Apesar de ter adiado sua segunda reforma ministerial, o governo do presidente Lula da Silva (PT) começa o ano de 2024 fazendo uma série de mudanças no segundo escalão. As trocas de secretários-executivos atingiram pastas estratégicas na Esplanada, como os ministérios de Minas e Energia, Cidades e também a Secretaria-Geral, que fica dentro da estrutura do Palácio do Planalto.
Duas das três substituições feitas ainda nas primeiras semanas de janeiro têm relação segundo Renan Truffi e Fabio Murakawa, do jornal Valor, com a tentativa da gestão petista de compatibilizar diferentes correntes partidárias ou legendas numa mesma pasta, replicando o modelo já usado nos primeiros mandatos de Lula durante o auge do presidencialismo de coalizão. Os relatos também apontam para divergências na distribuição de emendas, assunto que tem tensionado a relação entre governo e Congresso Nacional.
Um dos casos que vieram à tona foi o do então secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Efrain Cruz, que foi demitido após uma série de desentendimentos com o titular da pasta, o ministro Alexandre Silveira.
Cruz é afilhado político do atual presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), que foi quem bancou sua indicação para o cargo de número 2 na pasta. Apesar de Alcolumbre também ser próximo de Silveira, os dois são de partidos diferentes. Enquanto Alcolumbre ajudou a fundar o União Brasil, Silveira é da cúpula do PSD em seu Estado, Minas Gerais.
Alcolumbre ganhou direito de fazer diversas indicações políticas, mesmo em ministérios que não estão ligados ao seu partido, justamente por ter ajudado Lula com a formação da base aliada do governo no Senado. Ele também foi o homem por trás das indicações de três ministérios.
No caso de Efrain Cruz, o estopim para a demissão teria sido o chamado projeto de lei (PL) das eólicas. Por influência de seu grupo político, o Centrão, o ex-secretário-executivo do MME teria incluído no PL alguns “jabutis”, como são chamados no jargão político os textos estranhos ao objeto principal de uma proposta. Esses trechos, no entanto, não contariam com o aval de Silveira.
Duas das três substituições têm relação com a tentativa de conciliar aliados
Os detratores de Efrain Cruz o criticam, em condição de anonimato, de ter trabalhado a favor dos tais “jabutis” como forma de beneficiar um determinado empresário do setor de gás, o que teria irritado ainda mais o ministro de Minas e Energia. Após a demissão dele, Silveira o substituiu por Arthur Cerqueira Valério. Não ficou claro até agora, entretanto, se Alcolumbre será compensado com cargos em outros órgãos do governo.
O outro secretário-executivo que ficou desempregado neste início de ano foi o ex-deputado Hildo Rocha (MDB-MA) e, agora, “ex-número 2” do Ministério das Cidades. Apesar de integrar o mesmo partido do ministro, Jader Filho (MDB-PA), o MDB, eles são de correntes diferentes e não tinham proximidade antes do início da gestão petista.
Jader é filho do senador Jader Barbalho (MDB-PA) e irmão do governador do Pará, Helder Barbalho. Já Hildo Rocha é do MDB do Maranhão, setor do partido que é comandado por outra corrente política, o clã de José Sarney. A escolha de Rocha, portanto, foi feita para contemplar distintos setores do mesmo MDB, o que não foi suficiente para garantir a harmonia no ministério.
O mal-estar entre o ex-secretário-executivo e o ministro das Cidades começou por causa do temperamento do maranhense, conhecido pelo perfil explosivo. Servidores de dentro do ministério relatam discussões acaloradas entre ele e o ministro e outros funcionários, muitas vezes por assuntos banais.
Além disso, Jader Filho e Hildo Rocha tiveram desentendimentos por causa da distribuição e do controle das chamadas emendas parlamentares.
Segundo fontes ouvidas pelo Valor, Hildo Rocha teria montado uma operação para viabilizar o empenho de emendas parlamentares de seu grupo, sem que isso recebesse o devido aval tanto de Jader como do Palácio do Planalto, que faz o pente-fino nessa conta. Por causa disso, ele acabou sendo desligado da pasta.
Tanto no caso de Hildo Rocha como no de Efrain Cruz, as demissões tiveram o aval de Lula, de acordo com fontes no Palácio do Planalto e na Esplanada.
Procurados, os dois ex-secretários não se pronunciaram.
O terceiro caso registrado em menos de um mês envolve a Secretaria-Geral da Presidência, pasta que fica na “cozinha” do Palácio do Planalto. O ministério é comandado por Márcio Macêdo (PT-SE), que recebeu a incumbência de fazer a interlocução com movimentos sociais.
Há alguns dias, entretanto, Macêdo perdeu sua secretária-executiva, Maria Fernanda Coelho. Em 9 janeiro, o colunista Lauro Jardim, de “O Globo”, noticiou que a demissão ocorreu após divergências entre ela e Macêdo. Um ponto de atrito teria sido a recusa de Maria Fernanda em assinar autorização para que três funcionários da pasta viajassem a Aracaju, base política do ministro, para acompanhá-lo em uma festa de pré-Carnaval em novembro do ano passado.
No mesmo dia, Macêdo admitiu que houve um “erro formal” na emissão de passagens, autorizada por ele próprio em documento. Ele determinou a abertura de sindicância para apurar o caso.
Procurada, a Secretaria-Geral, no entanto, nega a ligação entre a demissão da ex-secretária-executiva e o pré-Carnaval de Aracaju. Segundo a pasta, a ex-secretária-executiva foi exonerada a pedido alguns meses depois do episódio.
Maria Fernanda Coelho tampouco respondeu aos pedidos de entrevista feitos pelo jornal Valor.