Responsável por um vídeo sobre o Pix que ultrapassou 300 milhões de visualizações no Instagram e fez o governo Lula recuar no aumento da fiscalização, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) afirmou em entrevista ao jornal O Globo, que a esquerda patina nas redes sociais porque falta um “discurso verdadeiro”.
O parlamentar se diz contra “criminalizar opiniões” na internet, mas defende um olhar mais atento das plataformas para conteúdos com pedofilia e outros crimes. Hoje um dos nomes da direita com mais destaque no Congresso, o parlamentar, aos 28 anos defende uma mudança na Constituição que reduza para 30 a idade mínima para disputar o Senado — “cairia como uma luva para mim”, afirma.
No vídeo que viralizou nas redes sociais, o senhor não diz que o Pix vai ser taxado, mas essa foi a mensagem que pegou e fez o governo recuar. Qual é o mecanismo para construir essa narrativa?
Não tem mecanismo, guru nem marqueteiro. É a plena verdade. A linguagem é simples. O governo não recuou porque as pessoas acharam que o Pix ia ser taxado. Recuou porque não teve coragem de sustentar o que queria fazer: passar um pente-fino, principalmente, nas pessoas mais pobres.
Houve orientação do PL?
Nunca recebi orientação do PL sobre meus vídeos.
O senhor conversou sobre esse tema com o Bolsonaro ou o marqueteiro Duda Lima?
Não. O sucesso do vídeo aconteceu porque é uma mensagem didática que se uniu com a indignação das pessoas. O vídeo estourou porque há uma insatisfação gigantesca com o governo.
Como esses vídeos são feitos? O senhor faz os roteiros?
Eu edito a maioria dos meus vídeos, faço praticamente do zero. Já fazia isso antes. Estava plantando e, dessa vez, a colheita foi gigantesca. Não sou nenhum guru de Internet, nunca fiz curso. Eu sei de forma empírica.
Um vídeo da deputada Erika Hilton (PSOL-SP) fez uma contraposição ao senhor, em uma ação que agradou o governo, e houve mudança na chefia da comunicação com a entrada do Sidônio Palmeira. Vê potencial de a esquerda ter mais alcance nas redes a partir de agora?
Falta identificação real. As pessoas não sentem um discurso verdadeiro na esquerda. As incoerências são muito grotescas. O Lula falou na campanha que iria derrubar os sigilos (de cem anos) do Bolsonaro e colocou sigilos para ele e a Janja (primeira-dama).
O governo argumenta que aumentar a fiscalização sobre as transações financeiras é uma forma de evitar a sonegação fiscal. O senhor é contra a criação de mais mecanismos do tipo?
Sou contra um Estado grande, que cobra muito imposto e não retribui ao contribuinte. Sou mineiro, o Tiradentes morreu lutando por menos impostos. As pessoas estão indignadas de pagar todo ano 27,5% (de Imposto de Renda) para um governo que não oferece saúde, educação e ainda quer aumentar a fiscalização sobre gastos de pessoas que literalmente trabalham o dia inteiro para poder sobreviver. Não estou fazendo uma campanha pela sonegação, mas para mostrar que o governo é ineficiente. Não fiz apologia (da sonegação). E, mesmo que fosse a defesa de um crime, eu tenho imunidade parlamentar para isso.
O senhor é a favor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que reduz a idade mínima para concorrer ao Senado e à Presidência de 35 para 30 anos?
Sim. O Senado entraria com uma luva para mim. É o Senado que hoje é responsável por dar corda a ao abuso de autoridade dos ministros do STF, principalmente o Alexandre de Moraes. Pode governar um estado com trinta anos, mas não pode ser senador? É desconexo.
E qual o seu plano B?
Não descarto o governo, mas também acho que perderia-se muito com minha eventual saída da Câmara. Estou avaliando.
O Pablo Marçal pretende ser candidato à Presidência em 2026. Vai apoiá-lo?
Olha, se o Bolsonaro se candidatar, não. E o Bolsonaro será candidato.
Ele está inelegível. O que vai fazer sem o Bolsonaro no cenário?
Prefiro esperar o momento certo para dar essa resposta. Independentemente do que acontecer, a decisão sobre quem apoiar não parte de mim. Faço parte de um grupo. Estaremos do lado em que o Bolsonaro estiver.
Se a PEC da redução da idade passar, o senhor poderia ser candidato inclusive à Presidência em 2026…
Não tem essa possibilidade agora.
Bolsonaro e ex-ministros foram indiciados pela Polícia Federal por tentativa de golpe. O senhor sabia que isso estava sendo discutido no governo?
Não. Nunca ouvi.
É a favor da investigação então?
É apurar o impossível. Uma tentativa de te envenenar com um copo de água potável. Como se dá um golpe sem o Exército? Faltam requisitos jurídicos para que seja um golpe. A esquerda fica muda se tirar do vocabulário “golpe” e “fascista”.
O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, defende que o partido se posicione mais ao centro. O senhor é de uma ala vista internamente como mais radical. Essa divisão atrapalha?
O PL era um partido de centro até a entrada do Bolsonaro. Temos parlamentares com características diferentes, inclusive alguns que votam com o governo Lula e se vendem a troco de nada. Outros têm posicionamento mais firme.
A Meta anunciou novas diretrizes, como fim da checagem de fatos nos Estados Unidos. para garantir o que chamou de mais “liberdade de expressão”. As redes sociais podem prescindir de controle sobre o que é publicado?
Já existem as regras da comunidade. A gente precisa obviamente ter uma lupa maior com aquilo que é criminoso, principalmente, com relação à pedofilia, crimes sexuais e tráfico humano. Poderia ter um investigação e um controle maior sobre isso. Mas não dá para criminalizar opiniões.
O senhor se arrepende de ter usado uma peruca no Dia Internacional da Mulher em 2023 e dito que “as mulheres estão perdendo espaço para homens que se sentem mulheres”?
De forma alguma. As pessoas abriram os olhos a partir daquilo. Para expor o ridículo, eu precisei me expor também ao ridículo. Foi um dos vídeos mais vistos no meu perfil, e todo 8 de março as pessoas voltam a falar nisso.