A primeira semana do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) na presidência da Câmara dos Deputados teve recados ao Judiciário, sobre a transparência no uso de recursos públicos, ao governo, sobre cortes de gastos, e acenos à direita e à esquerda, com falas segundo reportagem de Victor Ohana, do Broadcast, sobre a inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) simultâneas a declarações em defesa da democracia.
Deputados que conversaram com o Estadão/Broadcast avaliam que, em discursos, entrevistas e reuniões, Motta quis fazer de sua estreia um momento oportuno para dizer ao Ministério da Fazenda que é preciso seguir com o ajuste fiscal. As declarações ocorreram na mesma semana em que Haddad apresentou as suas prioridades à Câmara, entre elas, a isenção do Imposto de Renda para quem ganha R$ 5 mil mensais.
Após cobranças públicas de Motta para que o governo seja específico sobre quais serão as compensações para o impacto da reforma do Imposto de Renda, Haddad disse à imprensa que a equipe econômica já terminou o desenho da compensação. “Só não vou adiantar porque não tenho autorização do Planalto para isso. Agora começa uma tramitação formal (dentro do governo)”, disse o ministro.
Para Maurício Marcon (Podemos-RS), vice-líder da oposição, os comentários de Motta sobre os “gastos excessivos” do governo agradam o seu bloco – como a publicação que o novo presidente da Casa fez na rede social X de que a melhor forma de controlar o preço dos alimentos é controlar o gasto público. “Como economista, concordo com ele”, disse Marcon à reportagem. Já o petista Jorge Solla (BA) disse: “Gasto público com os juros da dívida? Se for, concordo. É, de longe, o maior gasto público”.
Deputados também observaram recado ao Judiciário com a proposta sobre um portal de transparência aos Três Poderes. Governistas creem num acordo sobre as emendas parlamentares com Motta e dizem que quem não queria uma solução era Arthur Lira (PP-AL). Por outro lado, também se pede disposição do Supremo Tribunal Federal (STF) para harmonia com o Legislativo.
“O presidente Hugo Motta tem toda a disposição do diálogo em relação às emendas, e a gente espera que o Supremo também tenha esse entendimento do que é a emenda”, disse o novo líder do PSB, Pedro Campos (PE), ao Papo com Editor, do Estadão/Broadcast.
Há ainda uma tentativa de Motta em agradar “gregos e troianos”. À direita, o presidente já disse ser extenso o tempo de oito anos para a inelegibilidade na Ficha Limpa, o que dá esperança em trazer Jair Bolsonaro (PL) de volta à disputa pelo Planalto. Aumentaram as expectativas, também, para a anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro. O deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) disse à imprensa ter visto sinalização para que o debate sobre a comissão especial da anistia seja recolocado nas próximas semanas.
À esquerda, o deputado paraibano saudou a democracia e mencionou o filme ‘Ainda Estou Aqui’. Deputados têm elogiado, sobretudo, as novas regras de funcionamento da Casa. Motta tem divulgado as pautas das votações com antecedência, realizado as sessões legislativas mais cedo, preferido temas em que há consenso, realizado reuniões de líderes dentro da Câmara e não na residência oficial e exigido mais a presença física dos deputados no plenário. “É um bom começo, ajuda a dar um tom mais sóbrio ao Parlamento”, disse Rubens Pereira Júnior (PT-MA). “Essas mudanças vêm a fortalecer o debate e a valorização do plenário”, enalteceu Cláudio Cajado (PP-BA).
Alguns deputados, no entanto, têm dúvidas de que a previsibilidade se mantenha, sobretudo quando houver pautas decisivas. “Não sei se aguenta a pressão”, afirmou um deputado do PL. Para Kim Kataguiri (União-SP), a rotina está mais previsível, mas ainda há expectativas. “Espero que o regimento também volte a ser seguido em plenário e Medidas Provisórias voltem a ser apreciadas em comissões mistas”, disse.
Outra observação foi que a “valorização do plenário” também se traduziu em sessões mais longas para projetos muito simples. Segundo um deputado mais ao centro que não quis se identificar, isso pode ser “um pouco de falta de traquejo”.