O secretário executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, sinaliza que o governo deve adotar novas medidas fiscais neste ano — que podem diminuir as frustrações dos investidores com o pacote considerado tímido de ajuste de gastos. No ano passado, a desconfiança com o governo fez o dólar disparar e ficar acima do patamar de R$ 6, o maior da História. A cotação da moeda americana se mantém nesse nível em 2025.
Mas, de acordo com o número 2 de Fernando Haddad, as novas propostas de corte de despesas e arrecadação devem começar a ser debatidas após a aprovação pelo Congresso do Orçamento de 2025. Segundo ele, a equipe econômica deve voltar a insistir em impor limites aos “supersalários”, pagamentos que extrapolam o limite estabelecido pela Constituição, porque a revisão de gastos deve atingir “o andar de cima”. Durigan ainda rechaça em entrevista a Thaís Barcellos e Manoel Ventura, do O Globo, o impacto de políticas fiscais na inflação do ano passado.
Bancos estão rebaixando as ações brasileiras, e o dólar continua acima do patamar de R$ 6. Como a Fazenda pode conter isso?
Fizemos uma mesa com as instituições e com esses agentes para mostrar para eles os nossos números. Apresentamos medidas dentro do governo, vencemos a etapa e aprovamos no Congresso (as medidas), o que vai facilitar o funcionamento do arcabouço fiscal em 2025 e 2026, de maneira definitiva.
E por que houve essa reação negativa do mercado?
Existem outros temas pendentes de serem resolvidos, como a nossa dívida. Isso deve seguir sendo tratado e é nosso papel aqui na Fazenda. Precisamos vencer o ceticismo em relação à estabilidade da dívida pública. Cumprimos a meta de (resultado) primário em 2024 com um déficit de R$ 12 bilhões, contra todas as expectativas. O arcabouço fiscal está funcionando.
Fizemos o maior ajuste fiscal dos últimos tempos no Brasil. E um ajuste fiscal que não é austericida, como fazem alguns aqui na América Latina. O problema das expectativas tem que seguir endereçado. Isso nos incomoda. Temos que conseguir passar essa percepção de que temos responsabilidade fiscal. Tanto é que diminuímos em mais de R$ 200 bilhões o déficit de 2023 para 2024.
Parte do incômodo do mercado é com a avaliação de que o pacote só segura o arcabouço até 2026 e abre espaço para medidas fiscais eleitoreiras. Como garantir que o gasto será controlado?
Pela consistência da nossa estratégia. O que temos dito, repetindo e estressando em várias ocasiões, é que acreditamos na responsabilidade fiscal. É nosso papel nos próximos dois anos reforçar a política fiscal, do lado da despesa e do da receita, para que obtenhamos grau de investimento e cheguemos com inflação sob controle, com crescimento sustentável.
Novas medidas fiscais podem ser apresentadas neste ano?
Do lado da Fazenda, nunca estamos parados. Sempre ficamos avaliando e monitorando as questões e estudando quais são as medidas para corrigir o que precisa ser corrigido. O próximo passo é tratar o Orçamento de 2025, incorporando o que foi aprovado no fim do ano de medidas fiscais. Algumas medidas que estavam sendo criticadas por estarem não necessariamente previstas no Orçamento vão estar. É o caso do Pé-de-Meia e do Auxílio-Gás.
Então, é incerto que teremos novas medidas fiscais?
Isso está certo, porque é natural que tenhamos que adotar medidas no decorrer do ano para garantir esse compromisso e esse resultado que conseguimos entregar. Vamos fazer isso. Temos que garantir que o Orçamento de 2025 seja bem executado. Se tiver alguma política pública que esteja fora do prumo, vamos corrigir para que o gasto fique dentro da nova regra fiscal. O arcabouço deu certo. O que de fato hoje nos escapa são expectativas que não estão no nosso controle. É legítimo que tenhamos que dar novos passos para garantir que as expectativas estejam mais condizentes com os resultados que estamos entregando.
E qual seria o “timing” dessas novas medidas?
Tem um timing natural. Temos que aprovar o Orçamento e dar consecução a isso. Todo o pacote de medidas está sendo estudado por nós. Medidas diversas podem ser adotadas, seja administrativa, de colegiados como o Conselho Monetário Nacional, e do ponto de vista do Congresso Nacional.
O governo vai propor o projeto contra os supersalários?
A nossa orientação é de moralização e de que deveríamos começar a revisão de gastos pelo andar de cima. Lamentamos que muitas dessas medidas que são moralizantes acabem sendo desidratadas. Voltaremos ao tema dos supersalários e esperamos aprovar a idade mínima para os militares com o aumento da contribuição para a saúde, agora em 2025.
O dólar segue acima de R$ 6. É um patamar adequado?
Não me cabe dizer o patamar que acho adequado ou não do dólar. O importante é reconhecermos as causas. O cenário externo, principalmente o cenário americano, tem ditado parte importante desse aumento do dólar em relação ao real. Vou reconhecer, inclusive, que tem elementos do cenário doméstico, que é o nosso trabalho de avançar, de aprimorar tanto a comunicação do governo, como o ministro Haddad tem salientado, quanto as medidas.
No que nos compete, temos que fazer o trabalho de comunicação, de compromisso, seja meu, seja do ministro Haddad, seja do presidente Lula, para chegar a um patamar condizente com a realidade econômica, dentro do contexto mundial que nós estamos colocando.
Há culpa da política fiscal na inflação acima da meta do ano de 2024?
Existem várias causas para a inflação ter saído levemente ali da banda da meta. São causas sazonais, que têm a ver com as mudanças climáticas. E é muito importante dizer que o componente do gasto público não foi fundamentalmente contribuidor para essa inflação. Se a gente compara a despesa federal na proporção com o PIB, saímos de um patamar de 19,5% em 2023 para 18,5% em 2024. O país cresceu, e a despesa não. Não há motivo para alarme em relação à inflação.
Temos um cenário de emprego positivo, mas inflação e juros subindo. Qual o saldo geral da economia?
Começo o ano de 2025 muito satisfeito com as entregas na Fazenda, mas ao mesmo tempo muito preocupado com os resultados gerais. Câmbio, juros, em especial esses dois elementos, nos preocupam. Mas nosso compromisso é seguir com a agenda para os próximos anos.
O senhor disse que 2023 foi um ano de recomposição de receitas e que 2024 foi de contenção de gastos. Qual vai ser a marca de 2025?
É o ano de consolidarmos os avanços. Temos que vencer o pessimismo para os próximos anos. Para além da Reforma Tributária, que é estruturante, dos projetos da transformação ecológica que vão ter impulso por conta da COP30, temos que garantir que não tenha retrocesso no fiscal.