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Incógnitas sobre gestão de Ernesto Araújo causam polvorosa no Itamaraty

domingo 25 de novembro de 2018 às 08:00h

No gabinete de seu antigo chefe, o futuro ministro das Relações Exteriores, embaixador Ernesto Araújo, recebeu nessa semana cada um dos subsecretários do Itamaraty para ouvir deles o relato de como andam suas áreas e começar a formatar as mudanças que pretende adotar na Casa de Rio Branco e na orientação da Política Externa. As incógnitas se somam e deixam os colegas de Araújo em polvorosa.

Ninguém saiu de sua sala improvisada na Subsecretaria de Assuntos Políticos Multilaterais, Europa e América do Norte, no anexo 1 do Itamaraty, com ideia do que exatamente Araújo fará. Muito além de suas concepções sobre o governo do americano Donald Trump, do pan-nacionalismo, do marxismo cultural e do projeto metapolítico, há certeza de que o novo chanceler não terá receio em mudar alguns dos alicerces da Política Externa brasileira. Entre eles, o não-alinhamento do Brasil.

O nome de Araújo corria pelo corredores do Itamaraty bem antes de ele entrar na lista de candidatos ao posto, dado o seu apoio escancarado à candidatura de Jair Bolsonaro, então candidato do PSL. O embaixador vestiu a camiseta do candidato para sair às ruas e registrou em um artigo e seu blog, “Metapolítica Brasil”, opiniões que surpreenderam seus colegas.

De uma lista de mais de 14 nomes vazados à imprensa, Araújo foi ungido pelas mãos do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente eleito, e pelas graças do filósofo conservador Olavo de Carvalho. Os diplomatas que trabalharam com ele, em seus 30 anos de carreira, dizem se tratar de uma pessoa muito preparada, gentil, respeitosa, reservada e sempre pronta para trabalhar, cordialmente, em parcerias.

Mas como será, ao sentar-se na cadeira de Rio Branco, continua a ser uma incógnita. A surpresa causada pela exposição de seu pensamento ultraconservador e de sua admiração pelo presidente dos Estados Unidos pode se repetir na sua condução dos trabalhos da casa, temem alguns de seus colegas.

“O presidente Donald Trump propõe uma visão do Ocidente não baseada no capitalismo e na democracia liberal, mas na recuperação do passado simbólico, da história e da cultura das nações ocidentais”, escreveu o embaixador no artigo “Trump e o Ocidente”, publicado no ano passado no Cadernos de Política Exterior, do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (IPRI).

“A visão de Trump tem lastro em uma longa tradição intelectual sentimental, que vai de Ésquilo a Oswald Spengler e mostra o nacionalismo como indissociável do Ocidente. Em seu centro está não uma doutrina econômica e política, mas o anseio por Deus, o Deus que age na História”, completou.

A quarta frase de seu post no Twitter de 18 de novembro aumentou as preocupações entre seus colegas diplomatas.

Outra preocupação está no fato de Araújo ainda não ter dado declarações públicas sobre as primeiras investidas de seu novo chefe na Política Externa. Seu silêncio é preocupante. Bolsonaro insiste na mudança para Jerusalém da embaixada do Brasil em Israel, criticou a China, expôs uma visão negativa sobre o Mercosul, diminuiu a Argentina e ameaçou retirar o Brasil do Conselho das Nações Unidas de Direitos Humanos e do Acordo de Paris sobre Mudança Climática.

Diplomatas experientes estão preparados para a adoção, por Araújo, de uma Política Externa 180 graus distante daquela conduzida por Celso Amorim na década passada, durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Para eles, porém, a futura linha será igualmente ideologizada, porém com base em valores e princípios da direita, e sujeita a tantos equívocos quanto a adotada pelo governo petista.

Embaixadores veteranos não se eximem de aconselhar o futuro chanceler a declinar o convite de Bolsonaro, voltar a seu posto original, o de diretor do Departamento de Estados Unidos, Canadá e Assuntos Interamericanos, e seguir os próximos 24 anos reservados a sua carreira diplomática. Mas ele já deu demonstrações de que isso não ocorrerá.

Arnesto

Em um ministério onde quase todos os funcionários ganham um apelido irônico, Ernesto Araújo não poderia deixar de se tornar “Arnesto”, como o personagem omisso do samba de Adoniran Barbosa. Assim tem sido chamado, a boca miúda, no Itamaraty.

Araújo deverá ser o primeiro dos ministros de Estado a ser empossado e a assumir seu ministério, com a designação do secretário-geral das Relações Exteriores, dada a lista expressiva de chefes de Estado e de governo esperados para a posse de Bolsonaro. O nome de seu secretário-geral – o mais alto posto da carreira diplomática – é outra das incógnitas a estressar os funcionários do Itamaraty.

Todos os subsecretários e diretores de departamentos deverão colocar seus cargos à disposição do novo chanceler, que formará sua equipe como lhe pareça. Vários dos embaixadores já designados pelo governo de Michel Temer para postos no exterior deverão seguir seus rumos. A ameaça de uma nova caça às bruxas na Casa de Rio Branco paira no ar e mexe com os humores dos diplomatas, sempre preocupados com a promoção na carreira e o futuro posto no exterior.

Temer e o chanceler Aloysio Nunes Ferreira tiveram o cuidado de deixar para o governo de Bolsonaro a designação dos principais postos do Brasil no exterior – as embaixadas em Washington, Buenos Aires, Paris, Londres, Pequim e nas Nações Unidas.

Mas os demais embaixadores que estão chegando do exterior, em especial os que tiveram atuação expressiva durante os governos petistas, ainda podem ser alvos de represálias e de ostracismo. Assim fez Amorim com vários diplomatas que cumpriram missões importantes na gestão de Fernando Henrique Cardoso, concomitantemente a sua exigência de “engajamento” dos profissionais do Itamaraty à linha política do governo.

A vários deles já está reservada uma cadeira na sala do Grupo de Apoio Operacional e Administrativo (Gaoa). Trata-se do órgão formal do Itamaraty que substituiu o informal Departamento de Escadas e Corredores (DEC), o destino dos diplomatas caídos.

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