O governo do presidente Lula da Silva (PT) busca se descolar e não arcar com o ônus para a sua imagem dos atos contra Jair Bolsonaro (PL) organizados por partidos de esquerda neste último sábado (23) e que foram esvaziados em praticamente todas as cidades em que ocorreram.
A avaliação interna é de que o PT e demais partidos erraram ao levar adiante as manifestações que não tinham uma “pauta mobilizadora”, como definiu um integrante do governo, e que além disso aconteceram de maneira desarticulada.
Por outro lado, ministros também defendem que se trata de um “evento do PT” e que por isso o esvaziamento não serve como um termômetro da força do governo.
Afirmam ainda que a pauta dos atos —em defesa da democracia, para lembrar os 60 anos do golpe militar e contra a anistia para quem buscou uma ruptura institucional—, embora importantes, não estão no topo da lista de prioridades que o governo vem defendendo publicamente.
Em meio à oscilação negativa na avaliação da gestão petista, Lula e seus ministros decidiram focar esforços na divulgação das ações do governo, com mais viagens pelo país. Aliados têm inclusive aconselhado o presidente a evitar embates retóricos com Bolsonaro e também temas polêmicos.
Além disso, o aniversário do golpe militar no próximo dia 31, uma das pautas dos atos, é um motivo de divisão dentro do governo e também entre os aliados. A decisão do presidente Lula de desaconselhar eventos para marcar a cerimônia foi objeto de críticas.
O governo vive um momento de tentativa de aproximação com os militares, em meio ao avanço das investigações sobre a participação de integrantes da cúpula das Forças Armadas nas articulações em favor de um golpe para manter Jair Bolsonaro no poder, após a derrota nas urnas.
Na noite de sexta-feira (22), por exemplo, Lula e outros integrantes do seu governo participaram de um jantar na residência do comandante da Marina, almirante Marcos Sampaio Olsen.
O Palácio do Planalto já havia decidido se distanciar dos atos quando eles começaram a ser planejados.
Por isso Lula, seus ministros e demais integrantes do governo optaram por não comparecer às manifestações. Ao longo deste sábado (23), também não houve referência aos atos nas redes sociais da equipe do mandatário.
Havia uma leitura estratégica de que os atos seriam invariavelmente comparados com a manifestação promovida pelo pastor Silas Malafaia em favor de Jair Bolsonaro, na avenida Paulista, em fevereiro. O próprio Lula disse que o ato na ocasião “foi grande”.
A estratégia de retirar o ato em São Paulo da Paulista e de dividir as manifestações em várias cidades tinha o objetivo justamente de evitar uma comparação com o ato bolsonarista. No Planalto, isso foi outro motivo de crítica, por expor ainda mais a falta de uma articulação.
Neste sábado (23), movimentos de esquerda e partidos organizaram atos em defesa da democracia em dezenas de cidades do país, além de Portugal e Espanha. Houve baixa adesão, incluindo nas cidades em que estavam previstas as maiores manifestações, como Salvador (BA) e a capital paulista.
Na capital da Bahia, a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, afirmou neste sábado que o objetivo dos atos da esquerda não era se equiparar em números ao realizado por Bolsonaro na Paulista, mas sim reforçar o combate a ditaduras e tentativas de golpe.
“[O objetivo] é fazer atos pelo Brasil inteiro, independente de tamanho. Para reunir as pessoas e aqueles que lutaram contra a ditadura e deixar aceso na memória que não podemos voltar a esse tempo. E também para dizer que nós não concordamos com a tentativa do golpe do 8 de janeiro.”
Sobre a ausência de Lula das manifestações, a presidente do PT afirmou que “não é função do governo nem do presidente fazer mobilizações sociais”.
A manifestação na cidade de São Paulo ainda foi prejudicada por causa da chuva. Um dos presentes no evento foi o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu.