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sexta-feira 16 de setembro de 2022 às 05:52h

Entenda por que as pesquisas eleitorais apresentam divergência

DESTAQUE, ELEIÇÕES 2022, NOTÍCIAS


Na televisão, na tela do celular ou nas conversas sobre a corrida eleitoral, os brasileiros têm sido inundados por diversos levantamentos de intenções de voto, por vezes discrepantes entre si. Como as pesquisas se dedicam a apontar o pensamento de momento do eleitor, e o número de votos de cada candidato só será conhecido em 2 de outubro, não se pode afirmar quais sondagens estão “corretas”, mas é possível entender por que há números divergentes.

Segundo a coluna Pulso, os fatores como o perfil da amostra de cada segmento do eleitorado — hoje agravado pela ausência de um Censo desde 2010 —, a forma como abordar os entrevistados e até mesmo a ordem e a construção textual das perguntas podem impactar o resultado.

Nos últimos anos, houve um boom no mercado de pesquisas, e nunca antes tantos resultados competiram pela atenção do público. O movimento ficou mais intenso de 2018 para cá, principalmente com mais sondagens telefônicas registradas a pedido, em boa parte, de bancos de investimento.

Uma das diferenças principais de método é sobre como chegar ao eleitor entrevistado, se de forma presencial ou telefônica. Desde o início oficial da campanha, em 16 de agosto, três empresas fazem levantamentos semanais a partir de entrevistas face a face, nas ruas e residências: Ipec, Datafolha e Quaest. Outras muitas fazem suas investigações por telefone, como Ipespe, Ideia e FSB. Há ainda pesquisa via formulários preenchidos na internet, caso da AtlasIntel.

 — Foto: Editoria de Arte

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O avanço das pesquisas por telefone trouxe comparações com as presenciais, mais tradicionais, feitas de forma ininterrupta desde a volta das eleições para presidente em 1989. Até aqui, em 2022, as telefônicas convergiram para resultados que mostram distâncias menores do que dez pontos entre Lula e Bolsonaro. Já as presenciais mostraram diferenças de mais de dez — o que mudou nesta semana, quando a Quaest estimou a vantagem em oito pontos.

A diferença pode estar relacionada à faixa de renda que as pesquisas telefônicas teriam mais dificuldade em atingir. Como Lula tem melhor desempenho no eleitorado mais pobre, uma amostra com maior percentual de entrevistados de baixa renda tende a encontrar intenções de voto mais altos para o petista no total. Isso ajuda a explicar as diferenças tanto entre institutos que fazem abordagens de formas distintas, quanto entre os que usam critério diferentes para formar seu perfil amostral.

Em defesa dos levantamentos tradicionais face a face, há o argumento de que, mesmo com celulares espalhados por quase todos os domicílios do Brasil, eleitores de baixa renda estão menos disponíveis para atender a uma ligação. Além disso, o fato de não existir um cadastro oficial de telefones também pode interferir na seleção. Já os defensores do método telefônico afirmam que as presenciais não conseguem atingir eleitores com renda maior por ser mais difícil acessar condomínios fechados, por exemplo, e também não chegariam em áreas de menor renda controladas pelo crime.

A amostra ideal

Outros fatores podem influir. Nas presenciais, é comum o uso de um disco com os nomes de todos os candidatos para que o eleitor escolha sem ser influenciado pela ordem de aparição dos nomes. Por telefone, haverá sempre uma ordem, que também pode ser totalmente aleatória, como defesa contra possíveis vieses. Entre as telefônicas, o uso de robô também pode significar uma maior recusa e pior compreensão das perguntas. Defensores do método dizem que são feitas milhares de ligações e só é considerado quem foi até o final da ligação.

Entre as presenciais, há pontos importantes separando e unindo as três empresas que publicam relatórios semanais. Enquanto Ipec e Quaest visitam as casas dos eleitores, o Datafolha os aborda nas ruas, em locais com fluxo constante de pessoas, como a esquina em frente a uma padaria.

Definir o perfil demográfico da amostra que será ouvida para refletir toda a população é outro desafio. Após a Quaest mostrar uma diferença de oito pontos entre Lula e Bolsonaro na quarta-feira — enquanto o Ipec estima em 15, e o Datafolha, em 12 —, o peso do eleitorado de menor renda em cada uma das amostras virou o centro de uma polêmica. A Quaest estima em 38% os que têm renda familiar de até dois salários mínimos; o Ipec, em 57%; e o Datafolha, em 50%.

Defensores de cada método têm argumentos técnicos para explicar a forma como calculam suas amostras: a Quaest atualiza seu perfil amostral usando, entre outros, dados de renda da população brasileira a partir da PNAD contínua. Já Ipec e Datafolha também usam dados oficiais para ajustar suas amostras, mas não para renda e sim para grupos como gênero e faixa etária. Contra o controle por renda, pode pesar o fato de pessoas tenderem a mentir sobre o quanto ganham, o que pioraria a seleção — assim, a divisão da renda no país é apurada na própria pesquisa. Do outro lado, está a confiança em um dado oficial e feito de forma contínua para “ancorar” a amostra.

Histórico quase secular

O debate é antigo. Pioneiro no uso de amostras, o americano George Gallup tinha uma crença quase religiosa nas pesquisas. No livro “The Pulse of Democracy”, de 1940, ele e seu colega Saul Rae escreveram que “a fé principal” desse campo é no experimento, “acreditando no valor da contribuição de cada indivíduo para a vida política”. Quatro anos antes do livro, em 1936, enquanto a prestigiosa revista da época chamada Literary Digest indicava que republicano Alf Landon venceria facilmente o democrata Franklin Roosevelt na disputa pela Casa Branca, a nova técnica de Gallup com amostras representativas da população foi paradigmática e antecipou sozinha o que ninguém via: Roosevelt tinha mais chances de ser eleito.

Diferentemente de Gallup, a Literary Digest enviava milhões de cédulas pelo correio pedindo que cidadãos marcassem suas preferências, sem amostra específica: foi um sucesso desde 1916, mas, em 1936, tudo mudou com Gallup e seus milhares — e não milhões — de entrevistados. Oitenta e seis anos depois, ninguém mais discute se amostras são ou não um caminho. É consenso que, se a sopa for bem mexida, basta provar uma colher para saber se está salgada. O debate é como fazer essa mistura no mar de 156 milhões de eleitores no Brasil.

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