Em uma votação confusa, o Senado aprovou nesta última terça-feira (5) o marco legal das ferrovias. O projeto cria, na prática, o regime de autorização como opção de outorga para a exploração de ferrovias por parte do setor privado — com regras mais flexíveis e sem a necessidade de percorrer o exaustivo trâmite dos leilões.
O substitutivo foi alterado diretamente no plenário depois de um acordo construído de última hora entre governo e oposição, o que agradou instituições como a Confederação Nacional da Indústria (CNI), mas colocou dúvidas em técnicos do governo sobre qual deve ser o texto final do projeto. A proposta segue, agora, para a Câmara dos Deputados.
A avaliação inicial de integrantes do governo e de entidades do setor é que a versão final do texto preserva boa parte dos 14 projetos de estradas de ferro apresentados ao Ministério da Infraestrutura recentemente. Esses projetos somam R$ 80 bilhões em promessas de aportes na ampliação da malha atual em 5.360 quilômetros de trilhos, cruzando 12 unidades da federação.
A CNI, por exemplo, comemorou o consenso. “Na avaliação da CNI, o novo marco é um importante caminho para a modernização do setor ferroviário brasileiro, que, hoje, é marcado pela baixa utilização e falta eficiência na maior parte da malha”, enalteceu, em nota, a entidade.
“Direito de passagem”
Uma das principais modificações feitas no texto foi sugerida pela senadora Kátia Abreu (PP-TO). A emenda apresentada por ela garante o chamado “direito de passagem”, ou seja, o acesso de terceiros a malhas de titularidade alheia, sob remuneração, diante de ociosidade da ferrovia. Essa regra valerá, no entanto, apenas para as concessões e não para o novo regime de autorizações, que era o que preocupava parte das empresas. O texto também veda a recusa injustificada de transporte de cargas, salvo diante da saturação ou incapacidade técnica.
Como parte desse acordo, no entanto, o relator do projeto, senador Jean Paul Prates (PT-RN), abandonou o instrumento do “concurso aberto”, proposta que permitia que futuros autorizatários também recebessem propostas de terceiros interessados em reservar capacidade na futura ferrovia, mediante da assinatura de contratos firmados assegurando esse uso e sua remuneração.
“Aviso: a Justiça vai dar o direito de passagem a qualquer momento, e vai ficar a insegurança jurídica. Concurso aberto propiciava slots de segurança jurídica. Vamos tirar. Não vamos atrapalhar o projeto. Mas veremos o que vai acontecer”, lamentou.
Governo e oposição também chegaram num meio termo em relação ao dispositivo que dava à concessionária, por cinco anos, o direito de manifestar preferência para obtenção de autorização, no caso da apresentação de projeto localizado dentro da sua área de influência. Esse artigo era visto pelos governistas como uma barreira para projetos de novas ferrovias que estão sendo gestadas no regime de autorização.
Interesses
Diante disso, Jean Paul Prates e o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), resolveram excetuar desse artigo todas as autorizações solicitadas até a data da publicação da lei. Com isso, o governo privilegia a ampliação da Transnordestina, projetada para ligar Porto de Pecém, no Ceará, ao Porto de Suape, em Pernambuco.
O trecho em questão também foi patrocinado pela bancada do Mato Grosso, cujos senadores têm forte ligação com a Rumo. A empresa ferroviária busca viabilizar uma nova malha para ligar Lucas do Rio Verde, importante área agrícola do MT, ao porto de Santos.