Aprovada em uma votação simbólica no Senado no fim de abril e atualmente em tramitação na Câmara dos Deputados, a proposta do governo de regulamentar o mercado brasileiro de criptomoedas pode trazer mudanças profundas para o setor no Brasil.
Segundo a revista IstoÉ Dinheiro, essa não é a única alteração proposta em Brasília. O real digital, que está sendo desenvolvido pelo Banco Central (BC) também deve chegar em breve. A proposta anterior do BC era de colocar essa moeda em testes ainda neste ano. No entanto, a greve dos servidores atrasou os trabalhos, e os primeiros pilotos só devem começar a ser testados em 2023. Mesmo assim, a ideia é não perder tempo. “Vamos realizar os testes em 2023 e na primeira metade de 2024”, disse o economista do BC Fábio Araújo. “Com isso, teremos condições de lançar o real digital no segundo semestre de 2024.”
As duas propostas, a regulação e o lançamento, alinham o Brasil com outras economias avançadas. Mundo afora, as autoridades se esforçam cada vez mais para controlar as criptomoedas. O caso mais extremo é o da China. O governo simplesmente criminalizou o uso e as transações com criptomoedas no fim do ano passado, visando desestimular os cidadãos a usar bitcoins e outros ativos. E o Banco do Povo, o BC chinês, é o pioneiro no desenvolvimento do renminbi digital. Os testes começaram no início de 2021. A moeda já circula em caráter experimental em oito cidades chinesas e, não fosse a ressurgência das infecções pelo coronavírus, o uso em toda a China teria começado já no primeiro trimestre deste ano. E segundo uma pesquisa do Banco de Liquidações Internacionais (Bank for International Settlements, BIS), nove em cada dez bancos centrais estão estudando lançar essas moedas. Isso melhora o funcionamento da economia. “O real digital será muito bom, pois permitirá a milhares de brasileiros ter acesso a moedas digitais, o que facilita as transações”, disse o diretor de negócios da CoinPayments no Brasil, Rubens Neistein.
“Usar tecnologias de blockchain para gerir recursos públicos e coibir corrupção e lavagem de dinheiro é lindo, mas fica a dúvida se vão fazer isso” Helena Margarido especialista em criptomoedas da Monett.
CONTROLE As explicações formais dos BCs são de que o lançamento de moedas digitais lastreadas tornaria as economia mais líquidas e eficientes e permitiria mais controle das transações. Também evitaria atos ilícitos. “As criptomoedas circulam no ambiente virtual e não há um emissor garantindo”, disse a advogada Elaine Keller. “A ausência de um controle estatal torna esses ativos um meio peculiar para lavagem de dinheiro, assim como joias, obras de arte e moeda estrangeira em espécie, além de permitir a formação de pirâmides”, afirmou. A solução, disse ela, não é controlar a tecnologia, mas disciplinar os prestadores de serviços, como as corretoras de criptoativos.
Segundo a advogada, o projeto de lei em tramitação tem um problema. Ele mistura criptomoedas com as demais moedas virtuais privadas, como milhas aéreas e pontos em programas de fidelidade. “Isso não faz sentido, há um erro de percepção das funcionalidades de cada um desses ativos”, disse ela.
Há outras dúvidas em relação à eficácia da regulação. “Usar tecnologias de blockchain para gerir recursos públicos e coibir corrupção e lavagem de dinheiro é lindo”, disse a especialista em criptomoedas do portal Monett, Helena Margarido. “A questão é se os reguladores vão fazer isso mesmo.” O fato de as criptomoedas – e, em menor escala, as moedas digitais emitidas pelos BCs – serem totalmente rastreáveis torna mais fácil saber o que foi feito com elas. A questão, disse Helena, é que isso é uma faca de dois gumes. “Assim como o regulador pode saber o que foi feito, ele também terá muito mais visibilidade sobre o que o cidadão comum está fazendo com seu dinheiro.”