrato, já que o escritório de Cunha até então não atuava na área do direito eleitoral. O valor do contrato também foi considerado alto —R$ 1 milhão para um período de quatro meses, de abril a julho de 2022.
Os partidos de oposição a Moro defendem que haja uma investigação mais aprofundada sobre o destino do dinheiro. Para o PT e o PL, Moro pode ter usado os recursos para um “autofinanciamento oculto e antecipado” para sua campanha ou para pagar despesas pessoais. Ele nega qualquer irregularidade.
Para o advogado do PT, Moro “contratou o amigo como suposto advogado e triangulou esses recursos”. Peccinin deu a declaração à imprensa logo após a audiência na qual Moro prestou depoimento ao relator do caso, o juiz Luciano Falavinha, em dezembro.
Ao juiz Moro justificou que o valor também abrangia pagamentos ao escritório do advogado Gustavo Guedes, que não teria sido contratado diretamente pela União Brasil em razão de uma resistência do presidente da sigla, Luciano Bivar.
Guedes, responsável hoje pela defesa de Moro na Justiça Eleitoral, confirma a versão e diz que Cunha subcontratou seu escritório.
“Houve por parte do partido a informação de que não gostariam de me contratar pelo fato de eu ter assinado contra o PSL [hoje União Brasil] uma ação de desfiliação de justa causa da Joice Hasselmann”, disse Guedes, em janeiro, em entrevista à Folha.
“Na época, eu tinha a informação de que este apontamento teria vindo do próprio Bivar. Depois o Bivar disse em entrevista que não falou. Mas, alguém disse internamente lá. Se alguém usou o nome do Bivar porque não gosta de mim, não sei. O fato é que isso foi dito lá atrás. Respeito o Bivar, não tenho nada contra ele. Mas entendi a resistência como compreensível”, afirmou o advogado.
Segundo ele, a alternativa encontrada, e que teria recebido o aval da própria sigla, foi a parceria com o escritório de Cunha, que pretendia começar a atuar na área eleitoral.
“Eu não vou apontar valores, mas recebi uma parte significativa deste pagamento de R$ 250 mil por mês”, disse Guedes. “Ele prestou serviços comigo. Não foram só quatro pareceres. Foram dezenas de documentos que a gente produziu, entre coisas para o partido e defesas do Moro. E eu acho que o Felipe [Cunha] teve outras prestações de serviço também”, continuou ele.
Ao longo da audiência conduzida pelo juiz Luciano Falavinha em dezembro, o contrato foi o tema da maioria das perguntas feitas pelo magistrado ao senador.
Falavinha ainda não divulgou seu voto sobre o caso, mas já informou ter concluído a análise do processo, em 30 de janeiro. Agora ele aguarda a formação completa do colegiado da corte regional para colocar o assunto na pauta de julgamentos.
Uma das sete cadeiras de juízes está vaga desde o final de janeiro. A expectativa é que a posse do sétimo membro ocorra nos próximos dias, após indicação de um nome pelo presidente Lula com base em uma lista tríplice.
A ação motivada por representação dos partidos PL e PT sustenta que o ex-juiz da Lava Jato fez gastos excessivos durante o período da pré-campanha eleitoral ligada ao pleito de 2022, o que teria trazido desequilíbrio para a disputa.
Moro se filiou ao Podemos no final de 2021 de olho na disputa presidencial. Em março de 2022, abandonou o partido, anunciando filiação à União Brasil e uma candidatura ao Senado por São Paulo. Em junho, depois da Justiça Eleitoral barrar a troca de domicílio eleitoral para São Paulo, anunciou que seria candidato ao Senado pelo Paraná.
Por isso, os partidos opositores apontam que os gastos de pré-campanha, voltados inicialmente para a disputa ao Palácio do Planalto, tornaram-se “desproporcionais” e “suprimiram as chances dos demais concorrentes” ao Senado no Paraná.
Já a defesa de Moro nega que tenha feito gastos excessivos e sustenta que as despesas realizadas entre novembro de 2021 até início de junho de 2022 nem poderiam ser consideradas, justamente porque o pré-candidato almejava outros cargos.