Com as maiores bancadas do Congresso, o PL, de Jair Bolsonaro, e o PT, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, deverão contar com um cofre turbinado no ano que vem para tentar mudar a lógica das últimas eleições municipais e desbancar siglas que tradicionalmente elegem mais prefeitos, como MDB e PP. A estratégia envolve apoio ao aumento no fundo eleitoral, que pode chegar a R$ 4,9 bilhões. Caso a cifra seja aprovada pelo Parlamento, a legenda de oposição terá em caixa um montante cinco vezes maior do que o da ultima disputa, em 2020, enquanto petistas mais do que dobrarão o valor disponível — já contando a inflação no período.
Caciques dos dois partidos trabalham para vencer resistências à ampliação do chamado fundão, que beneficiaria sobretudo as duas siglas. A regra de divisão dos recursos leva em conta o número de representantes eleitos em 2022, quando PL (99 deputados) e PT (69) conquistaram mais cadeiras que as outras siglas.
Caso o Congresso chancele o montante de R$ 4,9 bilhões, o fundão dará um salto de 145% entre uma eleição municipal e outra — em 2020 era de R$ 2 bilhões. Nesse cenário, o PL teria a maior fatia, de R$ 880 milhões, valor 500% maior do que os R$ 146,5 de quatro anos atrás, quando elegeu 345 prefeitos, nenhum deles nas capitais.
— A nossa tendência de crescimento é por causa do tamanho da nossa bancada, que aumentou muito. Queremos qualidade, não somente quantidade — disse ao GLOBO o presidente do PL, Valdemar Costa Neto.
O caixa recheado, porém, nem sempre resulta em dividendos eleitorais. Em 2020, quando era presidente, Bolsonaro havia rompido com o PSL, pelo qual havia sido eleito dois anos antes e que ajudou a tornar uma potência. Brigado com a cúpula, o ex-presidente pouco se envolveu nas campanhas municipais e, mesmo com o segundo maior caixa eleitoral daquele ano, a legenda conquistou apenas 90 prefeituras, menos até do que partidos como PSC (116 prefeitos eleitos) e Cidadania (139).
Na ocasião, a legenda apostou mais fichas na candidatura da ex-deputada federal Joice Hasselmann à Prefeitura de São Paulo, com R$ 5,9 milhões. Ela teve menos de 2% dos votos no primeiro turno.
Agora, o cenário mudou: a eleição de 2024 deverá ser a primeira vez desde o pleito do ano passado que as duas principais forças políticas do país, Lula e Bolsonaro, devem se envolver ao mesmo tempo nas disputais municipais.
O PT iniciou ontem uma conferência em Brasília na qual discute a estratégia eleitoral de 2024. O presidente participou do encontro e já indicou que percorrerá o país no ano que vem para ajudar o partido. Em 2020, a sigla elegeu apenas 182 prefeitos, ficando em 11º lugar no ranking de prefeituras conquistadas. Com o fundão maior, o PT teria um salto de 146% no valor disponível para distribuir entre seus candidatos, de R$ 616 milhões (em 2020 teve R$ 250,7 milhões).
— É razoável esperar alteração no mapa de partidos com mais prefeituras, não apenas devido aos recursos do fundo eleitoral, mas também por causa da mudança do governo federal — afirmou Marta Mendes, cientista política da Universidade Federal de Juiz de Fora.
O valor exato do fundo eleitoral ainda deve ser definido pelo Congresso no projeto do Orçamento de 2024. Na quinta-feira passada, contudo, o relator da Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO), Danilo Forte (União-CE), indicou que a quantia deve ser elevada ao incluir em seu parecer a possibilidade de levá-lo a R$ 4,9 bilhões, a mesma quantia das eleições 2022. Caso confirmada, a alta será de 150% em relação ao que foi distribuído aos partidos em 2020.
Apesar de o governo ter proposto uma quantia bem menor, de R$ 900 milhões, aliados avaliam que o Executivo não vá interferir no assunto.
— Defendo manter o valor da última eleição (2022). O governo não vai brigar por isso. É decisão do Congresso — afirmou o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), integrante da comissão executiva da sigla.
O líder do PL na Câmara, Altineu Côrtes (RJ), também defende o valor mais alto e diz que a proposta do governo para o fundão é “ridícula”.
— O valor de R$ 4,9 bilhões foi a eleição passada e o governo colocou R$ 900 milhões. Isso é ridículo. Como vai fazer com 5600 municípios? — questionou.
PSD x MDB
O argumento também é usado por dirigentes de partidos de centro. O PSD, de Gilberto Kassab, conta com o fundão maior para manter a dianteira entre as legendas que mais comandam prefeituras A sigla ultrapassou o MDB após iniciar uma ofensiva e filiar prefeitos eleitos em 2020 por outras siglas. Hoje tem 968 municípios e os emedebistas, 854.
— A disputa municipal tem muito mais candidato. Em todas as cidades há chapa de vereador, prefeito — diz Kassab.
O consultor político João Hummel, da Action Relações Governamentais, afirma que a mudança do quadro do comando das prefeituras vem ocorrendo com a mudança de partido dos prefeitos. O chefe do Executivo de Maceió, João Henrique Caldas, por exemplo, foi eleito pelo PSB, mas migrou para o PL.
— Sem dinheiro não se faz campanha eleitoral. E quem tiver muito dinheiro terá um poder de barganha significativo para fazer nominatas para vereador e prefeito — afirmou Hummel.