O prazo limite para o empenho de emendas parlamentares dentro do orçamento de 2024, que devem ser carimbadas pelo governo Lula até esta terça-feira (31), provocou segundo a colunista Malu Gaspar, do O Globo, uma intensa romaria de deputados e senadores nos gabinetes da Secretaria de Relações Institucionais (SRI) no Palácio do Planalto. A correria contra o relógio ocorre após semanas de impasse entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF) sobre diante do destino das verbas que, caso não sejam liberadas até a noite de hoje, não poderão ser executadas em 2025.
Isso porque qualquer dinheiro empenhado a partir da próxima quarta-feira (1) deverá ser amparado pelo orçamento da União do ano que vem. Só que há mais de R$ 4 bilhões de emendas bloqueados por decisão do ministro do Supremo Flávio Dino, que determinou a adoção de critérios e mecanismos de transparência sobre o repasse das emendas.
Até agora, outros R$ 2,5 bilhões estão sendo distribuídos através de manobras do governo federal como as “emendas disfarçadas”, como mostrou a equipe do blog na última segunda. Deputados e senadores têm feito marcação cerrada para liberar a maior quantia possível junto à SRI do ministro Alexandre Padilha, que administra a planilha de controle dos recursos liberados.
O dinheiro porventura não utilizado retorna aos cofres do Tesouro e não poderá ser reaproveitado pelos parlamentares, que precisariam formalizar novos pedidos e entrar novamente na “fila” de congressistas por emendas a serem apadrinhadas.
A mobilização tem movimentado os bastidores do Planalto durante o recesso parlamentar. A tática de liberar altas quantias de verbas no último dia do ano não é incomum na máquina federal, mas a batalha travada entre o Congresso e o ministro Dino levaram congressistas a deflagrar uma força-tarefa para viabilizar os recursos.
Pressionado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), o governo Lula tem buscado brechas ainda conforme a colunista do O Globo, para liberar verbas sem a transparência preconizada pela decisão do STF. Um dos exemplos são as emendas disfarçadas, manobra implementada pela SRI de Padilha a partir de uma dotação exclusiva do Ministério da Saúde.
O mecanismo permite liberar estes recursos sem identificar os autores do projeto e nem especificar quais municípios receberão o dinheiro.
Os pedidos, porém, não são feitos pelos próprios parlamentares, mas pelas prefeituras escolhidas por eles. No final, quando o recurso for enviado, só o que se saberá é quais cidades pediram o dinheiro, mas não qual parlamentar está sendo atendido.
Na prática, o mecanismo de envio dos recursos é o mesmo das emendas Pix e do orçamento secreto, em que o dinheiro é enviado por um caixa central para os municípios indicados por deputados e senadores. A burla às exigências do Supremo de transparência, rastreabilidade e controle é a mesma. A diferença é que dessa forma o controle dos recursos fica na mão Palácio do Planalto e não do Congresso.
Conforme publicamos na última segunda, a equipe do blog teve acesso a uma série de mensagens enviadas por assessores de Padilha e líderes do governo na Câmara e no Senado a deputados e senadores desde o último dia 19. Os diálogos incluem orientações sobre como solicitar os recursos alegando necessidade de custeio para a rede primária e especializada de atenção à Saúde.
A liberação de R$ 2,5 bilhões ocorreu a partir de um remanejamento interno de rubricas do Ministério da Saúde sob o comando da SRI e foi oficializada no último dia 12.
“Pessoal, segue um texto que a SRI fez para orientar os procedimentos”, diz a primeira de uma série de mensagens enviadas aos parlamentares.
O material traz um passo a passo detalhado, ensinando como protocolar os pedidos no Ministério da Saúde. Há, ainda, uma planilha com um manual de justificativas a serem usadas para conseguir a liberação dos recursos.
Os pedidos, porém, não são feitos pelos próprios parlamentares, mas pelas prefeituras escolhidas por eles. No final, quando o recurso for enviado, só o que se saberá é quais cidades pediram o dinheiro, mas não qual parlamentar está sendo atendido.
Na prática, o mecanismo de envio dos recursos é o mesmo das chamadas emendas Pix e do orçamento secreto – este tornado inconstitucional pelo STF no ano passado.
Essa dinâmica faz com que o dinheiro seja enviado por um caixa central para os municípios indicados por deputados e senadores. A burla às exigências do Supremo de transparência, rastreabilidade e controle é a mesma. A diferença é que dessa forma o controle dos recursos fica na mão Palácio do Planalto e não do Congresso.
“O governo está enviando o dinheiro a pedido de quem? E como se vai saber se havia realmente a necessidade de custeio alegada pelas prefeituras?”, diz sob reserva um integrante do Congresso que teve acesso às mensagens da SRI.
O conteúdo demonstra ainda que a SRI não está atendendo a demandas represadas ou pedidos espontâneos das prefeituras, mas o contrário. É o ministério de Padilha que diz aos parlamentares como fazer para receber os recursos usando essa verba que foi disponibilizada.
Além disso, está expressa duas vezes, uma delas em letra maiúscula, a recomendação : “NÃO CITAR EMENDA PARLAMENTAR NEM 544”.
A referência a 544 tem a ver com uma portaria assinada em 2023 pela ministra da Saúde, Nísia Trindade, liberando R$ 8 bilhões para atender parlamentares com o mesmo tipo de recurso, parte para atendimentos de baixa complexidade, mas a maior parte para média e alta complexidade.
Na época, o Estadão revelou que o dinheiro, remanejado do caixa das emendas do orçamento secreto, foi usado pelo governo como moeda política. Como resultado, 651 municípios receberam muito mais dinheiro do que o limite estabelecido por lei, considerando os equipamentos existentes para atender a população.
Isso significa que os recursos chegaram para municípios que não tinham hospitais, leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) ou equipamentos para realizar exames.
Os maiores beneficiados foram os governos de Alagoas, (R$ 166,5 milhões) e do Maranhão (R$ 132 milhões) e a prefeitura de Maceió (R$ 103 milhões). Constatou-se então que outros 1.332 municípios que tinham pedido recursos pela mesma portaria não levaram nada.
Como consequência, Nisia foi chamada pelas comissões de Fiscalização Financeira e Controle e da Saúde da Câmara dos Deputados em novembro para se explicar e negou ter usado o dinheiro como moeda política.
Consultado sobre a distribuição dos recursos e as mensagens dos assessores da SRI para os parlamentares, o ministério de Padilha enviou nota em que afirma que é papel da pasta “ser uma das portas de entrada para sugestões de projetos, pleitos e pedidos de orientação quanto a diversas políticas públicas federais”, e que as propostas são enviadas para os ministérios que avaliam tecnicamente e encaminham os pedidos.
Já o Ministério da Saúde afirmou que os repasses de R$ 2,5 bilhões não envolvem “remanejamento de recursos de outras pastas para a Saúde, mas apenas de ajustes entre programações (ações e/ou localizadores de gasto) do próprio Ministério da Saúde, necessários para otimizar a execução orçamentária no encerramento do exercício”.