Os deputados Hugo Motta (Republicanos-PB) e Arthur Lira (PP-AL) chegaram juntos a Brasília, em 2011, embalados por um traço comum na política: um sobrenome de uma oligarquia e um bom trânsito entre os colegas, características que os colocavam em uma posição de destaque para caminhar rumo ao topo do poder. Treze anos depois, a trajetória foi cumprida, e Lira, presidente da Câmara, deverá passar o cargo em fevereiro para Motta, seu aliado fiel que reuniu o apoio de bancadas que somam quase 500 dos 513 integrantes da Casa.
A correria de Motta de uma reunião a outra para virar um jogo que tentava ser vencido pelo líder do União Brasil, Elmar Nascimento, amigo de Lira, remete aos seus primeiros passos na Casa. Eleito na época como o deputado mais jovem do Brasil, aos 21 anos e com 86.150 votos, Hugo Motta precisou cumprir uma promessa feita à mãe, meses antes, ao se lançar candidato: deveria concluir no primeiro mandato os estudos em Medicina, já iniciados. Logo no dia da posse, teve que deixar a Casa para ir à faculdade.
A agenda compartilhada entre plenário, sala de aula e hospitais ainda se estendeu por dois anos, quando se formou e desistiu de exercer a carreira na área da saúde em prol da vida política — ofício no qual a família já tinha ampla tradição na Paraíba. Por lá, o clã se alterna há mais de um século no comando de Patos, com 103 mil habitantes e a 303 quilômetros de João Pessoa. O medo de Francisca Motta, mãe do deputado e ex-prefeita da cidade, e do pai, Nabor Wanderley, atual mandatário, era que o filho enveredasse na trilha parlamentar sem ter uma formação.
A precisão da Medicina ajudou a formar o político. Considerado “metódico” e “organizado” pelos colegas, Motta caiu nas graças de Lira (PP-AL) pelo perfil visto como agregador. As conversas que vinham ganhando força nos bastidores chegaram a outro patamar em 1º de setembro, quando cumpria uma agenda eleitoral no interior da Paraíba e recebeu um telefonema do deputado Marcos Pereira (Republicanos-SP), presidente nacional do seu partido, com uma convocação para que estivesse no dia seguinte em Brasília.
Roteiro comum nesse tipo de articulação, uma reunião a portas fechadas já havia selado o destino de Motta, que desembarcou na capital federal e foi avisado que o aliado estava abrindo mão da disputa em favor dele. O líder do Republicanos já entrou na corrida com o status de novo favorito e foi levado por Pereira para uma reunião com o presidente Lula da Silva (PT), que não criou barreiras, mas ficou surpreso com a pouca idade do deputado — aos 34 anos, poderá ser o presidente mais jovem da Câmara. Motta ligou para os pais e informou que suspenderia, momentaneamente, os planos de ser candidato ao Senado em 2026.
— Eu sempre quis ter um filho homem, e o Hugo chegou muito jovem à Câmara. É da conciliação, enquanto o Lira é mais beligerante — avalia no jornal O Globo o senador Ciro Nogueira (PP-PI), ex-ministro de Bolsonaro e entusiasta da candidatura.
Desde então, Motta precisou recorrer ao “tête-à-tête” com todos os deputados, para os quais passou a ligar diretamente com o objetivo de ouvir as demandas e reforçar a necessidade de ter os votos. Entre agendas na Paraíba e Brasília, o parlamentar só marca compromissos após se exercitar nas primeiras horas da manhã. Enquanto malha na academia, fica com o celular na mão, respondendo mensagens e atendendo ligações de seus colegas. Durante o dia, costuma adiar o almoço, porque pula de reunião em reunião. De um tempo para cá, perdeu 22 quilos, resultado também de um tratamento com Mounjaro — remédio que se tornou febre entre o ‘métier’ da política.
Em conversas com parlamentares, o maior desafio de Motta é se equilibrar em meio a diferentes interesses. Alguns deputados têm pedido cargos em comissões e na Câmara. Sem se comprometer, o parlamentar diz que esse acerto precisa ser feito com os líderes.
Há, porém, um ponto solto mais delicado para o candidato à presidência da Casa conseguir amarrar. Ao mesmo tempo que condena a ofensiva golpista que culminou no 8 de janeiro, o que agrada os governistas, não fecha completamente as portas para o projeto que defende a anistia aos envolvidos nos atos antidemocráticos, o que soa bem aos ouvidos bolsonaristas.
Essa dualidade causa incômodo em parte do PT, mas os parlamentares mais alinhados lembram de episódios em que a intervenção de Motta ajudou o Palácio do Planalto. Em junho de 2023, o Congresso quase deixou expirar a Medida Provisória que montou a estrutura do governo, o que, na prática, levaria a gestão petista para a configuração da administração do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Líderes do Centrão estavam dispostos a comprar a briga e recordam de uma reunião na residência oficial da Câmara em que Motta, junto com Lira, atuou para que um voto de confiança fosse oferecido a Lula.
— Ele é da paz. Sempre atua para acalmar os ânimos — afirma o deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), um dos vice-líderes do governo na Câmara sobre Hugo Motta, que pode fazer história sendo o presidente mais jovem do legislativo federal.