Desde que Jair Bolsonaro deixou a Presidência, governadores eleitos com o seu apoio têm mantido relação mais cordial com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Deixada a disputa ideológica de lado, nomes como Cláudio Castro (Rio de Janeiro), Tarcísio de Freitas (São Paulo) e Romeu Zema (Minas Gerais) têm se aproximado da Corte para tratar de interesses regionais. O movimento incomoda a base bolsonarista. As informações são de Bianca Gomes e Guilherme Caetano, do jornal, O GLOBO.
Castro se reuniu na semana passada com os ministros Luís Roberto Barroso, presidente do STF, e Dias Toffoli para discutir a segurança pública no Rio e a situação financeira do estado. O governador diz que pode recorrer ao Supremo caso as conversas com o Ministério da Fazenda sobre o Regime de Recuperação Fiscal (RRF) não avancem. Toffoli é relator do RRF carioca.
O governador tem evitado entrar em embates diretos com o STF. Em setembro, ele fez questão de ir à posse de Barroso e, ao lado de Tarcísio, entrou na fila de cumprimentos para saudar pessoalmente o ministro. O governador de São Paulo é, hoje, um dos bolsonaristas mais próximos da Corte.
O primeiro aceno de Tarcísio em direção ao STF ocorreu já na segunda semana do ano, quando viajou a Brasília para uma reunião com o presidente Lula e outros chefes de Executivos estaduais sobre os ataques do 8 de Janeiro. A decisão de participar do encontro foi tomada após o governador paulista receber um telefonema da então presidente do STF, Rosa Weber.
O secretário de Governo de Tarcísio, Gilberto Kassab, se tornou um dos principais interlocutores do Palácio dos Bandeirantes junto à Corte. Hoje, porém, às vésperas de completar um ano de governo, Tarcísio já despacha diretamente com alguns ministros, segundo aliados.
No mês passado, o governador esteve com diversos ministros para defender a constitucionalidade da lei estadual que dá aval para o estado vender terras devolutas com descontos de até 90% a fazendeiros. Após uma série de reuniões, a ministra Carmen Lúcia, relatora do caso, tirou o processo de pauta. O episódio é citado por correligionários como exemplo da boa relação com o STF.
Caso Sabesp
O governo também já conversa com ministros para se blindar de uma possível judicialização da privatização da companhia de saneamento, a Sabesp. Partidos da oposição ingressaram com uma ação na Corte questionando a constitucionalidade de um decreto do estado que facilita o processo de desestatização. Ainda há discussões em curso sobre a necessidade de a venda da empresa passar pela Câmara Municipal de São Paulo.
Segundo uma pessoa próxima a Tarcísio, o governo está dividindo com a Corte todas as etapas do processo, numa espécie de “vacina” para futuros questionamentos.
A relação de Tarcísio com o Supremo é alvo de incômodo da base bolsonarista, que se queixa dos elogios públicos do governador à Corte.
Em Minas, o governador Romeu Zema (Novo), que no passado defendeu “apontar os defeitos do Supremo”, diminuiu o tom após conselhos de aliados e tem buscado estreitar a relação com os ministros neste segundo mandato.
Uma das poucas falas ocorreu logo após o 8 de Janeiro, quando Zema disse que o afastamento do governador Ibaneis Rocha, do Distrito Federal, poderia ser “arbitrário”.
A articulação de Zema com o Judiciário tem sido feita principalmente pelo seu chefe da Casa Civil, Marcelo Aro. Deputado federal por oito anos, Aro é próximo de alguns ministros da Corte, como Gilmar Mendes, que participou da sua banca de mestrado em direito constitucional, Luís Roberto Barroso e Nunes Marques, indicado por Bolsonaro.
Correligionários do mineiro afirmam que o bom diálogo com a Corte tem rendido frutos. O principal foi a decisão que permitiu Minas aderir ao Programa de Acompanhamento e Transparência Fiscal (PAF), da União, o que aliviou o caixa do estado. A medida evitou que Minas fosse obrigada a pagar, de imediato, R$ 16,4 bilhões da dívida com o Fisco Nacional.
— Nossa relação hoje com o STF é a mais saudável possível, os ministros são sempre atenciosos com as nossas pautas. Em tudo o que levamos este ano tivemos a sensibilidade da Corte — afirmou Aro, ao GLOBO.
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Por outro lado, Jorginho Mello , de Santa Catarina, um dos governadores mais identificados com o bolsonarismo, é exemplo da tensão entre o entorno do ex-presidente e o Judiciário.
Em março de 2022, à época senador, ele chegou a escrever que o ministro Alexandre de Moraes era o “ditador mor da República”.