Reuniões constantes de empresários fazem lobby no Executivo e no Legislativo federal para participarem ativamente na elaboração de políticas públicas
Após prometer criar um milhão de empregos no primeiro mês do governo de Jair Bolsonaro (mas ter ficado longe de atingir a meta) e de iniciar um corpo a corpo em Brasília pela aprovação da reforma da Previdência, o movimento de empresários liderado por Flávio Rocha, dono da Riachuelo, pretende avançar em sua atuação em Brasília e participar ativamente na elaboração de políticas públicas. “A ideia é ter ação política”, diz Gabriel Kanner, sobrinho de Rocha e presidente do Instituto Brasil 200.
Por meio da entidade, o grupo de empresários fará lobby no Executivo e no Legislativo por políticas liberais. A entidade já assinou protocolo de intenções com o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e pretende colaborar no texto da reforma tributária.
O instituto, que se define como apartidário, tem a deputada Joice Hasselmann (PSL) como coordenadora de sua frente parlamentar e deve se beneficiar da proximidade de seus fundadores com membros do governo e do Congresso.
Tanto Kanner como o vice-presidente do instituto, Helcio Honda (diretor do Departamento Jurídico da Fiesp), têm tido reuniões com nomes como o do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), e do secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra. Honda esteve ainda duas vezes em Washington, nos EUA, para discutir um convênio de intercâmbio de estudos com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
O primeiro projeto do instituto está em andamento: informações sobre a reforma previdenciária têm sido trocadas com o Ministério da Fazenda. O grupo também tem recolhido assinaturas de parlamentares que se comprometem com a proposta.
O segundo passo do Brasil 200 foi fechado com a ministra Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos). O instituto vai desenvolver, durante quatro anos, projetos de capacitação de empreendedorismo em comunidades vulneráveis. A comunidade quilombola Kalunga, em Goiás, será a primeira a receber o curso, que terá custo de R$ 200 mil, bancado pelo Brasil 200.
Uma terceira iniciativa já começou a ser desenhada e envolve um dos maiores desafios econômicos do governo: a reforma tributária. Nesse caso, além de querer participar da elaboração do texto que será encaminhado ao Congresso, o instituto vai propor mudanças infraconstitucionais – ideia que já foi muito bem recebida pelo governo, segundo Honda. Uma comissão interna, com membros como os professores da faculdade de Direito da FGV, Eurico Santi e Isaías Coelho, foi formada para debater o assunto. “Devemos fazer uma proposta (de substituição de vários impostos por um único) com um tempo de transição inferior a dez anos”, diz Honda.
Início
O embrião do instituto foi o movimento Brasil 200, lançado no início do ano passado, em Nova York. A ideia então era apoiar a candidatura à Presidência de alguém que fosse liberal do ponto de vista econômico e “conservador nos costumes”.
O primeiro a receber respaldo do movimento foi o próprio Rocha. Após ele desistir da disputa presidencial, o grupo passou a colaborar com Jair Bolsonaro. Se juntaram a Rocha empresários como Luciano Hang (dono da Havan), João Appolinário (Polishop), Sebastião Bomfim (Centauro) e Edgard Corona (Bio Ritmo). Passadas as eleições, o movimento começou a se transformar no instituto. “Foi uma evolução natural na estrutura, para se tornar mais robusto”, diz Rocha. Segundo ele, o Brasil 200 se difere de outros centros de pensamento liberal por também apoiar uma agenda cultural. “O inimigo hoje é mais o marxismo cultural que o econômico.”
Estrutura
O instituto tem dez prestadores de serviços e alugou um andar no escritório Braga Nascimento e Zilio Advogados Associados, no Jardins, em São Paulo. Sócio da banca, Marcelo Braga Nascimento é um dos apoiadores do projeto, além de liderar a associação Eu Amo o Brasil, que instala bandeiras do País por São Paulo.
“Me convidaram para participar (do instituto) porque tenho a entidade de patriotismo. É muito importante ter amor ao País”, diz. O advogado destaca que quis participar do projeto por entender que a sociedade tem de se envolver na política para o Brasil mudar. “Não é só o governo (que tem de trabalhar).”
Estopim
Uma ação do Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Norte contra a Riachuelo foi o estopim para a criação do movimento Brasil 200. Em 2017, um grupo de procuradores instaurou a ação contra a varejista por entender que empregados de confecções que produziam para a marca recebiam menos que os funcionários contratados diretamente pela empresa. Segundo o MPT, o preço de costura das peças, fixado pela Riachuelo, era de R$ 0,35 o minuto e não cobria os custos operacionais das confecções.
Os procuradores afirmaram que a companhia transferiu 17% de sua produção para essas confecções. A ação proposta pelo MPT gerou um protesto de pequenos empresários a favor da Riachuelo. Segundo o presidente do Instituto Brasil 200, Gabriel Kanner, que é neto do fundador da Riachuelo, esse caso do Rio Grande do Norte é um “exemplo de que, no Brasil, o patrão é sempre o vilão e quer oprimir os empregados”. “Isso nos motivou a criar um movimento para ter um ambiente de negócios mais favorável”, diz Kanner.
No fim de abril, a Justiça decidiu não reconhecer a ocorrência de dano moral coletivo, negando o pedido do MPT de indenização de R$ 37,7 milhões, mas entendeu que, em caso de processo trabalhista de funcionários contra as confecções, a Riachuelo deverá responder como responsável.
Empregos
O total de 1 milhão de empregos prometido no início de dezembro pelo então Movimento Brasil 200 virou 30 mil vagas, segundo o presidente do Instituto Brasil 200, Gabriel Kanner. “Tivemos dificuldade para ganhar capilaridade entre médias e pequenas empresas por conta desse clima de incerteza”, disse. “A ideia era dar estímulo à economia no curto prazo e gerar uma onda de confiança, mas precisamos de reforma estrutural”, acrescentou.
O projeto previa a criação de postos de trabalho no primeiro mês do governo Bolsonaro e havia sido lançado em parceria com a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp). As 30 mil vagas citadas por Kanner não necessariamente estão ligadas à campanha do Brasil 200. O número é praticamente o total de empregos formais gerados no País no período, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério da Economia.
Apoiador do instituto, o empresário Luciano Hang, dono da rede de lojas Havan, afirma ter aberto cerca de mil vagas nos quatro primeiros meses do ano, mas destaca pretender encerrar 2019 com 3 três mil. Hang diz que ajudará o Brasil 200 divulgando os projetos nas redes sociais, “tentando mostrar algum caminho que faça diferença”. O empresário coloca como principais bandeiras do instituto a desburocratização e a redução da máquina pública.
Dono da Polishop, o empresário João Appolinário conta que criou 40 vagas em janeiro e fevereiro, mas que todas acabaram sendo canceladas. “O setor produtivo depende da economia do País. Não adianta criar um posto de trabalho com o País parado por causa da Previdência.” Appolinário afirma que seu envolvimento no Brasil 200 será uma espécie de mentoria. “Vou participar com ideias.”
O instituto tem ainda a colaboração de empresários menores, como Lúcio Flávio Rocha, sem parentesco com o dono da Riachuelo e que possui franquias em shoppings de Sergipe. Ele abriu quatro vagas em janeiro e diz ter se unido ao projeto por não querer “ser refém” do Estado, mas “protagonista”.