O cacife de Paulo Gustavo Gonet Branco, apoiado por Gilmar Mendes e considerado favorito para o lugar de Augusto Aras na PGR (Procuradoria-Geral da República), vai além da amizade com o ministro do Supremo —seu ex-sócio no IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público).
Os advogados Gustavo Teixeira Gonet Branco e Pedro Henrique de Moura Gonet Branco, filhos do vice-procurador eleitoral, são próximos de Gilmar.
Gustavo atua em processos de interesse do ministro. Pedro Henrique é assessor no gabinete de Gilmar e recebe R$ 14,7 mil mensais (R$ 13 mil líquidos). Foi nomeado em novembro de 2022 por Rosa Weber, presidente do STF (Supremo Tribunal Federal).
Consultados por meio de suas assessorias, Gilmar e Gonet não se manifestaram.
Pedro é advogado inscrito na OAB do Distrito Federal, com inscrição suplementar em Alagoas. Figura com outros advogados em processo no Superior Tribunal de Justiça (STJ) de interesse de empresa de derivados de petróleo.
É pesquisador, com longo rol de textos publicados. Em 2019, com 20 anos de idade, estudante do curso de direito da UnB, Pedro assinou, em coautoria com o pai, artigo sobre a regulação da internet no Brasil. O texto foi publicado em uma revista do Centro Universitário de Curitiba e citado em voto de Gilmar.
“Às vezes a gente escreve achando que ninguém vai ler ou dar bola. Então, ver isso sendo mencionado na mais alta corte do Brasil, numa decisão de controle concentrado de constitucionalidade, foi uma alegria sem igual”, comentou Pedro em boletim da UnB, em 2021.
A menção de Gilmar foi vista como forma de projetar no meio jurídico o jovem filho de seu amigo.
Gustavo é sócio do escritório Mudrovitsch Advogados. Defende o empresário Jacob Barata Filho, o “rei do ônibus”, como é conhecido. Barata Filho foi investigado na Lava Jato com o ex-governador do Rio Sérgio Cabral e obteve três habeas corpus de Gilmar.
Rodrigo Janot, ex-PGR, havia arguido a suspeição de Gilmar. Citou que o ministro foi padrinho de casamento da filha do empresário.
Raquel Dodge, então PGR, entendeu que Gilmar “não afirmou suspeição” e considerava-se “plenamente apto, no aspecto subjetivo, para o julgamento do pedido de habeas corpus”.
Barata Filho é representado há mais tempo pela advogada Daniela Teixeira, recém-eleita para uma vaga no STJ. Daniela tem mestrado em direito penal pelo IDP e pós-graduação em direito econômico pela FGV. Iniciou a carreira no escritório do advogado Arnoldo Wald.
Gustavo também atuou na ação movida por Gilmar contra o jornalista Rubens Valente, autor do livro “Operação Banqueiro”, sobre a investigação dos negócios do banqueiro Daniel Dantas.
Valente foi obrigado a pagar mais de R$ 310 mil ao ministro. Reportagem da Folha registra que a decisão contraria precedente do próprio STF, pois não foi observada a “cláusula de modicidade” nas indenizações quando o suposto ofendido na honra e imagem for agente público.
Gonet ingressou no MPF (Ministério Público Federal) em 1987. Foi sócio do advogado Sergio Bermudes, em Brasília, com a advogada Guiomar Feitosa Mendes, mulher do ministro. Publicou com Gilmar o livro “Curso de Direito Constitucional”, que está na 17ª edição.
No final dos anos 1990, Inocêncio Mártires Coelho, Gonet e Gilmar criaram o IDP. Coelho, que foi PGR, presidiu o instituto. Gilmar e Coelho se desentenderam em 2010. O processo, sigiloso, foi extinto. Gonet ficou ao lado de Gilmar.
Em 2017, Gonet vendeu sua parte na sociedade para o advogado Francisco Schertel Mendes, filho de Gilmar e atual diretor-geral do IDP.
O site BuzzFeed News Brasil revelou que o advogado comprou 43% do instituto por R$ 12 milhões, no mesmo dia em que o Bradesco emprestou dinheiro ao IDP —ainda segundo a publicação, a taxa foi melhor que 99,92% dos empréstimos do banco.
GONET IMITA ARAS
Em 2019, Gonet tentou ser PGR driblando a lista tríplice da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República). Jair Bolsonaro (PL) recebeu Gonet, fora da agenda, levado pela deputada Bia Kicis (PSL-DF).
“Paulo Gonet é conservador raiz, cristão” (…) “Ele não tem capivara. O fato de ter sido sócio de Gilmar Mendes no IDP em nada interferiu em sua atuação profissional”, escreveu a deputada no Twitter na época.
Discreto, Gonet é respeitado no MPF, mas não teria liderança na base da instituição.
Convidado por Aras, Gonet assumiu a diretoria-geral da Escola Superior do Ministério Público da União, acumulando o cargo com as funções no STF, onde atuava como subprocurador-geral nas sessões da 1ª e da 2ª Turma do STF.
Aras interrompeu os mandatos de 16 conselheiros da escola. Alegara haver uma “doutrinação” à esquerda. Gilmar indeferiu o pedido para suspender essa decisão.
Gonet deixou a escola em agosto de 2021. Aras o designou para o TSE no mesmo dia em que Bolsonaro enviou ao Senado a indicação para sua recondução como PGR.
Em 2021, Aras autorizou o afastamento de Gonet por uma semana para participar do fórum do IDP em Portugal, onde falou sobre medidas de exceção sanitárias. A PGR não informou quem pagou as despesas.
Gonet foi elogiado pelo seu parecer no julgamento do TSE que tornou Bolsonaro inelegível. Avaliou que a reunião em julho de 2022 com embaixadores, quando o presidente colocou em dúvida as urnas eletrônicas, foi uma “manobra eleitoreira”.
Em 2021, contudo, 36 subprocuradores gerais haviam requerido um procedimento preparatório eleitoral por possível abuso de poder. Bolsonaro questionara a votação eletrônica e acenara com a não realização das eleições em 2022.
Gonet acolheu a representação “como subsídio interno para eventual atuação futura”. Alegou que os fatos já estavam sendo apreciados pela Justiça Eleitoral e pelo STF.
Somente em fevereiro deste ano Gonet promoveu o arquivamento, com os mesmos argumentos. Membros do MPF questionaram internamente o fato de Gonet não ter tomado antes a iniciativa, que havia sido solicitada em 2021 pela metade dos 74 subprocuradores gerais da República.